Horror supremo! E não poder gritar
A Deus — não há — pedindo alívio!
A alma em mim se ironiza só pensando
Na de pedir ridícula vaidade
Tenho em mim
A Verdade sentida e incompreendida
Mas fechada em si mesma, que não posso
Nem pensá-la. (Senti-la ninguém pode.)
Como eu desejaria bem cerrar
Os olhos — sem morrer, sem descansar,
Não sei como — ao mistério e à verdade
E a mim mesmo — e não deixar de ser.
Morrer talvez, morrer, mas sem na morte
Encontrar o mistério face a face.
Sinto-me alheio pelo pensamento,
Pela compreensão e incompreensão.
Ando como num sonho. Confrangido
Pelo terror da morte inevitável
E pelo mal da vida, que me faz
Sentir, por existir, aquele horror
Atormentado sempre.
Objetos mudos
Que pareceis sorrir-me horridamente
Só com essa existência e estar ali;
Odeio-vos de horror. Eu quereria...
Ah! pudesse eu dize-lo — não o sei —
Nem viver nem morrer [...]
Nem sentir, nem ficar sem sentimento...
Não posso mais, não posso, suportar
Esta tortura intensa, o interregno
Das existências que me cercam... Vamos,
Abramos a janela... Tarde, tarde...
É tarde... E outrora amava a tarde
Com seu silêncio suave e incompleto
Sentido além
Da base consciente do meu ser...
Hoje... não mais, não mais, me voltarão
As inocências e ignorâncias suaves
Que me tornavam a alma transparente.
Nunca mais, nunca mais eu te verei
Como te vi, do sol da tarde, nunca,
Nem tu, monte solene de verdura,
Nem as cores do poente desmaiado
Num respirar silente... E eu não poder
Chorar a vossa perda (que eu perdi-vos)
[Nem mesmo] as lágrimas poder achar —
Por amargas que fossem — com que outrora
Eu me lembrava que vos deixaria.
Oh, minha alma amarga
Cheia de fel, e eu não poder chorar!
Quem sente chora, mas quem pensa não.
Eu, cujo amargor e desventura
Vem de pensar, onde buscarei lágrimas
Se elas para o pensar não foram dadas?
Já nem sequer poder dizer-vos: Vinde,
Lágrimas, vinde! Nem sequer pensar
Que a chorar-vos ainda chegarei!
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