Corrupção, ética e justiça nos comportamentos políticos

VI ENCONTRO TRIPLOV NA QUINTA DO FRADE
Casa das Monjas Dominicanas . Lumiar . Lisboa . 14 de Julho de 2018


JOÃO SANTOS FERNANDES
Corrupção, ética e justiça nos comportamentos políticos


Durante milénios a dualidade governantes-governados, na tribo/clã, na urbe ou terra feudal, gerou reinos e impérios, com 3 pilares nas suas lutas e antagonismos: riqueza, conquista territorial, controlo de recursos naturais e comércio; pelejas e tramas pela ascensão social, liberdades individuais e heranças familiares; novas doutrinas, credos e filosofias, revogação de leis e padrões morais, face a mutações nos poderes, guerras e evolução nas Mitologias, Humanidades e Ciência.

As triângulações fama-fisco-fome, emprego-escravatura-empresas, especulação-espionagem-estratégia, investigação-  instrução-investimento, ambições-alianças-autoridades, bem com as dualidades lei-crime, ética-cartel/lobismo, deontologia-corrupção, justiça-tirania e a transcendental luta dual Bem-Mal, tipificam os cenários politico-religiosos da Humanidade onde vivifica, positiva ou negativamente, o comportamento político.

Tudo isto seria dedutivo e indutivo nas análises se não houvesse o analógico e os ciclos constantes da Humanidade, também eles duais:  evolutivo e involutivo. O primeiro, como a Primavera e o Verão, traz prosperidade, progresso e paz, com alternâncias de cenários bélicos. O segundo, como o Outono e o Inverno, dá-nos a degradação, desastre, declínio e doença.

Civilizações de erros, saberes, genocídios, conquistas, alianças, expansões e hegemonias, criaram Escolas, Filosofias, Impérios, Nações e Credos-de-Fé que têm motivado avanços e recuos no progresso da Humanidade. O séc. XXI, sem novas doutrinas socio-filosóficas, herdou o comunismo, socialismo, anarquismo, social democracia e democracia cristã, fruto das lutas da Idade Contemporânea. Vivemos na Idade Atómica e da Finança Libertária e já iniciámos: Física Quântica, Filosofia da Mente, Inteligência Artificial, Robótica e a Conquista Espacial.

Que posturas políticas, económicas e sociais se geraram  para chegarmos à inequívoca degradação da governação dos Estados e de muitos dos seus actores políticos? Apenas 1% da Humanidade tem RIQUEZA que devia ser redistribuída a todos os Seres Humanos, sitos, maioritariamente, em dez países.

Nestes 10 países (China, Índia, EUA, Indonésia, Brasil, Paquistão, Nigéria, Bangladesh, Rússia e Japão), só os EUA é rico, em 10ª posição (capitação), após o Qatar, Luxemburgo, Singapura, Brunei, Kuwait, Emirates, Irlanda, Noruega e Suiça.

Os dez mais pobres (Burundi, Malawi, RCAfricana, Libéria, Niger, Madagascar, RDCongo, Gâmbia, Moçambique e Guiné) são fruto do colonialismo dos recursos, mas alguns mais ricos só têm «ouro negro». Os mais pobres estão no continente que  tinha 2 países independentes em 1945: Libéria e Rep África Sul.

A corrupção, falta de ética e ausência de JUSTIÇA global está em 5 continentes por 4 factores principais: apropriação de recursos naturais, com economia e comércio transnacional ou cartel; supremacia do poder financeiro sobre Estados, Banca, Mercados e Empresas; leis favoráveis a boas sedes tributárias, off-shores e à engenharia fiscal de empresas, bancos e ONG’s; recuo do Estado Social e monopólio Fundos Pensões Privadas, como a financeira BlackRock que tem capitais em empresas do PSI 20, como a EDP, BCP, NOS, CTT e Jerónimo Martins, e que pressiona a UE, «Davos» e G20 para ter mais biliões mundiais.

Lutar neste mar agitado, onde navegam também «barcas» do narco-tráfico, «porões» de armamento clandestino, «naus» de indústrias que asfixiam Estados, das farmacêuticas às de electricidade e gás, das agroalimentares às de combustíveis e armamento, acarreta submissões, lobismos e jogos de poder.

