NOVUM ORGANUM
Francis Bacon

AFORISMOS SOBRE A INTERPRETAÇÃO DA NATUREZA
E O REINO DO HOMEM
LIVRO I - AFORISMOS

Aforismos 11-21
 

XI

Tal como as ciências, de que ora dispomos, são inúteis para a invenção de novas obras, do mesmo modo, a nossa lógica atual é inútil para o incremento das ciências.

XII

A lógica tal como é hoje usada mais vale para consolidar e per­petuar erros, fundados em noções vulgares, que para a indagação da verdade, de sorte que é mais danosa que útil.

XIII

O silogismo não é empregado para o descobrimento dos princí­pios das ciências; é baldada a sua aplicação a axiomas intermediá­rios, pois se encontra muito distante das dificuldades da natureza. Assim é que envolve o nosso assentimento, não as coisas.

XIV

O silogismo consta de proposições, as proposições de palavras, as palavras são o signo das noções. Pelo que, se as próprias noções (que constituem a base dos fatos) são confusas e temerariamente abstraídas das coisas, nada que delas depende pode pretender solidez. Aqui está por que a única esperança radica na verdadeira indução.

XV

Não há nenhuma solidez nas noções lógicas ou físicas. Substân­cia, qualidade, ação, paixão, nem mesmo ser, são noções seguras. Muito menos ainda as de pesado, leve, denso, raro, úmido, seco, gera­ção, corrupção, atração, repulsão, elemento, matéria, forma e outras do gênero. Todas são fantásticas e mal definidas.

XVI

As noções das espécies inferiores, como as de homem, cão, pomba, e as de percepção imediata pelos sentidos, como quente, frio, branco, negro, não estão sujeitas a grandes erros. Mas mesmo estas, devido ao fluxo da matéria e combinação das coisas, também por vezes se confundem. Tudo o mais que o homem até aqui tem usado são aberrações, não foram abstraídas e levantadas das coisas por procedimentos devidos.

XVII

Não é menor que nas noções o capricho e a aberração na consti­tuição dos axiomas. Vigem aqui os mesmos princípios da indução vulgar. E isso ocorre em muito maior grau nos axiomas e proposições que se alcançam pelo silogismo.

XVIII

Os descobrimentos até agora feitos de tal modo são que, quase só se apoiam nas noções vulgares. Para que se penetre nos estratos mais profundos e distantes da natureza, é necessário que tanto as noções quanto os axiomas sejam abstraídos das coisas por um méto­do mais adequado e seguro, e que o trabalho do intelecto se torne me­lhor e mais correto.

XIX

Só há e só pode haver duas vias para a investigação e para a des­coberta da verdade. Uma, que consiste no saltar-se das sensações e das coisas particulares aos axiomas mais gerais e, a seguir, descobri­rem-se os axiomas intermediários a partir desses princípios e de sua inamovível verdade. Esta é a que ora se segue. A outra, que recolhe os axiomas dos dados dos sentidos e particulares, ascendendo contínua e gradualmente até alcançar, em último lugar, os princípios de máxima generalidade. Este é o verdadeiro caminho, porém ainda não instaurado.

XX

Na primeira das vias o intelecto deixado a si mesmo acompanha e se fia nas forças da dialética. Pois a mente anseia por ascender aos princípios mais gerais para aí então se deter. A seguir, desdenha a experiência. E tais males são incrementados pela dialética, na pompa de suas disputas.

XXI

O intelecto, deixado a si mesmo, na mente sóbria, paciente e grave, sobretudo se não está impedida pelas doutrinas recebidas, tenta algo na outra via, na verdadeira, mas com escasso proveito. Porque o intelecto não regulado e sem apoio é irregular e de todo inábil para superar a obscuridade das coisas.