O motivo

CUNHA DE LEIRADELLA
Tributo


O MOTIVO
conto


Na Natureza a perfeição é sempre inversamente proporcional ao Absoluto. Quanto mais eu penso, quanto mais eu raciocino, quanto mais eu questiono, mais a minha consciência me torna relativo e mais o Absoluto se distancia.
Eduardo da Cunha Júnior

 

1

Um homem nunca é nada ele sozinho, e só há uma maneira de ser feliz.

Fazer o que devia ter feito, e não fiz.

 

2

Este copo, que está aqui à minha frente e que o Viana, o empregado de mesa do bar do Cine Arte Vila Nova que sempre me atende, diz que está vazio, não está vazio.

Está cheio.

Há anos que venho ao bar do Cine Arte Vila Nova tomar uma cerveja ao fim da tarde, mas só hoje disse ao Viana, ó Viana, este copo está cheio.

O Viana riu-se, apontou o copo, e disse-me, ó senhor engenheiro, valha-me Deus, não diga isso. Este copo está vazio. O senhor engenheiro já bebeu a cerveja toda.

Nunca tinha dito ao Viana que o copo estava cheio, e sempre pedia outra cerveja, mas hoje disse-lho. Ó Viana, este copo está cheio.

Ontem a Manuela terminou o nosso caso, e hoje…

Só que o facto de a Manuela ter terminado o nosso caso ontem não é o problema do copo estar cheio hoje.

O problema é que eu nunca acreditei que a Manuela fosse capaz de terminar o nosso caso, e por isso disse ao Viana que o copo que está aqui à minha frente está cheio, embora ele diga que está vazio.

Acendo um cigarro, dou uma passa, e olho para o Viana. Ele estende o braço, pronto para pegar o copo e a garrafa se eu fizer, hum, hum, ou acenar com a cabeça.

Mas eu não faço, hum, hum, nem aceno com a cabeça.

Fazer hum, hum, ou acenar com a cabeça é fácil.

O difícil é ter por que fazer hum, hum, ou acenar com a cabeça. E neste momento eu não tenho nenhuma razão para fazê-lo.

Nunca acreditei que a Manuela fosse capaz de terminar o nosso caso.

Dou outra passa, e digo, não, ó Viana, este copo está cheio. O Viana olha-me e arregala os olhos, espantado. Abana a cabeça devagar, e olha o copo.

Para ele este copo está vazio. Eu bebi a cerveja toda, e o copo está vazio.

Debruço-me sobre a mesa e sorrio, como sorri ontem quando a Manuela me disse, Eduardo, eu chamei-te aqui hoje pra nós decidirmos. Ou tu ficas comigo de uma vez, ou eu vou tratar da minha vida, percebeste?

 

3

Sorrir é fácil.

O difícil é fazer com que os outros entendam os sorrisos.

Há momentos que nos fazem sorrir como se estivéssemos a caçoar do nosso próprio sorriso. Como eu estou a fazer agora.

A sorrir-me para não me mandar à merda.

Nunca acreditei que a Manuela fosse capaz de terminar o nosso caso porque sempre achei que a conhecia até melhor do que a mim.

Mas enganei-me.

A Manuela sempre fazia questão de dizer que não tinha segredos, e falava das suas metas de vida como se falando delas elas se concretizassem, traçadas ao milímetro.

Como se, mesmo sendo apenas metas, fossem já realidades de pedra e cal. Absolutas e concretas.

O Viana encolhe o braço e olha-me, e eu aponto um compressor a tentar desentupir um cano de esgoto do outro lado da rua, e digo-lhe, ó Viana, se este copo está vazio, por que é que aquele compressor está cheio, hã? O ar que enche aquele compressor não é o mesmo que enche este copo, ó Viana?

O Viana olha o compressor e arregala os olhos, parecendo assustar-se. Espantado, como se só naquele instante tivesse descoberto a realidade deste facto.

A Manuela também me olhou, e também pareceu assustar-se. Como se também só naquele instante tivesse descoberto a realidade daquele facto.

