JOAQUIM SIMÕES
1.
Dans moi
La nuit tremble
Embrasse-moi
Et fait jouir le vide
Qui sauve mes jours
2.
Le néant
ça veut dire
je t’aime
L’être
ça veut dire
je te fais rire
3.
Tu te nourris de l’esprit du vin
Tu reposes comme un grain de blé
Tu gardes les mots silencieux aux poèmes
Tu respires comme les nuages
Tu me caresses comme de la pluie
Ton enfance a été faite
De l’ombre et de la clarté
Ton adolescence a prié
Au milieu des rideaux
Ton sexe s’est développé
Aux jeux des miroirs
Tu ne mourras jamais
Par ta vieillesse
Tu vivras par la douleur et la joie
De ta sagesse
4.
Nous vivons toujours
le même jour
Elle est toujours la même
l’apparence
Le temps se fait
dans nos cœurs
Nos visages se déroulent
et les miroirs ne peuvent pas
s’en apercevoir
5.
Ton sourire est si près de moi
Que ma jeunesse
Je repose dans ton visage
Pour m’écouter tous les matins
Tu te nourris de lumière et de couleurs
Pour que je peux rêver au-dessus du temps
Là où il n’y a pas des fées
Et je me réveille toujours
Sans jamais avoir sorti de moi-même
Dis-moi
Qu’est-ce tu veux faire maintenant
Quand tu sais que la mort
La mort ça n’existe pas ?
6.
L’empereur s’assoit au bord du vent
Il a peur de nos faiblesses
Il nous tient de nos forces
Il manie son épée de larmes
Il écrit avec sa griffe
Il meurt dans les nuages
Comme un sage ou un assassin
À nous sa tombe
À nous le pleurer
À nous prier pour lui
À nous le malheur
D’ayant assisté à sa mort
À nous les chansons et les bougies
À nous la cire et les voiles
À nous les étoiles et le chemin
Et le vent
Toujours le vent
Nous apportant le sable de nos cœurs
7.
Le poème n’est pas une œuvre, il vit
tant même que nous
sommes la respiration de Dieu
Il n’y a que d’avoir peur
Toutes les fleurs se réveillent pour mourir
C’est pourquoi la mort est le premier
et le dernier mensonge
René Descartes n’a jamais pardonné à ses parents
de ne pas avoir été déduit
de leurs âmes
8.
Un bateau glisse
sur mes mains ouvertes
aux années
Depuis moi
Vers moi
Après moi
Dans moi
Je voudrais un rêve
et je l’ai fait
dit Leibniz
9.
Bocejo
Bocejo.
A hora cai
pesada.
Não sinto
o que vejo
e o que sinto
não vejo.
Minto
é claro.
Bocejo.
Nada.
Desespero
eu?
Não.
Faço como os outros.
Espero.
Olho para o céu
olho para o chão
olho para o lado
às vezes parado
às vezes sentado
outras vezes
não.
Xó, cão!
10.
Dia de anos
no aniversário do João Barreiros
Hoje, fiz sessenta e quatro.
Ontem, fiz sessenta e três.
E, amanhã, não sei se não
farei anos outra vez –
– que o tempo que eu conhecia,
o tempo que era um fadário,
certinho como um relógio
a posar pró calendário,
que antes me prometia
tudo, que era meu amigo,
pôs-se a olhar-me de lado
como ao pior inimigo…!
Mudou do dia p’rà noite!
Tornou-se indisciplinado,
resmunga, até cambaleia
como que embriagado…
Cada ano parece uma
das contas que mete ao rol,
enquanto ri, escarninho:
“Mais uma voltinha ao Sol…”
Já não sei o que lhe faça,
mas não me leva por tolo!
Mesmo aqui, nas barbas dele,
sopro as velas! Como bolo…!
31 de Julho de 2016
11.
