(1) Aqui tem 2 lindos ninhos da S. turdoides (2) e 6 ovos da mesma. Estes ovos perdem em casa a cor verde, por isso é provável que os que lá tem estejam desbotados conservando as pintas escuras. Os ninhos levam as ervas aquáticas do mesmo modo em que foram achados. Eu não fiz mais do que atar-lhes as linhas para as ervas não cairem. Os ovos maiores são da F. atra (3) e pode ser que da cristata. O Galeirãozito é destes ovos. Os outros ovos menores pintados de escuro-avermelhado são da G. chloropus (4); e os 2 brancos são da nossa variedade da Athene noctua mocho ordinário (5) do qual tem lá somente um ovo. Mando duas turdoides ambas machos ainda que um pouco diferentes na cor. Dois Anthus campestris (6) macho e fêmea. Dois cultrypes fêmeas, e os girinos da Chyoglossa lusitanica. À excepção dos cultripes (7) e dos ovos de Mocho, e aves (8), de tudo deixo alguns em meu poder para ter a que recorrer no caso de a remessa se estragar. Apesar de eu teimar com o Paulino para ele não ir por este tempo à Foja, lá foi e trouxe apenas 2 corvos (corax) uma chloropus, e pouco mais; deixou muita coisa encomendada. É esta a única vantagem que tirou desta viagem. A coisa melhor que trouxe quanto a mim foi uma Lymnêa que me parece nova a qual ele por ora não quer ceder. É muito estreita e muito alongada tanto na parte grossa como na espira. Veio uma apenas, misturada com outras ordinárias e outros moluscos. É provável que o Paúl de S. Fagundo nos dê algumas destas. Ele está por explorar neste ramo. Quando lá vamos temos sido somente ornitológicos. Espero o seu novo tratado de peixes; eu julgava que somente agora fazia publicações no novo periódico científico (9). Espero que dê parte do bom ou mau estado em que chegou a remessa, e peço-lhe que se não demore em escrever. A Quinta de Foja próxima a Montemor-o-Velho é muito abundante em aves de arribação tanto no Outono como no Inverno; podemos obter de lá milhafres dos pântanos e outras aves; é de lá que têm vindo as melhores aves para o Museu de Coimbra. O Paulino quer só um casal de cada espécie e pode ceder alguns para o nosso Museu. Ele trouxe também um Anas boscas (10) fêmea que lá andava com filhos. Viu uns pássaros que lhe pareceram Taralhões (11) com uma coleira preta; matou um que lá ficou num silvado. Falaram-lhe numas lindas aves que comem a raiz do Bunho, as quais são de cores lindas e variadas etc.. Estou esperando pelo criado que levou o caixote a Coimbra. Veremos em quanto fica esta remessa que está já muito cara; se todos os objectos ficassem por este preço bem podia chover dinheiro -
Chega o portador da remessa com um escrito que diz que indo pela grande velocidade paga 930 e pela pequena só seria entregue no dia 30 ou no 31 deste mês. Mandei vir outra vez a remessa que chegará a Lisboa por vários portadores e dividida.
Logo que o tempo dê lugar, volto a S. Fagundo e ao lugar do Dianteiro etc.. vamos aproveitando a Primavera que é a estação dos bicheiros. O meu primo e seu conhecido capitão Vieira prometeu-me dar parte quando fosse a Lisboa; já foi e já voltou, e eu sem o saber. Não há remédio senão ficar a minha visita ao meu amigo para o Outono, por falta de companheiro. Diabo da Lymnêa da Foja que tenho à vista... O Paulino é bom moço mas quer para ele a Lymnêa. Se eu não fosse tão franco abafava a Lymnêa sem ele ter sabido dela. Diabo da Lymnêa... Bicheiro-mor.
(1) "Respondido", manuscrito por Bocage. (2) Rosa continua a hibridar os nomes dos géneros. Não está catalogada nenhuma Sylvia turdoides. As Sylvia são as toutinegras. (3) Fulica atra. (4) Gallinula chloropus. (5) Mocho-galego. (6) Petinha-dos-campos. (7) Rosa sabe escrever o nome dos Pelobates cultripes, aliás sabe escrever os nomes todos, incluído o da Chioglossa lusitanica. (8) "e aves" está acrescentado por cima de "Mocho", como se os mochos não fossem aves. (9) Veja a bibliografia de Bocage, em Biblos-Alexandria : de facto, o Jornal de Sciencias Mathematicas vai passar a ser a única revista em que Bocage publica. (10) Anas boschas = Anas platyrhynchos, pato-real. (11) Muscicapidae. (12) Frase cortada.
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