O Viana volta-se e olha-me, e os olhos ainda estão mais arregalados. Ele só esperava que eu fizesse, hum, hum, ou acenasse com a cabeça.

Mas enganou-se.

A Manuela também só esperava que eu fizesse, hum, hum, ou acenasse com a cabeça.

Mas também se enganou.

Eu não podia fazer, hum, hum, nem acenar com a cabeça. Se o fizesse estaria a concordar com ela.

E eu não podia concordar com ela.

Se concordasse, estaria a dar-lhe razão, e eu não queria que ela tivesse razão.

 

4

Fazer, hum, hum, ou acenar com a cabeça é fácil.

O difícil é acreditar que os outros dizem a verdade.

Não a verdade-verdade, Verdade com V maiúsculo, mas ao menos a verdade que eles acham verdadeira.

A verdade-verdade, Verdade com V maiúsculo, não existe. Existe apenas a verdade de cada um.

A minha verdade diz-me o que eu acho que é verdadeiro, embora para os outros o que eu acho que é verdadeiro possa ser falso.

Mas isso não é, e nunca foi um problema meu. Quem não concorda comigo, não discorda de mim. Apenas a verdade dele é diferente da minha.

Não é da discussão que nasce a luz. A luz nasceria se todos quiséssemos aceitar a verdade de cada um. Mas isso ninguém quer.

Eu incluído.

O Viana continua a olhar-me, e os olhos piscam, como se ele não soubesse, ou não quisesse entender.

A Manuela também me olhou, e piscou os olhos, como se também ela não soubesse, ou não quisesse entender.

Esmago o cigarro no cinzeiro, aponto o copo, e digo ao Viana, ó Viana, diga-me cá. Se é o mesmo ar que enche este copo, e enche aquele compressor, por que é que ele está cheio e este copo está vazio, hã? Ou ambos estão cheios, ou ambos estão vazios, ó Viana.

Os olhos do Viana param de piscar e fixam-se nos meus, à espera que eu diga alguma coisa.

A Manuela também parou de piscar e fixou os olhos nos meus, à espera que eu dissesse alguma coisa.

Dou uma passa, e olho o Viana. Você não acha, ó Viana? Ele não responde, e eu recosto-me na cadeira. Hein, ó Viana?

O Viana desvia os olhos e continua sem responder. Ó Viana, você há de concordar comigo. Se aquele compressor está cheio, se não estivesse não funcionaria, por que é que você diz que este copo está vazio, hã? Você não tem um mínimo de bom senso, ó Viana.

 

5

Não sei o que o Viana pensou quando eu lhe disse, você não tem um mínimo de bom senso, ó Viana.

Possivelmente, mandou-me à merda.

E se pensou isso, fez bem. Eu teria feito a mesma coisa. Só que ele se resguardou, como eu também me resguardaria. Não diria nada.

A Manuela não.

Quando não lhe respondi à pergunta, tu não te importas, Eduardo?, disse-me o que eu disse ao Viana. Tu não tens um mínimo de bom senso.

Não lhe respondi, mas importava-me. O nosso caso também era meu, e eu não queria acreditar que ela pudesse terminá-lo.

Por isso, não lhe respondi.

Acendo outro cigarro, dou uma passa profunda, coloco-o no cinzeiro, e digo ao Viana, ó Viana, você sabe o que é que nos faz distinguir o que é verdadeiro do que é falso?

O Viana não responde. Estende o braço, como se fosse pegar a garrafa e o copo, mas encolhe-o num gesto repentino.

O que nos faz distinguir o que é verdadeiro do que é falso é o bom senso, ó Viana.

O Viana olha-me fixamente e respira fundo, e só então parece perceber que eu estava ali sentado à frente dele.

A Manuela também me tinha olhado assim, como se só também naquele instante parecesse perceber que eu estava ali parado à frente dela.

Ó Viana, quando alguém repete o que todos dizem, não usa o bom senso. Usa o senso comum, está a perceber?

