Procurar imagens
     
Procurar textos
 

 

 

 

 

 

ALEXANDRE HERCULANO
O Bispo Negro (1130)
 

VII

O galo tinha cantado três vezes: pelo arrebol da manhã, o cardeal partia aforradamente de Coimbra, cujos habitantes dormiam ainda repousadamente.

O príncipe foi um dos que despertaram mais cedo. Os sinos harmoniosos da Sé costumavam acordá-lo tocando as ave-marias: mas naquele dia ficaram mudos; e, quando ele se ergueu, havia mais de uma hora que o Sol subia para o alto dos céus da banda do Oriente.

- Misericórdia!, misericórdia! - gritavam devotamente homens e mulheres à porta do alcácer, com alarido infernal. O príncipe ouviu aquele ruído.

- Que vozes são estas que soam? - perguntou ele a um pajem.

O pajem respondeu-lhe chorando:

- Senhor, o cardeal excomungou esta noite a cidade e partiu: as igrejas estão fechadas; os sinos já não há quem os toque; os clérigos fecham-se em suas pousadas. A maldição do santo padre de Roma caiu sobre nossas cabeças.

Outras voz soou à porta do alcácer:

- Misericórdia!, misericórdia!

- Que enfreiem e selem o meu cavalo de batalha. Pajem, que enfreiem e selem o meu melhor corredor.

Isto dizia o príncipe encaminhando-se para a sala de armas. Aí envergou à pressa um saio de malha e pegou em um montante que dois portugueses dos de hoje apenas valeriam a alevantar do chão. O pajem tinha saído, e dali a pouco o melhor cavalo de batalha que havia em Coimbra tropeava e rinchava à porta do alcácer.

 
 

O Bispo Negro