(NÁRIA encontra-se só no seu laboratório, andando de um lado para o outro, pensativa e preocupada. Veste bata branca. Os objectos de cena podem resumir-se a alguns monitores computorizados espalhados sobre secretárias, um televisor de écrã largo de costas para o público, uma mesa de rodas que servirá oportunamente de marquesa com uma máquina, semelhante a um pequeno amplificador de som, à cabeceira. Decorridos alguns momentos, HÉLIO entra em cena.)
HÉLIO: (Visivelmente alarmado.) Que se passa, Nária de tão misterioso, que nem por videofone me pudesses dar uma pista ?
NÁRIA: Hoje todas as paredes têm ouvidos e aqui estamos seguros.
HÉLIO: (Incrédulo) Aqui, no teu laboratório? Onde há olhos invisíveis a espiar-nos em cada corredor?
NÁRIA: Esqueces-te que sou eu quem dirige a equipa de pesquisas. Desliguei os sensores do piso em que nos encontramos. Ofereci a todos os meus colaboradores uma tarde livre com a desculpa de que eu e tu fazemos hoje três anos de vida em comum.
HÉLIO: Não é nada teu misturar romance com trabalho. Deve ser caso grave. E a partir de hoje alteramos a nossa data de aniversário, não é assim? (Sarcástico.) Démos então em revisionistas da história privada!
NÁRIA: Não poderá ser de outra forma. Os meus colaboradores têm uma memória excelente, mesmo sem implantes. No próximo ano vão exigir-me outra vez esta tarde livre.
HÉLIO: (Abanando-a, excitado.) Diz-me o que se passa! Estou a explodir de curiosidade.
NÁRIA: Recebi ao princípio da tarde uma mensagem confidencial. Só desejo que não haja piratas com o código de acesso ao cérebro desta torre. Olímpio Areia está moribundo e perdeu a confiança na Lucy Pet e seus maridos.
HÉLIO: Quem te enviou essa bomba informativa?
NÁRIA: (Com gravidade.) Não é uma bomba, Hélio, simplesmente o apelo de um homem desesperado e absolutamente só. A pessoa que aparece na gravação é o próprio presidente.
HÉLIO: (Atónito com a revelação.) Tu queres também acabar comigo, como a Lucy fez com o Olímpio, mas a mim matas-me de ansiedade. Onde está essa gravação?
NÁRIA: Estás preparado, não é? Então abre bem os olhos e os ouvidos! (De frente para o público, dirigem ambos a atenção para um suposto écrã que se encontra inacessível à visão dos espectadores. NÁRIA prime o comando. As luzes acendem e apagam ao ritmo dos seus dedos, dando oportunidade a que ocorram algumas mudanças no cenário.)
|