ACÁCIO BARRADAS E ESTELA GUEDES
ENVOLVIDOS EM "CORRUPÇÃO"

Querida Estela:

Fiquei muito surpreendido com a sua referência ao filme «Corrupção» em termos que estimulam os leitores do TriploV a correrem às salas onde é exibido (1). Sabendo-se que o gangster-produtor se assenhoreou do trabalho do autor-realizador e da argumentista, cortando-lhe mais de um quarto de hora e alterando a montagem e a banda sonora, pergunto: não é isto suficiente para merecer um merecido boicote? Se o editor de um romance resolvesse alterar a ordem dos capítulos e suprimisse cem páginas, de modo a que o autor se recusasse a assinar tal livro, você seria capaz de o adquirir nas livrarias, de o ler e de recomendar a sua leitura? Esta indiferença pelos valores morais e os direitos de autor não é uma forma de apoiar o gangsterismo que campeia na sociedade portuguesa e que, depois da economia, da política e do futebol, invade agora as salas de cinema? Confesso que não esperava de si tanta insensibilidade. Por mim, estou-me nas tintas para «a beleza e talento» que reconhece à actriz e para que considere «Corrupção» como estando «ao melhor nível dos filmes de gangsters americanos». Uma fraude é uma fraude é uma fraude é uma fraude. E pactuar é colaborar. Confesso que não esperava isto de si, pois sempre a tive na conta de uma pessoa de bem. Resta-me esperar que tudo não tenha passado de um momento de irreflexão. Assim o deseja o velho amigo

Acácio

Querido Acácio -

Tens toda a razão, não posso pactuar com a fraude. E dizer que estava um bocado à margem da polémica, donde escrevi o que escrevi, sem pensar no direito de João Botelho à integridade do filme, não serve de desculpa. Por isso gastei mais de uma hora na Internet à cata de informações sobre o assunto. Alguns resultados da navegação ficam em fundo desta página.

Acácio, o boicote ao filme é a melhor forma de resolver o assunto? Esse é o único ponto em discussão, entre nós os dois. Há outros que merecem batalha. Aliás são três, pelo menos, os campos de batalha: um filme de gangsters cujo pano de fundo é o poder dos patrões do futebol e os amores entre uma mulher e um desses patrões; a criminalidade em Portugal, em especial na grande área do futebol; o respeito devido aos autores, que em Portugal são muito mal reconhecidos, considerando a generalidade das pessoas que autor é uma pessoa que tem um emprego pelo qual é pago, fazendo à margem umas artes decorativas pelas quais não precisa de remuneração, visto que, precisamente, já tem o seu emprego.

Quando eu me referi a "Corrupção", estava na área 1; quando tu me interpelaste, tratando-me por "você", para eu medir a extensão das minhas faltas, estavas no mundo 3. Mas o problema, Acácio querido, é que entre esses dois mundos existe aquele outro em que se espanca e corrompe, sem grande esperança de que deputados, Polícia e Justiça possam fazer alguma coisa, a não ser por uma via cuja tortuosidade é idêntica à dos gangsters. Alguém terá pensado, por exemplo, que um livro e um filme, e subsequente impacto deles na Imprensa podiam substituir a prisão. A arte, esses ornatos de quem tem um emprego, a servirem de Robin Hood. E Robin Hood tem liberdade de expressão, pode trabalhar na sua arte sem receio de vir a sofrer represálias? Ninguém ameaça esse protector dos pobres?

Muito bem, boicotemos o filme, para quê ver mais violência? Não nos basta a dos filmes de gangsters americanos? Não é preciso furar o bloqueio. Como eu já o furei, digo o que se passa no filme: árbitros e jogadores são comprados com notas e mulheres de bar de alterne; vemos mulheres espancadas até ficarem de rastos, sendo invariavelmente tratadas por "gajas" e "tipas", para além de "putas", como é óbvio, por umas bestas vestidas de fato e gravata; um deputado é agredido violentamente por uns canalhas pagos para o efeito, para não voltar a erguer a voz contra esses casos de corrupção no relvado; vemos a Polícia e a Justiça divididas entre os que se deixam corromper com mulheres e notas de mil, e aqueles que reconhecem a sua impotência no terreno da legalidade, recorrendo então a meios obscuros para conseguirem levar os criminosos a tribunal. Etc..

