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BENTO DOMINGUES, op
A religião
crítica e a crítica da religião
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Bento Domingues. Frade da Ordem
dos Dominicanos, teólogo, professor e escritor. |
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1. Conheci o casal luso-catalão, Inês Castel-Branco e Ignasi
Moreta, no Parlamento Mundial das Religiões, celebrado em
Barcelona no âmbito do Fórum Universal das Culturas, em 2004.
Esse jovem casal, apaixonado pelo diálogo inter-humano,
inter-religioso e intercultural, falou-me, então, do seu
projecto familiar no campo da edição. Pretendia criar um
território cultural de bons livros que rompessem com a
banalidade e onde reinassem, em conexão, o rigor, as ideias e o
prazer, um autêntico hedonismo de leitura pausada e saboreada.
Sabor e sabedoria têm, aliás, uma etimologia comum. A leitura e
a vida verdadeira não são conceitos antagónicos. São sinónimos.
Peça a peça, a Fragmenta Editorial foi-se tornando uma
referência do universo de pensamento crítico e reflexivo. Para o
seu conselho de assessores, as respostas institucionais às
perguntas religiosas entraram em crise, mas as perguntas antigas
e novas, de muitas origens, não se calam. O que já não existe
são respostas tranquilizadoras. Andamos, por isso, todos à
procura. Não aceitamos que os outros pensem, investiguem e
escolham por nós. O que importa é pôr a circular ideias,
pensamentos, pistas, críticas, isto é, tentativas de subversão
das ideias feitas. Mas não será isto o que caracteriza o chamado
“pensamento débil”?
Não! É simplesmente e apenas
pensamento! As respostas prefixadas não são pensamento nem
fortaleza, mas um convite à demissão. É outro, o lema desta
editora: não se demitir da faculdade de pensar, de investigar,
de viver. Neste contexto, fragmentos não são restos perdidos,
mas símbolos do vasto mundo da cultura crítica ocultada ou
desatendida.
2. Juan José Tamayo, é um conhecido teólogo espanhol, professor
da Universidade Carlos III (Madrid), secretário geral da
Associação de Teólogos e Teólogas João XXIII e colaborador do El
País. Recebeu o Diploma e a Medalha de Ouro da Liga Espanhola
Pro Direitos Humanos, pelo conjunto da sua obra e, de forma mais
imediata, pela publicação, nos finais de 2013, de Cinquenta
Intelectuales para una Consciencia Crítica, na referida editora.
Na semana passada foi apresentada, em Lisboa, na Fundação José
Saramago.
O primeiro dos cinquenta intelectuais é um filósofo ateu muito
especial, Ernst Bloch; o último nome é o de uma teóloga
feminista muçulmana, Amina Wadud. Entre estes, contam-se dois
autores portugueses: José Saramago e Boaventura de Sousa Santos.
Os intelectuais não gozam de grande prestígio pela sua
utilidade. O autor esforça-se por caracterizar o que se deve
entender por intelectual, servindo-se de António Gramsci e de
Edward Said. Para este último, o intelectual talvez seja uma
espécie de memória antagonista que não permite que a consciência
se distraia, passe ao lado dos problemas ou adormeça. Não se
instalam no que já está conseguido, perguntam sempre pelo que
deve ser (momento ético) e pelo que falta realizar (dimensão da
praxis). Pertencem à cultura do desassossego.
Para
Tamayo, a pergunta dos intelectuais é a da serpente no paraíso:
numa discussão entre ela, Adão e Eva, sobre a necessidade de ter
ou não aspirações além das da mera subsistência, a serpente
diz-lhes: vós vedes as coisas e perguntais, porquê? Eu sonho
coisas que nunca existiram e pergunto-me, porque não? (B.Shaw).
Na escolha de 50 perfis de intelectuais, homens e mulheres, de
diferentes continentes que, ao longo do século XX, realizaram a
ideia do intelectual crítico, optou por quem sabia conjugar o
sentido do local e global na análise crítica, na abertura de
alternativas. O futuro não está escrito.
3. Para muitos dos autores apresentados, a religião desempenhou
ou desempenha um papel importante, nalguns casos fundamental,
como experiência pessoal, objecto de estudo, dedicação
profissional, mas sempre numa perspectiva libertadora. Situam-se
em referência a diversas tradições religiosas - judaica,
muçulmana, católica, protestante, budista - mas não as seguem de
maneira submissa ou apologética. Os não crentes também são de
signo diferente quanto à religião: entre ateus e agnósticos,
umas vezes, reconhecem a sua importância positiva, noutros
casos, destacam a sua negatividade.
Entre os teólogos e as teólogas também existe diversidade e
afinidades. A maioria dos estudados aqui tem formação
interdisciplinar e trabalha em diálogo com outros ramos do
saber, das filosofias e das ciências.
Não foram excluídas as personalidades que exerceram funções de
governo no seio de instituições religiosas que contribuíram para
a mudança social, política e religiosa e criaram um novo
magistério.
J. Tamayo destaca o seu critério na escolha desses 50
intelectuais: no meio das suas diferenças, que não são pequenas,
observa-se um denominador comum: sentido crítico, não
apologético; perspectiva laica, não confessional; atitude
heterodoxa no modo de entender e viver a religião; ideologia
crítica, não reprodutora do sistema; modo de olhar o futuro, não
de restaurar o passado.
A religião foi o primeiro grito contra a miséria e a opressão.
Deve ser denunciada quando, em nome do louvor, perde o sentido
da indignação.
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http://www.we-are-church.org/pt/ |
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