No cenário gravita JUSTIÇA onerosa, demorada, plena de recursos, prescrições e advogados que não defendem o mais pobre, aliás sem recursos para os recrutar, receando o pouco  traquejo do defensor oficioso na teia da lei, feita pelo anónimo legislador que não enfatisa o Ser Humano e o bem-estar social.

Em cenários de materialismo imoral, de feroz competição e lucro, vêem-se Estados e Bancas darem perdões a grandes devedores, esbulhando-se investidores menores, desiludidos por terem feito poupanças para o país, família, saúde e lazeres de velhice, iludidos por inúmeras falácias bancárias cativantes.

O descontrolo e má gestão bancária e estatal passou a ter 2 nomes: imparidades e derrapagens. A lavagem do imoral, da inaptidão e das ilegalidades tem atraído quadros ávidos de poder, alguns vindos de partidos extremistas e que depressa se tornam arrependidos de ex- filiações, tornando-se estrelas devotas e articulistas da ribalta política, financeira e de justiça.

Portugal tem o exemplo-mor da corrupção ético-política na Tragédia Inês de Castro e a sequente Justiça de D. Pedro I. Similar, mas mais dilatada, a corrupção da Casa de Bragança fez ruir a sucessão Avis/Lencastre e traçou o Império Mundial, começando pela Tragédia Alfarrobeira, matando-se o Infante D. Pedro e impediu D. Jorge de ser rei. Com a morte suspeita de D. João II, fácil foi empurrar o ambicioso Rei D. Manuel I para casamentos ibéricos, perseguições judaicas e petição para a boa Inquisição que eliminava oposições e confiscava fortunas.

Porém, a corrupção política e religiosa dos Reis Católicos era maior, como as tiranias depois do Imperador Carlos V e dos Reis Filipes. Não havendo banqueiros portugueses e morrendo os 11 descendentes de D. João III, sendo vasta a submissão da nobreza lusa a Espanha, almejando mercês coloniais, surge a inevitável Tragédia Alcácer-Quibir, por trama e ardil de Filipe II, conduzida por D. Sebastião, monarca débil e deficiente, fruto de consaguinidades ibéricas. O «laissez-faire, laissez-passer» ético-político do Rei-cardeal D. Henrique, que não conseguiu ser Papa em 1555, apesar dos subornos da Cúria por Carlos V, surge o requiem de Portugal, morrendo o «feitiço Bragança».

A Restauração da Independência (1640) foi possível com a ajuda de 3 factores exógenos ao poder imoral dos Reis Filipes: a Guerra dos 30 Anos, gerada pela corrupção europeia do ex- Império Carlos V, depois bi-partido e dualmente sito na Áustria e Espanha; a campanha dos Jesuítas lusitanos, fomentando a revolta em Évora; a ajuda financeira e de apoio naval de guerra do Cardeal Richelieu à nobreza lusa «arrependida», conjugada com a sublevação feita pelos Jesuítas na Catalunha, abrindo mais uma frente para a divisão das tropas filipinas. Tudo isto iria ser agradecido pelo futuro Rei D. João IV à Corte de França.

A corrupção financeira da corte de D. João V, sumptuosa e esbanjadora dos fluxos brasileiros, com monumentalidades imóveis, bem como a corrupção do absolutismo do Marquês de Pombal, com o seu ineficaz rei D. José I, tipificam um século XVIII nefasto para Portugal com consequências de longo prazo.

A Tragédia Távora e a expulsão Jesuíta, são corolários de projectos totalitários e medos de novas revoltas apoiadas pela Companhia de Jesus. Abafando luxúrias e o escândalo sexual de D. José I, Portugal é «vendido» a estrangeiros, na indústria Marinha Grande e Nortenha, e no comércio do vinho do Porto.

Falhada a reforma do ensino encomendado pelo Marquês de Pombal ao exilado médico Ribeiro Sanches, Portugal fica quase pelo ensino religioso, a Universidade de Coimbra, a elite do Arcadismo (1756/1825), insubmissa à corrupção censória, e com a Nova Arcádia (1790) de Bocage e Tolentino, seguindo a viva chama cultural da Marquesa de Alorna e Filínto Elísio.

O novo ensino básico, Escolas de Instrução Primária, só em 1874 é aprovado na Junta Consultiva de Instrução Pública, editando Achilles Monteverde o seu Manual Encyclopedico.