A luz vinda do espelho envolve-te o corpo
Ilumina-nos deste lado
Inclinas a cabeça para trás
Uma madeixa de cabelo ao canto da boca
Perguntas gostas dela
Daquela cujo corpo acaricias?
O teu ventre ondula e ergue-se suavemente
Marcando o ritmo das minhas mãos
O meus dentes seguram a tua nuca
O meu corpo retesa-se arqueia-se
Desfaz-se de súbito em pura energia
Flecha sibilante do teu prazer
Tu e ela digo eu depois
Ensinaram-me o amor
De mim mesmo
Como poderia deixar de vos amar?
Amemo-nos os quatro então
Respondes tu
Húmidos como se tivéssemos acabado de nascer
De novo
12.
As máquinas não voam, nós voamos
Com elas e por elas no horizonte,
Lá de dentro do qual nos avistamos
Na estrada que julgamos ver defronte.
Não são armas, são filhos como cães,
Companheiras paridas do existir
Do que ainda não somos, anciães
Vagindo vidas vindas do porvir.
Todo o mundo e ninguém são. Contudo,
Ao erguerem-se nos sons do universo,
Falam de nós, deste viver, de tudo
O que, sendo já no que é, por ora mudo,
Espreita e se espelha em cada verso
Buscando o que, sendo um, se põe disperso.
13.
Canto meu
Para Lúcia Helena Lemme Weiss, no seu aniversário
Eu queria ter o cântico das flores
Que transforma em pétalas as cores
Num coro de perfume cintilante
E soar como a nuvem lá no alto
Pondo notas de luz em sobressalto
No rumor da chuvada transbordante
E poder entoar como o regato
O canto maternal doce pacato
Que fala do ter alma ao peixe mudo
E possuir o eco majestoso
Do hino imaterial silencioso
Que cada pedra e astro espraia em tudo
Queria para mim a voz de todo o ser
Para mim a canção do seu viver
Com a força do simples existir
O auge do que é uno elementar
Do que em si mesmo encontra o seu lugar
Sem ânsia de voltar nem de partir
Porque se eu ergo a voz para cantar
É a vida que toma o meu lugar
Celebrando o seu reino em toda a parte
E o canto nem é meu nem de ninguém
É dela querendo ir ainda além
Tornar-se sem medida enquanto arte
Joaquim Simões
Joaquim Simões nasceu em Paço d’Arcos (Portugal), em 1950. Licenciou-se em Filosofia na Universidade Católica Portuguesa. Frequentou o mestrado em Cultura Clássica da Universidade de Lisboa, sob orientação do Professor Victor Jabouille, tendo sido investigador da Linha de Acção 1 do Departamento de Línguas e Cultura Clássicas da mesma Universidade, abandonando, porém, ambas as actividades por motivo de doença. Foi professor do Ensino Secundário. Para além da actividade docente, exerceu ainda as funções de orientador de estágio profissionalizante e fez parte de órgãos constitutivos de diversas escolas da área de Lisboa, representando uma delas em encontros, nacionais e internacionais, sobre multiculturalidade. Em 1979, publicou um livro de poemas em edição de autor, com prefácio de Manuel Grangeio Crespo. Entre 1980 e 1983 participou no projecto de teatro para a infância e juventude do Teatro do Nosso Tempo, em Lisboa. Em 1982, em parceria com o músico Francisco (Xico Zé) Henriques, integra um espectáculo, “Astrolábio”, composto por canções feitas a partir de poemas seus. Entre 1989 e 2010, colaborou permanentemente com Manuel Almeida e Sousa e a Mandrágora em diferentes realizações na área da performance teatral. Em 2010, colaborou com Maria Morbey Henriques no espectáculo “Banjazz – Um bichinho esquisito”, levado à cena, em Fevereiro, no Centro Cultural de Belém. Desenvolve presentemente um projecto ligado ao fado tradicional com a cantora brasileira Lúcia Helena e o músico argentino Damian Andrès Valenzuela.