MODELOS CRIMINAIS / O diabo do livro Hélio Rôla (pintura) & Floriano Martins (textos) 19-01-2005 www.triplov.org |
7 O DIABO DO LIVRO Nenhum pressentimento erra por si mesmo. É efeito de um entusiasmo propenso à sabedoria. O acaso seria então fruto de um erro clássico: o presságio imprudente. Porém o que fazer com a prévia escolha de rumores e suspeitas? Como planejar o esmo se a fortuna é incerta? O erro está direcionado contra o inimigo. A flutuação de caráter, a subversão, a dúvida – este joio infesta o jogo, ao tecer uma constância que não passa de camuflagem. Um simples erro tipográfico já causou muitas mortes. Porém a contrafação do erro tem sido um grande negócio, a fraude como uma inesgotável fonte de energia. Quanto mais desvairada a doutrina, mais acerto: moeda sempre apropriada à beatice e à corrupção. Não se trata de uma encenação. O erro está escrito. Lutamos contra ele, mas nos enganamos ao querer preservar certa ordem de erros. Como confiar nos livros, se sabemos como foram escritos? Porém como escapar deles, eliminar a crônica do que somos e não somos, as falsas atribuições, a crença em reinos intemporais, brochuras de frustrações e exorcismos? Haverá livro sem julgamento? Afinal, sua publicação estabelece uma verdade, e acaba por eliminar as demais. Não há então uma heresia possível? A narração do erro, sua indução, um escalpo divino, acaba confirmando toda sorte de desvario que o inquisidor não soube evitar. Como pressentir o original, se a cópia é tão perversa? Como se desfazer da cópia, ante a presunção do original? |