Uma nova interpretação da história de São Paulo

PRESS RELEASE

SÃO PAULO – Quem quiser conhecer uma nova interpretação da história do Brasil e especialmente da terra paulista não pode deixar de ler O Reino, a Colônia e o Poder: o governo Lorena na capitania de São Paulo, do professor, jornalista e historiador Adelto Gonçalves, que revisa o século XVIII e corrige equívocos publicados em outros livros por falta de pesquisa em arquivos. O trabalho desenvolvido por Adelto Gonçalves consiste em uma análise dos anos de 1788 a 1797, período de governo de d. Bernardo José Maria da Silveira e Lorena (1756-1818), mostrando como a capitania de São Paulo sempre teve um papel de grande importância na construção do Brasil, especialmente em razão de sua localização estrategicamente favorável.

“Adelto Gonçalves substancialmente enriquece a nossa compreensão da história e do desenvolvimento de São Paulo durante o fim do século XVIII. Este trabalho, de sólida base em documentos históricos e pesquisas de arquivo, reflete a formidável jornada de Adelto como historiador de Portugal e Brasil”, escreve no prefácio o historiador britânico e ex-diretor do Programa de Estudos Brasileiros do Centro David Rockfeller da Universidade Harvard, de Massachussetts (EUA), Kenneth Maxwell, doutor em História pela Universidade Princeton (EUA). E acrescenta: “Esta obra é, em sua totalidade, não só uma rica análise do governo de Bernardo Lorena, mas um estudo que abre muitas linhas de investigação e formula muitos problemas novos, o que deveria ser a tarefa de todo bom historiador. Para a história de São Paulo no século XVIII tardio não há guia melhor”, garante.

Já o historiador Carlos Guilherme Mota, professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP), diz, no texto de apresentação (“orelhas), que este livro “se distancia de abordagens mais recentes beneficiadas por publicidade apressada e aplaudida pela imprensa”. E observa: “Em patamar mais alto, Adelto Gonçalves aprofunda sua análise da vida paulistana no período colonial com inusual rigor, alargando, porém, suas balizas cronológicas, sem os modismos e generalizações muito comuns em certa historiografia que trafega na superfície dos acontecimentos, marcada pela busca do pitoresco”. Para Mota, trata-se de “um estudo bem estruturado e inovador, baseado em fontes documentais sólidas e, vale registrar, bem escrito”.

Para chegar ao período da governança de Lorena, Adelto Gonçalves precisou resumir 70 anos da história da capitania de São Paulo, desde 1720, quando ocorreu o desmembramento de Minas Gerais, e compreender como as coisas funcionavam. “Ao chegar para exercer o cargo, o governador Lorena já encontrou uma capitania em desenvolvimento e sua política foi de fortalecimento da economia, priorizando obras de melhoramento dos caminhos do interior para a capital e para o litoral”, diz Gonçalves, ressaltando que o governador teve uma visão futurista ao estabelecer o porto de Santos como porto único.

“Prejudicou os demais portos da capitania, como Cananeia, São Sebastião e Paranaguá, bem como o do Rio de Janeiro, porque as mercadorias tinham de pagar o imposto em Santos, mas com isso aumentou a arrecadação”, explica. E acrescenta: “Dessa maneira, procurava facilitar a descida da produção de açúcar do interior da capitania, direcionando-a para o porto de Santos, atendendo aos interesses da elite agrária. Além disso, o governador mandou construir uma via pavimentada com pedras, a primeira da América Latina, que passaria para a História como Calçada do Lorena. Antigamente, esse percurso na Serra do Mar, na altura de Cubatão, havia sido um caminho aberto por indígenas que os tropeiros seguiam, com o açúcar indo no lombo das mulas. Foi a partir daí que São Paulo deu um salto”, assegura.

“Lei do porto único”

O historiador observa que, com a chamada “lei do porto único”, assim consagrada equivocadamente pela historiografia, pois não se tratava de uma lei régia, mas de uma determinação do governador, alguns grupos enriqueceram, em prejuízo de outros, que passaram a considerar a medida um monopólio – o que, de fato, era – e, assim, a produção paulista, especialmente a de açúcar, cresceu de maneira vertiginosa. “Isso pode ser constatado em números, com a multiplicação de engenhos: de 78 que havia em 1793, chegou-se a 359 em 1798”, diz.

O pesquisador diz ainda que Lorena era muito ligado ao capitalista Jacinto Fernandes Bandeira, grande negociante de Lisboa, que tinha livre acesso ao governo no Reino e passara a cuidar de seus negócios particulares em Portugal. “Em contrapartida, Lorena facilitava os negócios de Bandeira com a América portuguesa. Ou seja: a venalidade constituía uma prática corriqueira, pois, embora por lei o governador (e capitão-general) não pudesse fazer negócios particulares, acabava para fazê-lo por interpostas pessoas”, diz, lembrando que Lorena seguia também a orientação de Martinho de Melo e Castro, ministro da Marinha e do Ultramar entre 1770 e 1795, que procurava diminuir a influência dos traficantes fluminenses de escravos, que já haviam estabelecido relações altamente lucrativas nas possessões portuguesas na África. “Não obteria êxito nessa missão porque, a essa altura, já houvera uma inversão na relação reino-colônia, ou seja, a América portuguesa já era economicamente mais poderosa que Portugal”.