Entre as instâncias prerrogativas, colocamos em vigésimo terceiro lugar as instâncias de quantidade, 241 a que costumamos também chamar de dose da natureza, 242 tomando o termo da medicina. São aquelas que medem as virtudes e, pelas quantidades dos corpos, indicam quanto intervém a quantidade do corpo sobre o modo dessas virtudes. Em primeiro lugar, há virtudes que só subsistem em uma quantidade cósmica, isto é, uma quantidade tal que tenha um consenso com a configuração e a estrutura do universo. Desse modo, a terra está firme, mas suas partes caem. As águas marinhas sofrem fluxos e refluxos; o que não acontece com os rios, a não ser em sua embocadura, por penetração do mar. Em segundo lugar, quase todas as virtudes particulares agem segundo a maior ou menor quantidade do corpo. As grandes extensões de água não se corrompem facilmente como as poças que logo apodrecem. O mosto e a cerveja fermentam e tornam-se potáveis com mais facilidade em pequenos recipientes que em grandes tonéis. Se se coloca uma erva em grande quantidade em um líquido, obtém-se uma infusão e não uma impregnação; se se coloca uma pequena quantidade, obtém-se uma impregnação e não uma infusão. Também no corpo humano, uma coisa é um banho e outra, uma simples aspersão. Do mesmo modo, o orvalho espargido pelo ar não chega a cair e acaba se incorporando no ar. E, soprando-se sobre uma pedra preciosa, pode observar-se a ligeira umidade dissolver-se imediatamente, como uma pequena nuvem já citada, dissipada pelo vento. Igualmente, um pedaço de magneto não atrai tanto ferro quanto um magneto inteiro. De outro lado, há virtudes que agem melhor na pequena quantidade que na grande; o estilete agudo fura e penetra mais facilmente que o obtuso, um diamante pontiagudo corta o vidro; e assim por diante.
De fato, não nos devemos deter em coisas genéricas, pois é necessário que se faça uma investigação a respeito da efetiva relação da quantidade do corpo com o modo da virtude. Poder-se-ia crer que seriam proporcionais; assim, uma bola de chumbo de duas onças deveria cair com o dobro da velocidade de uma bola de uma onça, o que é absolutamente errado. 243 Dessa forma, as relações são muito diversas e segundo os gêneros da virtude e, por isso, tais medidas devem ser determinadas nas próprias coisas, e não segundo verossimilhanças e conjeturas.
Enfim, em toda investigação da natureza deve ser observada a quantidade do corpo (a sua dose) que é exigida para um determinado efeito, e toda cautela deve ser empregada em relação ao muito e ao pouco. |