TEC - Teatro Experimental de Cascais

A Boba. Programa
Teatro Experimental de Cascais, Estoril, Março de 2008
História genealógica da Casa Real portuguesa

Naõ foy menos generoso com os Vassallos, que inteiro na administração da justiça, EIRey D. Pedro I que nasceo na Cidade de Coimbra, a 8 de Abril de 1320 e a quem as Historias appellidão o Cruel, e outros o Justiceiro. Poderia ter principio este distinctivo, da convençaõ que fez assim que empunhou o Sceptro, que foy a 28. de Mayo de 1357 com D. Pedro Cruel de Castella, ao qual as tyrannias do seu Reynado fizeraõ merecedor deste nome, mais que ao nosso Rey D. Pedro. Propoz a ElRey de Castella, que lhe mandasse entregar os aggres­sores da morte de D. Ignez de Castro, que andavaõ naquelle Reyno, e que elle o faria de outros, que andavaõ em Portugal. Eraõ estes D. Pedro Nunes de Gusmão, Adiantado mayor de Leão, Mem Rodrigues Tenorio, Fernaõ Gudiel de Toledo, Fortun Sanches Cal­deron, que sendo prezos em Portugal, e entregues em Sevilha, foraõ publicamente justiçados. Ao mesmo tempo se prenderaõ em Castella Pedro Coelho, e Alvaro Gonçalves, e escapou Diogo Lopes Pacheco por huma casualidade, que pareceo mysterio. Tinha hido à caça, e vendo aquella revoluçaõ na Cidade hum pobre, a quem elle todos os dias favorecia, o avisou para que se puzesse em salvo. Foraõ conduzidos a Portugal, e estava em ElRey tão viva a chaga, que lhe abriraõ com a morte da innocente D. Ignez, que os punio com vingança, a que de ordinario se segue a tyran­nia, por ser inseparavel do odio a crueldade, que naõ pó de ter lugar no castigo justo. O que deraõ a estes Fidalgos depois de passarem por diversas injurias, foy tirarse a Pedro Coelho o cora­çaõ pelos peitos, e a Alvaro Gonçalves pelas costas, e depois foraõ queimados os corpos diante do Paço, donde ElRey estava vendo esta terrivel execução, ao mesmo tempo, em que estava à mesa comendo. Este excesso de vingança, e ainda o modo com que punio alguns delictos, fez na memoria deste Principe duvidoso, se era justiça, se crueldade, a violencia dos castigos. He certo, que nos Principes naõ deve de haver paixões com os Vassallos, de que se possa inferir, que ha mais do que o amor da justiça. Naõ se póde duvidar, que estes homicidas foraõ reos da culpa mais atroz, que se lê nas Historias em homens da sua qualidade.