Acácio, obrigaste-me a sair de um para outro campo, terçando armas pela virtude, como bom paladino. Mas essas batalhas cabem agora aos mais jovens, como os Gato Fedorento. Esses ainda não sofrem de osteoporose e similares. A nós, velho e querido amigo, se nos apanham de noite numa esquina, com uma pancadita fracturam-nos a coluna.

Xizes
Estela

9 de Novembro de 2007

::::::::::::::::::::::::RECORTES DE IMPRENSA
GATO FEDORENTO:
"Pinto da Costa"




Os ‘Gato Fedorento’ não se sentem minimamente intimidados com o processo-crime que lhes moveu Pinto da Costa. Tanto assim é que prometem, se razões houver, voltar a fazer ‘bonecos’ sobre o presidente do FC Porto.

“Continuaremos a fazer ‘sketches’ com ele [Pinto da Costa] sempre que se justificar. Ele é uma figura muito apetecível”, afirma ao CM Ricardo Araújo Pereira, figura mais mediática do quarteto de humoristas.

Na base da acção aos ‘Gato’, que estão sujeitos a um termo de identidade e residência, está o ‘sketch’ intitulado ‘A história nunca contada... na história nunca contada de Pinto da Costa’. No referido vídeo, o quarteto caricatura o percurso do líder dos dragões desde a infância, período em que terá “subornado os pais para ser o primogénito”. As referências ao ‘Apito Dourado’ são uma constante e nem o caso do guarda Abel é esquecido.

Dias depois da transmissão do magazine, como o CM noticiou, um repórter de imagem da RTP foi impedido de entrar no Centro de Estágio do FC Porto, facto que Ricardo Araújo Pereira considerou “uma reacção despropositada”. O quarteto “não tem por objectivo irritar as pessoas, nem andar atrás delas para denegrir a sua imagem. Aquilo é uma mera rábula humorística”, disse, então, o ‘gato’ mais conhecido. Posteriormente, uma equipa de reportagem da TV pública já não pôde viajar no mesmo avião em que a equipa de Jesualdo Ferreira se deslocou ao estrangeiro.

Os humoristas que trabalham para a estação pública recorreram aos serviços do escritório de um conhecido advogado, sabe o CM.

In: http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?id=239353&idselect=92&idCanal=92&p=200

 

O realizador João Botelho disse à agência «Lusa» que abdica de todos os direitos de autor relativamente ao filme «Corrupção». O filme baseado no livro de Carolina Salgado estreou esta quinta-feira em 55 salas de cinema do país.

«Eu abdico dos meus direitos, sei que por lei tenho direito a eles, mas não os quero», declarou.

Contactado pela «Lusa», o Gabinete dos Direitos de Autor e da Propriedade Intelectual afirmou que «o realizador, enquanto autor da obra, assine-a ou não, tem sempre direito aos respectivos direitos de autor».

A mesma fonte sublinhou que «todo o processo entre produtor e realizador é exterior à questão dos direitos de autor».

Botelho, que assinou já a realização de mais de dez longas-metragens, afirmou que apenas lhe interessa agora fazer o «seu» filme, mesmo que «daqui a muito tempo», escusando-se a dar outros pormenores.

A 04 de Outubro, o realizador anunciou em comunicado que não assinaria o filme porque a Utopia Filmes optara por «uma versão diferente de imagens e de sons» na qual não reconhecia a linha fundamental do argumento, de que é co-autor (com Leonor Pinhão), e o cinema que há 30 anos defende.

Por seu lado, o produtor Alexandre Valente, comentou na altura que as divergências com o realizador, nomeadamente sobre a montagem final e a banda sonora, já eram esperadas desde o início do projecto, e por isso celebrou «um contrato muito claro».

Filmado em Lisboa, Porto e Santiago de Compostela, a longa-metragem é baseada no livro «Eu Carolina», de Carolina Salgado, ex-companheira de Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto, e tem nos principais papéis os actores Nicolau Breyner e Margarida Vilanova.

O seu filme de estreia, «Conversa acabada», recebeu Prémio Glauber Rocha e uma Menção Especial do júri da Federação internacional da Imprensa Cinematográfica do Festival da Figueira em 1981 e o Grande Prémio do Festival de Cinema de Antuérpia em 1982.

In: http://www.agenciafinanceira.iol.pt/noticia.php?id=874563&div_id=1731