A nossa entrada na I Guerra Mundial  evitou o roubo das colónias africanas, a ameaça do Mapa Cor-de-rosa, a corrupção ambiciosa Europa-EUA à qual não escapou Bismark e depois o Imperador Guilherme II. As teias financeiras anglo-judaicas na futura Reserva Federal dos EUA e exploração de diamantes, na avidez de recursos naturais da África/Médio Oriente e empórios do ouro, prata, cacau, algodão, chá, sisal e comércio do «ouro-negro», geram novas geo-estratégias e alianças na II Guerra Mundial, falhando a Ética e a Paz da Sociedade das Nações.

Portugal nas I e II Repúblicas tinha 75% de analfabetos e proibiu o voto (1913) a todas as mulheres e homens iletrados. O Estado Novo criou a nova Inquisição, a PIDE/DGS, fundada pelo franco-maçon Capitão Agostinho Lourenço e dirigente da Interpol. Com a nazificação juvenil na Mocidade Portuguesa Portuguesa, sob a égide do Engº Francisco Nobre Guedes, a II República não soube combater a nova corrupção mundial.

Salazar, com o mérito de reequilibrar Finanças nos anos 30, paralisou o crescimento de Portugal. Obcecado no padrão-ouro-escudo (deposto por petro-dólares) refreou investimento, evitou fiscalizar e tributar (de justiça) empresas estrangeiras de África, travando para lá a emigração. Cerceando investigação, olvidou o ensino obrigatório, tardio e só na instrução primária.

O Estado censório, de partido único, criou tardios Planos de Fomento (anos 50), a Guerra Colonial (anos 60) sem bases para gerar uma futura CPLP (sem Guiné Equatorial) e serôdios marcelismos de tele-escola e reformas Veiga Simão. A pronta  descolonização é decretada pela ONU (idem RepAfricaSul) e anunciada a 4 de Maio de 1973, na Conferência de Estocolmo.

O MFA-ABRIL74 de Generais de um sonhado Federalismo Colonial/1922, permitindo, até 1972, que Praças de 2ª africanas tombassem como Praças de 1ª metropolitanas, com Capitães ausentes do Maio1968 e lutas Académicas, faz brotar um PREC de ocupaçõe/saneamentos, onde o oportunismo foi corrupção.

Destronada uma BANCA que não soube ver os ventos do BENELUX até à CEE, do Grupo Bilderberg até à Trilateral EUA-EUROPA-JAPÃO, parando-se o sonho de SINES na inexistente Primavera Marcelista, cedo uma nova corrupção, já latente na crise que trouxe o FMI 1983/85, alastra pelos novos banqueiros, empresários, escritórios de advogados, empresas estatais, centros de formação (alguns só de papel) e a «muito» Estado.

A  flutuação do escudo, a ineficaz supervisão do Estado e Banco de Portugal, a ausência de auditorias, tornariam fácil o irradiar, após adesão à CEE, de 9 milhões/dia durante 25 anos, com 26 mil milhões em formações profissionais e 2 mil milhões no abate apressado (imposto) de embarcações de pesca.

Inaugurou-se 9500 km de estradas, que uniriam Portugal à Índia, ditas para desenvolvimento do interior, das exportações rodoviárias e do sector terciário (turismo, comércio e serviços). A corrupção sequente desta decisão política, sem garantias de adequados planos de investimento, fiscalização e ajustamento, trouxe o desinvestimento aos sectores secundário e primário.

A vastidão de AE , desertas pelos índices previstos, gerou PPP desfavoráveis ao Estado, investimento e fixação humana no interior. Torneiras abertas de milhões vindos da CEE e UE, o abandono da ferrovia e de “eléctricos” para rodoviárias e «tuc-tucs» e privatizações não previstas em planos estratétigos do Estado, com os escritórios magnos de advogados e lobismos agressivos, criaram maior corrupção a vários níveis do Estado.

Vejamos títulos avulsos nos OCSocial: 19 ex-ministros e secretários de Estado (PSD, PS e CDS) foram para empresas privadas (2013); Tribunais livraram multas a grandes empresas; muitos impostos e sedes fiscais passaram para a Holanda; os paraísos off-shore revelam corrupção de políticos, banqueiros e riquezas portuguesas; alguns gestores, com ordenados de milhares de euros/mês, têm de carros de luxo e mordomias  de espavento; uma pensão de 7500 euros aumenta 238 euros e uma de 250 euros sobe 1 euro; Portugal e Qatar têm corrupção equiparada; 2,6 milhões de portugueses em risco de pobreza.