Corria o anno de 1361, quarto já do governo delRey D. Pedro, quando na VilIa de Cantanhede, declarou solemnemente com jura­mento diante de muitas pessoas grandes, que na Cidade de Bar­gança recebera por mulher a D. Ignez de Castro, e que a este Sacramento assistira D. Gil, Bispo da Guarda, que os recebera, e Estevaõ Lobato, seu Guarda roupa, que o testamunharaõ; e assim o fez manifestar ao Povo, lendose-lhe este instrumento e as Bullas Apostolicas da dispensaçaõ do parentesco do Papa João XXII de  que se tiraraõ varias copias, e foraõ publicamente guardadas em alguns Archivos do Reyno. Na Torre do Tombo na casa da Coroa, na gaveta 17, maço 6 está este instrumento authentico, escrito em pergaminho, com as letras já em partes gastadas do tempo, feito por Gonçalo Peres, Tabaliaõ Geral, em Coimbra a 18 de Junho da Era 1398 que he anno de Christo de 1360 em que estando presentes naquella Cidade, no Paço da Aula das Decretaes, D. Lourenço, Bispo de Lisboa, D. Affonso, Bispo do Porto, D. Gil, Bispo da Guarda, D. Joaõ, Bispo de Viseu, D. Affonso, Prior do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, Vasco Martins de Sousa, Chanceller môr delRey, Mestre Affonso das Leys, Lugar Tenente do Chanceller, Martim Vasques, Senhor de Goes, Affonso Domingues, Vasco Martins Marecos, Joaõ Gonçal­ves, Joaõ Ayres, sobre Juizes, Fernaõ Gil, e Antaõ Martins, Viga­rios geraes da Igreja de Coimbra, e outras muitas pessoas, assim seculares, como Ecclesiasticas, que foraõ chamadas; declarou o Conde de Barcellos D. Joaõ Affonso Tello de Menezes, Mordomo môr, como ElRey recebera D. Ignez de Castro por sua legitima mulher, na fórma, que mandava a Igreja. E neste mesmo instru­mento está incorporado, o que ElRey tinha feito da asserçaõ, e juramento em 12 de Junho do mesmo anno, de que foraõ teste­munhas o Conde de Barcellos, Mordomo môr, […] Escudeiros, e outros, feito pelo dito Tabaliaõ Gonçalo Peres. Depois de publicado, e passado à publica fórma este instrumento, o Conde de Barcellos, Mordomo môr, e Vasco Martins de Sousa, Chanceller môr, e Mestre Affonso das Leys, de mandado delRey, tiraraõ depoimento do caso, em que jurou D. Gil, Bispo da Guarda, aos Santos Euangelhos, que sendo Deaõ da mesma Igreja, e Fisico do mesmo Senhor, elle o recebera com D. Ignez, estando em Bargança, o que haveria sete annos, naõ se acordando do mez, nem do dia, a que estivera presente Estevaõ Lobato, criado delRey, o qual agora era morador em Santarem, e entaõ servia a ElRey, o qual jurou fóra chamado para assistir ao dito acto, e que vira, que o Deaõ da Guarda o recebera, o que tudo se lera, e publicara naquella occasiaõ. E ElRey por se livrar de todo escrupulo, fez ler, e publicar pelo mesmo Tabaliaõ a Bulla original da dispensa do parentesco de que se tirou hum tran­sumpto, que se encorporou no dito instrumento, a qual principia: Joannes Episcopus servus servorum Dei dilecto filio Petro, Infanti primogenito charissimi in Christo filii nostri AIphonsi Regis Portugalice, & AIgarbii illustris salutem, &c. e acaba: Datum Avinhon decimo nono Calendas Martii, anno nono. Depois de assim publi­cada a Bulla, e os mais testemunhos, o Conde de Barcellos em nome dos Infantes D. Joaõ, D. Diniz, e D. Brites, filhos delRey, e de D. Ignez de Castro; e Mestre Affonso em nome delRey, e do Bispo da Guarda, requereraõ ao Tabaliaõ, que de tudo o referido passasse todos quantos instrumentos lhe fossem pedidos. Foraõ testemunhas Martim Lourenço, Arcediago de Penella, […] e outros muitos, que se acharaõ presentes, de que portou fé o Tabalião Gonçalo Peres; e no Tomo das Provas lançamos o referido instrumento por inteiro, que merece se veja. E para ratificaçaõ desta verdade, passando das Escrituras aos marmores, lhe quiz fazer eterna a duração da memoria, man­dandolhe lavrar huma sumptuosa, e magnifica sepultura no Real Mosteiro de Alcobaça, para donde fez trasladar o seu corpo, com a mayor pompa, que viraõ aquelles seculos; porque as dezoito leguas, que ha de Coimbra a Alcobaça estavaõ occupadas de hum, e outro lado de homens, que allumiavaõ com tochas, em quanto passava o Real cadaver. Tirado o corpo da sepultura foy vestido, e adornado das insignias da Magestade, e assentando-o em huma cadeira, lhe beijaraõ a maõ os Senhores, e Grandes do Reyno, em demonstraçaõ, e reconhecimento da vassallagem. E sobre o Mau­soleo, em que foraõ encerradas as cinzas daquella desgraçada Rainha, se collocou huma Estatua sua, lavrada ao natural, com Coroa na cabeça, em que ElRey declarava à posteridade a fé do seu amor, pondo aos olhos de todos este indubitavel testemunho da sua Real asseveraçaõ. Naõ deixaraõ depois alguns de pôr em duvida este matrimonio; porém saõ tantas as circunstancias, que o asseguraõ verdadeiro, que ainda das mesmas razões, com que o grande Joaõ das Regras o pertendeo infirmar, se colhe o contrario; sobre o que tem escrito diversos Authores, e agora com mayor satisfação o pó de ler a curiosidade escrito com elegancia, e provado com evidencia na estimada obra do Catalogo das Rainhas de Portugal; a que sómente accrescentarey, além do referido, outro testemunho do mesmo Rey, que parece se naõ pó de duvidar, e he, que estando para morrer, no seu Testamento, que foy feito no dia antecedente à sua morte, diz estas palavras: Item mandamos, que entreguem aos filhos da Infante D. Ignez, que outro si foy nossa mulher, a quinta de Canidelo, que era sua, e todo aquello, que delta ouvemos, como no deviamos pera o darem por sa alma, como elta mandou em seu testamento. Esta assersaõ delRey he huma indu­bitavel confirmaçaõ daquelle facto, e quando naõ houvera outra, esta só bastava para se ter por firme, e valioso; e he de reparar no tratamento, que he o de Infanta, porque naquelle tempo elle naõ era mais, que Infante. E supposta ainda a demonstraçaõ, depois de morta a coroar Rainha, naõ lhe chamou mais, que Infanta, naõ se querendo lembrar dos motivos, que então teve para isso, de que arrependido, e com a verdade daquella hora diz ser ser sua mulher, e como elle naõ era Rey, e sómente Infante, e pelo matrimonio gozava da mesma grandeza, por isso a nomeya pela Infanta D. Ignez. E acabarey confirmando este ponto, que a Rainha D. Brites reconheceo este matrimónio; pois no seu Testa­mento trata a todos os netos delle por Infantes, a quem iguala nos legados aos outros, e se elles naõ foraõ legitimos, lhe naõ chamara Infantes, porque foy huma Princeza muy grave e - severa, como consta do seu Testamento, que se póde ver.

D. António Caetano de Sousa
(1658-1734)

Teatro Mirita Casimiro / Teatro Experimental de Cascais
Cruzeiro- Monte Estoril
Tel.: 214670320
E-mail: t.e.c@netcabo.pt 
www.tecascais.org

encenação Carlos Avilez
Dramaturgia
Maria João de Rocha Afonso
Realização plástica
Fernando Alvarez
Canções originais
Luís Pedro Fonseca
Coreografia
Natacha Tchitcherova
Consultadoria de prestidigitação
Fernando Marques Vidal
Fotografias de cena e cartaz
Susana Paiva
Luminotecnia e direcção de montagem

Manuel Amorim
Sonoplastia e montagem Augusto Loureiro
Contra-regra e montagem Rui Casares
Assistência de ensaios Jorge Saraiva

MARIA VIEIRA em A Boba

de Maria Estela Guedes

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