ADELTO GONÇALVES
Adelto Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo e autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/Academia Brasileira de Letras, 2012), Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015) e Os Vira-latas da Madrugada (Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981; Taubaté-SP, Letra Selvagem, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br
I
O significado de uma obra literária não corresponde à intenção do criador, pois ela tem vida própria e seu sentido pode ser acrescido à medida que é avaliada por leitores de diferentes épocas. Essa definição consta de “Conceito e divisão da Teoria da Literatura”, primeiro capítulo do livro Teoria da Literatura “Revisitada” (Petrópolis-RJ, Editora Vozes, 2005), das professoras Magaly Trindade Gonçalves (1941-2015) e Zina C. Bellodi, e constitui um exemplo perfeito da qualidade das ideias que o estudioso de Literatura irá encontrar nesta obra, fundamental desde a sua publicação para quem quer se aventurar na arte (pouco compensatória em termos financeiros) de escrever resenhas e ensaios.
Na verdade, o livro traça, de modo geral, o percurso das ideias sobre a Literatura ao longo da História, trazendo à tona as mais diversas concepções do literário, que, embora distantes no tempo e no espaço, vivem quase sempre em permanente diálogo, já que não só as ideias sobre o literário mudam, mas mudam também as marcas essenciais da própria criação literária.
Discípulas do poeta, crítico, tradutor e novelista português Adolfo Casais Monteiro (1908-1972), perseguido pelo salazarismo (1933-1974) e exilado no Brasil a partir de 1954, professor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), campus de Araraquara, interior de São Paulo, a partir de 1962, as professoras Magaly e Zina mostram neste trabalho já considerado clássico como o Realismo do século XIX e, mais particularmente, o Naturalismo trazem a marca do interesse científico em explicitar o mundo e o homem. E acrescentam: “E o romance prestava-se magnificamente ao trabalho com as novas descobertas científicas, já que ele se volta, normalmente, para tramas que ocorrem em grupos humanos, de maneira aparentemente natural”.
Para as autoras, o romance no século XIX representa a entrada do homem comum na Literatura, “pois, ao contrário, por exemplo, da tragédia clássica, este caracteriza-se exatamente por girar em torno de figuras que, vistas exteriormente, são até banais”. Mas aqui não se deve deixar de lembrar que a entrada triunfal do pobre no romance deu-se mesmo no século XVI com a publicação de La vida de Lazarillo de Tormes y de sus fortunas y adversidades, obra espanhola anônima, escrita em primeira pessoa e em estilo epistolar, cuja edição mais antiga conhecida data de 1554.
As autoras ressaltam que o romance, como gênero, surge e se desenvolve na fase da ascensão da burguesia, de que a obra do inglês Charles Dickens (1812-1870) é o melhor exemplo, pois surge no momento em que a Inglaterra chega ao apogeu na revolução industrial, “quando se tornam acirrados os conflitos entre capital e trabalho”.
II
Já o século XX é o período marcado pelo Formalismo Russo, do qual saíram o New Criticism, o Estruturalismo, a Semiótica e a Desconstrução. Para as autoras, porém, é difícil afirmar que esta ou aquela corrente tenha sido a mais importante. “Ocorre que o século XX todo presenciou o aparecimento de um número considerável de novas posturas sobre a Literatura, muito mais, em termos quantitativos, do que ocorrera até então. Nesse sentido, o século XX foi rico em teorias e posições críticas, como o foi também para os mais variados campos do saber. Isso ocorreu por variadas razões, sendo uma delas a maior facilidade de divulgação das ideias”, ressaltam.
O capítulo final do livro é dedicado a outras posições teóricas do século XX, que se afirmaram notadamente na segunda metade da centúria, como a Crítica feminista, o Pós-modernismo, a Estética da Recepção, o Comparativismo, a Desconstrução e o Feminismo. Nas considerações finais, as autoras lembram que o século XX foi marcado por grandes propostas inovadoras, algumas com frutos notáveis, outras mais de impacto e mais sujeitas a modismos. “Foi um século rico e de questões tumultuadas no âmbito da Teoria da Literatura”, concluem, lembrando ainda que esse longo período foi extremamente pródigo em novas teorias e outras antigas, mas reformuladas, inclusive com a abertura para grupos de alguma forma minoritários ou pelo menos marginalizados como as correntes pós-colonialistas, a Literatura negra e de outros grupos étnicos.
Enfim, como observa o filósofo, professor e crítico literário Benedito Nunes (1929-2011), autor do prefácio, quem percorrer atentamente esta obra vai encontrar um texto que não tem a pretensão de atingir a resposta última a um grande questionamento, mas que o deixará satisfeito apenas pelo estímulo que vem do amor à obra literária “e pela crença, ainda, na possibilidade de passar aos leitores (principalmente os possíveis alunos) o apreço e o interesse que proporciona o contato com o objeto literário”.
III
Nascida de Araraquara-SP, onde também está sepultada, Magaly Trindade Gonçalves era formada em Letras Anglo-germânicas e doutora em Teoria da Literatura. Desenvolveu intensa atividade acadêmica, tendo publicado várias obras nas áreas de literatura e do teatro, além de artigos em periódicos universitários. Participou de várias bancas de concursos acadêmicos.
Nascida em 1941 em Córrego Rico, distrito de Jaboticabal-SP, Zina Casteleti Bellodi formou-se em Letras Anglo-Germânicas na então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara, atual Faculdade de Ciências e Letras, da Unesp. Desenvolveu estudos nas áreas de Teoria da Literatura, Literatura Brasileira e Portuguesa, além de Literatura Infanto-juvenil. Dedica-se aos estudos literários. Participou de bancas de concursos acadêmicos, publicou artigos em periódicos universitários.
Publicou ainda “Função e forma do tradicional em Mário de Sá Carneiro”, tese de doutoramento em Cadernos de Teoria e Crítica Literária (Araraquara, Unesp, 1975); “Florbela Espanca – Discurso do outro e imagem de si”, tese de livre-docência, em Cadernos de Teoria e Crítica Literária (Araraquara, Unesp, 1992); “Florbela Espanca – Discurso do outro e imagem de si” (texto condensado) em Arquivos do Centro Cultural Calouste Gulbenkian, vol. XXXIII (Lisboa-Paris, 1994); Melhores poemas de Florbela Espanca (São Paulo, Global Editora, 2005); A construção de um sonho – Fazenda Santa Cruz (Jaboticabal, Gráfica Multipress, 2011); D. Maria Luíza Carrão Jakovac,(Jaboticabal, Gráfica Multipress, 2011); e A Casa do Coco (Jaboticabal, Gráfica Multipress, 2010). Reside em Jaboticabal-SP.
Teoria da Literatura “Revisitada”,
de Magaly Trindade Gonçalves e Zina C. Bellodi,
com prefácio de Benedito Nunes.
Petrópolis-RJ: Editora Vozes, 231 páginas, 2005,
R$ 43,70.
Site: www.vozes.com.br
E-mails: zinabellodi@uol.com.br
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