O Viana olha-me e abana a cabeça, como se não acreditasse. Não diz nada, mas eu vejo nos olhos dele que não quer acreditar no que lhe digo.

A Manuela também me olhou e também abanou a cabeça, como se também não quisesse acreditar quando me dirigi à porta da saída da casa dela.

 

6

Pego o copo, e levanto-o como se fosse fazer um brinde, embora os brindes de nada sirvam.

São como os diplomas e as condecorações. Só servem para lustrar a pompa e circunstância.

Com o copo levantado digo ao Viana, ó Viana, se o senso comum diz que este copo está vazio, e o meu bom senso me diz que ele está cheio de ar, você sabe o que é que aconteceu?

Olho-o, e sorrio-me. Aconteceu que o meu bom senso me diz que eu estou certo, está a perceber? Eu só estaria errado se o ar que enche este copo não fosse o mesmo que enche aquele compressor, está a perceber, ó Viana?

Coloco o copo na mesa, e olho-o. O Viana parece uma estátua, a olhar-me como se eu fosse, ou parecesse ser também uma estátua.

A Manuela também me olhou assim quando abri a porta da casa dela. Como se eu fosse, ou parecesse ser uma estátua.

Pouso o copo na mesa, pego o cigarro, dou uma passa profunda, e solto o fumo pelo nariz e pela boca. Mas você sabe de uma coisa, ó Viana? Você está certo. Pensar é fácil. O difícil é dizer o que pensamos. Quem diz o que pensa, não pensa o que diz, você sabe disso, não sabe, ó Viana?

O Viana continua imóvel, calado, só a olhar-me.

A Manuela também ficou imóvel, calada, só a olhar-me quando fechei a porta, e saí da casa dela.

Recosto-me na cadeira, e aponto a garrafa. Ó Viana, por favor, traga-me outra. Mas antes ouça-me. Você sabia que discutir o senso é como discutir o sexo dos anjos? Todos falam dele, mas ninguém consegue praticá-lo.

O Viana olha-me mais alguns instantes, e de repente esfrega as mãos, e ri-se. Ó senhor engenheiro, o senhor engenheiro sabe por que é que este copo está vazio? Está vazio porque eu já meti a cerveja na sua conta.

Pega a garrafa e o copo e afasta-se, e eu não sei o que dizer.

Como também não soube quando a Manuela me disse, se assim queres, Eduardo, nunca mais me procures, ouvi

 

7

A Laurindinha nunca foi a minha namorada.

Tínhamos treze anos, andávamos na mesma escola, mas não éramos namorados.

A Laurindinha gostava de me beijar e de meter as mãos dentro das minhas calças, mas nunca fomos namorados.

Eu também gostava que ela me beijasse e metesse as mãos dentro das minhas calças, mas troquei-a por uma calculadora científica quando fiz catorze anos.

O meu pai era professor de português na escola onde estudávamos, e queria que eu também fosse professor.

Mas eu não queria ser professor.

Só queria que a Laurindinha me beijasse e metesse as mãos dentro das minhas calças.

O meu pai gritava-me, és um palerma, quando eu lhe dizia que não queria ser professor, e a minha mãe dizia-me, ó meu filho, professor, tens a vida ganha.

Mas eu não queria ser professor.

A Laurindinha gostava de me beijar e de meter as mãos dentro das minhas calças, e eu queria é que ela me beijasse e metesse as mãos dentro das minhas calças.

O meu padrinho era irmão da minha mãe e morava na nossa casa, e era o único que não teimava comigo, nem me chamava palerma.

Era casado, mas separado. A minha madrinha tinha-o deixado, dizia a minha mãe que morava em Lisboa, e nunca nos visitava. Nem sequer no Natal, ou nos anos do meu tio.

A minha mãe dizia que ela não prestava, e que tinha sido um milagre não ter acabado com a vida do meu tio.

Não a conheci.

Só a via no retrato que o meu tio trazia na carteira, e me mostrava no quarto dele, às escondidas.

Era bonita. Tão bonita como a Laurindinha.

