ROLANDA ALBUQUERQUE-SERRA - FOTOS E LEGENDAS
LUÍS VICENTE - J.A. SERRA (1914-1990) : A FASCINANTE AVENTURA DA GENÉTICA
Tem, desde o início da sua carreira científica, clara consciência da importância da quantificação e da modelização matemática, que é uma constante nos seus trabalhos. São exemplares as exposições estatísticas do seu Modern Genetics, durante muitos anos elemento base da aprendizagem estatística dos alunos das licenciaturas em Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
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Cientista brilhante, de formulações conceptuais tão claras e abrangentes: "(...) o genótipo é uma potencialidade que, por fenogénese ou activação, se transforma no fenótipo ou actualidade (...)" (14), de concepções tão pioneiras e fabulosas em meados do século passado, que para muitas delas só recentemente começa a haver alguma evidência experimental.
FOTO: COM OS ALUNOS, NUMA EXCURSÃO A SINTRA, PARA TRABALHO DE CAMPO, EM 1956.
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Cedo valoriza e destaca a grande importância das proteínas na química da Vida, importância que só agora começamos a alcançar em toda a sua dimensão. Aquilo que Maynard-Smith viria um dia a dizer -"o DNA é uma banda magnética e as proteínas a música da vida"- é uma ideia presente desde muito cedo na sua obra científica. É a própria etimologia do termo "proteína" que emana, em todo o seu significado, da sua obra científica (o termo "proteína" vem do deus grego Proteu, que era capaz de tomar milhares de formas, e as mais inesperadas, para escapar aos seus perseguidores).
Soube prever a existência de modificações pós-traduccionais das proteínas e a bidireccionalidade da informação genética. O conceito de "proteoma", introduzido em 1994 pelos australianos Mark Wilkíns e Keith Williams antevê-se nos seus trabalhos desde o início da década de sessenta. O mesmo se pode dizer dos recentes conceitos de "single nucleotide polymorphisms (SNPs)" e "protein splicing".
FOTO DO PRIMEIRO PASSAPORTE, EM 1965
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Numa discussão sobre trepção e senescência antevê as modernas concepções de apoptose: " (...) se os fenómenos de envelhecimento e a senescência têm base no mecanismo biossintético regulado pelos genes, alterações genéticas programadas ou reguladas por sinais de relógios biológicos terão que ser do tipo trepcional (...)" e, mais adiante "(...) a propriedade de divisão indefinida ou, pelo contrário, de limitado número de divisões antes de degenerar, é claramente controlada pela constituição genética da célula (...)" (15).
Foi precursor dos prodígios da genética ao falar de coisas tão novas que pareciam absurdas (a "trepção", por exemplo) e que hoje, volvidos quarenta anos sobre as suas primeiras formulações, ainda não conseguimos integrar totalmente no universo conceptual da Genética e da Evolução (limitações nossas, com certeza). Assim, no início da década de sessenta formaliza o conceito muito controverso de "trepção" (16), referindo-se a alterações no material genético, de raiz epigenética, passíveis de se inscrever nas células da linha germinativa.
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A controvérsia gerada pelo conceito ficou a dever-se, fundamentalmente, ao seu cariz epigenético, para alguns de difícil integração nos modelos darwínistas, parecendo aproximar-se mais das concepções lamarckistas. Neste contexto, é de salientar que, a 2 de Novembro de 1999, a equipa de Emma Whitelaw publica na Nature aquela que foi considerada uma das mais importantes revelações científicas do fim do século XX: "Epigenetic Inheritance at the Agouti Locus in the Mouse" (17). Este, como outros trabalhos posteriores daquela equipa australiana, vieram finalmente reforçar e dar nova actualidade e pertinência ao que Serra postulara quase quarenta anos antes.
FOTO: NUM JANTAR DE HOMENAGEM AO PROF. CLAYTON PERSON, QUE O CONVIDARA A LECCIONAR NO CANADÁ. 23 DE JULHO DE 1966.
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Como os maiores pensadores, nas suas atitudes filosóficas e científicas, em particular a partir do início da década de setenta, pauta-se por uma busca incessante de uma Teoria Unificadora do Universo. Éo culminar de toda uma vida de profunda reflexão, é o cientista completamente maduro em busca da unificação, fase que muito poucos conseguem alcançar. Para ele o conhecimento científico não é só descrição, explicação e predição, é também unificação (18).
Nesses trabalhos aprofunda questões tão importantes como o espaço e o tempo em Biologia e a Teoria da Informação. Dedica-se, criando modelos operacionais, às relações entre a Teoria da Informação e a Genética.
Por pensamento original, e baseando-se apenas em factos e conhecimentos adquiridos ao longo de várias décadas, construiu a sua "Teoria Existencial" ou "Teoria da Existência em Processo".
Nesta teoria, a partir de dados concretos e por deduções lógicas através de um processo eminentemente dialéctico, explica o aparecimento da matéria, da Vida e da mente ou processo mental que leva finalmente à cultura os quatro níveis da "existência em processo" e que constituem o título do seu livro Matter, Life, Mind and Culture in Existential Theory.
Nas suas reflexões está sempre presente a ideia de teoria como sistema de proposições ou hipóteses constatadas como plausíveis e sustentáveis. Nos seus trabalhos, a teoria é um corpo de conhecimento e conjecturas sujeito a contínuas modificações. Nos seus textos de síntese, a teoria surge como unificadora de uma área de interesse científico, prevendo esquemas interpretativos e explicativos simples, possui sempre um corpo conceptual amplamente desenvolvido e contém o substrato lógico que permite a integração de um grupo de factos aparentemente desconexos.
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PROF. CONVIDADO DA UNIVERSIDADE DE ALBERTA, EDMONTON, CANADÁ, 1966
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