Quando te propus
um amanhecer diferente
a terra ainda fervia em lavas
e os homens ainda eram bestas ferozes
Quando te propus
a conquista do futuro
vazias eram as mãos
negras como breu o silêncio da resposta
Quando te propus
o acumular de forças
o sangue nómada e igual
coagulava em todos os cárceres
em toda a terra
e em todos os homens
Quando te propus
um amanhecer diferente, amor
a eternidade voraz das nossas dores
era igual a «Deus Pai todo poderoso criador dos céus e da terra»
Quando te propus
olhos secos, pés na terra, e convicção firme
surdos eram os céus e a terra
receptivos as balas e punhais
as amaldiçoavam cada existência nossa
Quando te propus
abraçar a história, amor
tantas foram as esperanças comidas
insondável a fé forjada
no extenso breu de canto e morte
Foi assim que te propus
no circuito de lágrimas e fogo, Povo meu
o hastear eterno do nosso sangue
para um amanhecer diferente! Helder
Proença, Não posso adiar a palavra
In: Aldónio Gomes & Fernanda Cavacas, A literatura na Guiné-Bissau.
Lisboa, Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as Comemorações
dos Descobrimentos Portugueses, 1997 |
Escritor da Guiné–Bissau, envolveu–se, nos
anos 70, no movimento independentista do seu país, abandonando os
estudos liceais e partindo para a guerrilha em 1973. Após o 25 de Abril,
regressou a Bissau, prosseguindo os seus estudos.
Hélder Proença começou por se dedicar à
literatura era ainda adolescente, escrevendo poemas anticolonialistas,
de afirmação da identidade nacional, que acompanharam a sua actividade
política. Os textos desta fase foram reunidos no volume Não Posso Adiar
a Palavra, editado apenas em 1982. Este carácter panfletário foi-se
atenuando progressivamente, embora o autor nunca tenha descurado uma
vertente de intervenção política e social. Considerado uma das grandes
figuras da nova literatura guineense, escrevendo tanto em português como
em crioulo, foi o co-organizador e prefaciador da primeira antologia
poética do seu país Mantenhas Para Quem Luta! (1977). Alguma da sua
produção continua inédita.
Fonte:http://web.educom.pt/p-ccomum/2/biblioteca/biografias/guine.htm |