Os casos BCP-BPN-BPP-BANIF-BES dizem-se saídos da falha de supervisão do BdP e criaram-se empresas para «lixos tóxicos» (v.g.Parvalorem). Casos Moderna-Portucale-Gebalis-Pander-Freeport-CasaPia-FaceOculta-Submarinos e o perdão de milhões à BRISA-EDP deram lucros a jornais e televisões.

As leis contra as faltas de ética (moral, deontológica e de penas criminais) não podem ser tecidas por actores corruptos, já que se esfumam no anónimo do legislador. Leis de lacunas-contradições-impunidades-prerrogativas-recursos-revogações, cobrindo aceitações off-shores e deslocalizações fiscais para países imorais, traduzem uma Civilização Ocidental corrupta e decadente que se agrava, em plágios, nas ditaduras e regimes autoritários. JUSTIÇA de custas elevadas e advogados de luxo, completa um cenário onde 99% da Humanidade é também dela faminta e sem riquezas, mesmo dispondo de defensor oficioso.

A frenética caça ao voto e a grande abstenção, dá-nos a real saturação dos povos face às corruptas ilhas políticas que emergem mais pela investigação jornalística que pela Justiça e fiscalização dos Estados, crescendo verborreia de promessas, falácias a tapar verdades ou, mais gravoso, oratórias de praça pública de moralidades que são violadas em vida privada.

Quem combateu as faces da corrupção durante milénios teve, em vida, rara glória, sofreu prisão e morte violenta, levou tempo a ser santo, viu escritos censurados e queimados, como arderam bibliotecas pelas tochas de ditadores. Hoje o cenário é similar, com extremismos politico-religiosos, autocensuras e escravaturas de drogas, trabalho, sexo e tráfico de órgãos.

Os Estados com poderosas indústrias de armamento, as grandes empresas agroalimentares, fito-farmacêuticas, a banca mundial e o grande poder financeiro desregulado, tudo aliado à supremacia do lobismo e cartel multinacional, cativam novos quadros que, para singrarem, serão obviamente submissos.

Este tema podia ter resumo em 3 vultos da Humanidade:

Platão: estará tudo sempre errado quando os falsos iniciados do Iniciático Mundo das Ideias agem como profanos do Mundo das Formas.

São Nuno de Santa Maria: depois de abandonar a Corte e distribuir a minha riqueza quão feliz sou a pedir esmola para dá-la aos Pobres, sendo agora seu Condestável.

Bertrand Russell: a estupidez coloca-se na primeira fila para ser vista; a inteligência coloca-se na rectaguarda para ver.

O tema, em Dia da Tomada da Bastilha de 1789, obriga a algumas perguntas: Se a inevitável Revolução Francesa tivesse dado frutos, o GovernoVichy, o Maio 1968 e as manifestações actuais contra Emmanuel Macron teriam ocorrido na França? A Idade Contemporânea não começou logo após Waterloo?

Lugares de prisão, tortura e morte como Gulag-Tarrafal-Auschwitz-Gurs-Laogai-Hoeryong-Guantanamo, são boa ética de poder? O suicídio de Alain Turing (1954), com uma maçã de cianeto (símbolo Apple) é a face do poder político-judicial para o «pai do computador» que nos salva do III Reich, decifrando o código Enigma. Quem foi contra a sua castração química pelo Tribunal? A rainha Isabel II só deu «perdão» no Natal de 2013.

O Estado financia-se sem juros: retenções e reembolsos; alteração de renovações em tempo/tributo, com fim do vitalício-prova; galinhas ovos-de-oiro: energia e combustíveis, viaturas e turismo, custas e coimas, e novos critérios tributários.Tudo é culpa do Estado e dos Órgãos de Soberania? Quem corrompe?

A Revolução devora os Filhos, pois eles olvidam a Lei do Universo: Só a evolução das Partes faz evoluir o Todo. Falha o Todo que ousa domar as Partes. Assim finam as Civilizações.


REVISTA TRIPLOV DE ARTES, RELIGIÕES E CIÊNCIAS
série gótica. outono . 2018