Loira, de olhos azúis, e com um sorriso igual ao da Laurindinha quando me beijava e metia as mãos dentro das minhas calças.

Deixou o meu tio logo depois de me ter batizado, mas sempre pensei no que a minha mãe dizia dela.

Como é que uma pessoa podia acabar com a vida da outra, se a outra não quisesse?

Muitas vezes perguntei isto à minha mãe, mas ela nunca me respond

 

8

A minha mãe também não gostava da Laurindinha, e também dizia que ela não prestava.

Essa rapariga não presta, meu filho. É igual à coia que desgraçou a vida do teu tio.

Eu nunca entendi a minha mãe.

Gostava mais dela do que gostava do meu pai, mas nunca consegui entendê-la.

Como é que a Laurindinha podia não prestar, se gostava de me beijar e de meter as mãos dentro das minhas calças?

O meu tio não.

Não me queria professor, e sempre teimou com o meu pai por causa disso.

Era o único que me dizia que eu devia ser o que quisesse, e não o que os outros queriam que eu fosse.

Eu gostava muito dele. Muito mais do que gostava do meu pai.

Foi ele que me deu a calculadora científica quando fiz catorze anos só porque eu lhe dizia que não queria ser professor. Queria ser engenheiro.

O meu pai não gostou da prenda do meu tio, e nunca ma deixou usar dentro de casa.

Disse-lhe que não voltaria à escola se ele não ma deixasse usar, e ele bateu-me.

Bateu-me tanto, que a minha mãe teve que pedir ajuda ao meu tio. O meu tio enfrentou a raiva do meu pai, e o meu pai deixou de me bater.

O meu tio não falou mais com ele, e construiu-me um barraco no fundo do quintal, debaixo da nespereira, ao lado do poleiro das galinhas.

Deu-me a chave do aloquete, e disse-me, é teu. Se o teu pai, por acaso, te bater à porta, diz-mo, que ele nunca mais te baterá à porta.

Daquele dia em diante passei a viver mais no meu barraco do que em casa.

Tomava o pequeno-almoço, e só voltava para almoçar, jantar, tomar banho, e dormir.

 

9

Eu não falava com o meu pai, nem sequer bom-dia ou boa-noite, e ele também não falava comigo.

Mas eu não me importava.

Não gostava dele, e tinha a certeza que ele também não gostava de mim, de tanto que me queria obrigar a ser o que ele era. Professor.

O meu tio não.

Rapaz, dizia-me ele, cada um deve fazer sempre aquilo que acha que é certo. Se eu não tivesse dado ouvidos aos outros, ainda hoje poderia ter a tua madrinha comigo. Mas não dei, e olha, hoje vivo como vivo. Só, e com saudades dela.

Eu gostava muito do meu tio. Era farmacêutico, mas não exercia a profissão. A paixão dele era a marcenaria. Restauração de peças e móveis antigos.

O meu pai dizia que era uma vergonha um licenciado ser marceneiro. Ele não dizia nada. Levantava-se da mesa, e ia para a oficina, do outro lado da rua.

Menos de um ano depois de construir o meu barraco, suicidou-se.

Não apareceu para o jantar, a minha mãe foi procurá-lo e encontrou-o enforcado na oficina.

O meu pai disse que ele não regulava da cabeça, mas eu sabia o porquê do suicídio.

Saudades da minha madrinha.

Senti muito a falta dele. Chorei a noite inteira no velório, mas não acompanhei o caixão ao cemitério.

Não queria vê-lo coberto de terra, enterrado num buraco.

Tinha dezasseis anos quando o meu pai faleceu.

Caiu redondo no meio de uma aula, e o médico disse que tinha sofrido um enfarte agudo do miocárdio.

Não chorei nem no velório, nem no enterro. Gostava mais do meu tio do que dele.

Três anos depois, entrei na Faculdade de Engenharia Civil da Universidade do Porto, e a minha mãe não se opôs. Agora, eu era o homem da casa.

Licenciei-me aos vinte e quatro com a certeza de vir a ser um bom engenheiro civil. Fiz o estágio, e fiz a prova de admissão à Ordem.

Só que o máximo que o meu diploma me conseguiu foi fazer projetos para um empreiteiro falido de Vila Nova de Pardais, e o Viana, o empregado de mesa do bar do Cine Arte Vila Nova que sempre me atende, chamar-me senhor engenheiro.

Dos projetos que tinha sonhado fazer para uma grande construtora, nem sombra.

Não fosse o dono deste colégio ter-me contratado como professor de matemática, e nem a merda destas aulas o meu diploma me teria conseguido.

Como eu nada consegui até hoje.

A não ser saber que só nasci para morrer.

 

10

Conheci a Manuela há três anos no Cine Arte Vila Nova na noite da estreia de A Lenda da Estátua Nua.

Quando cheguei, já o átrio do cinema estava lotado, a bilheteria fechada, e as pessoas empurrando-se, num atropelo como eu nunca tinha visto em outra estreia.

Parei, assombrado com aquele empurra-empurra, mas logo descobri o motivo. O cartaz com o vestido molhado, colado no corpo da Sophia Loren valia qualquer esforço para ganhar os melhores lugares dentro da sala.

Ia acender um cigarro, quando alguém me deu um empurrão que quase me atirou ao chão. Voltei-me, mas nem tempo tive de reclamar. Uma rapariga afobadíssima pedia-me imensas desculpas, e perguntava-me me tinha magoado.

Olhava-me com tanta aflição que não pude deixar de rir. Não, não me magoou. Peço desculpa, mas… Nem a deixei terminar. Foi um prazer. Ela sorriu-se, acalmou-se, e assistimos o filme juntos.

No fim convidei-a para tomarmos um café, ela disse que preferia uma cerveja, sentamos no bar do cinema, e a conversa correu toda por conta dela.

Que se chamava Manuela Maria de Freitas Oliveira, que achava uma falta de educação dizer-se só o primeiro nome quando se conhecia alguém, que era contabilista da Têxtex, a maior fábrica de produtos têxteis de Vila Nova de Pardais, que tinha trinta e dois anos e era divorciada há quase quatro, que não tinha filhos, e que era totalmente independente.

Pedi mais duas cervejas, e ela continuou. Que tinha três metas na vida, a primeira, escrever um livro sobre racismo, achava importantíssimo, a segunda, escrever outro contra a desigualdade de género, também achava importantíssimo, e a terceira, lutar para que o voto distrital fosse implantado em Portugal.

Disse-lhe que eram metas maravilhosas, ela sorriu-se e continuou. Que estava farta de saber que os políticos eram corruptos, mas ao menos com o voto distrital os portugueses poderiam escolher quem eles quisessem que os roubassem.

Fez uma pausa, e perguntou. Concorda comigo? Acenei com a cabeça, mais interessado nela do que no voto distrital e nas roubalheiras dos políticos. Se a blusa estivesse molhada e colada nos seios, seria uma cópia perfeita da Sophia Loren indignada com as propostas do milionário vigarista Victor Parmalee, interpretado pelo ator Clifton Webb.

Paguei a conta, ela teimando em pagar a parte dela, e acompanhei-a a casa. Na porta, ela perguntou-me. Quer tomar um café? Aceitei, disse-lhe que me chamava Eduardo da Cunha júnior, e dormi lá. Ela nunca dormiu na minha casa, mas nunca se importou. Ao menos até ontem.

 

11

Continuo a dar aulas de matemática no Colégio Vila Nova, mas só as dou para poder sobreviver. A minha mãe morreu há quatro anos, e dela só herdei a minha casa.

Nunca quis ser professor, e há muito deixei de usar a calculadora científica que o meu tio me deu quando fiz catorze anos.

Sei que o mundo está cheio de professores e engenheiros, e de pessoas como eu, que passam pela vida como se a vida não passasse por elas, vivendo cada dia como se todos fossem ontens.

Sem presente e sem futuro.

Na semana passada fui ao Cine Arte Vila Nova ver Cinema Paraíso. A sinopse do filme fascinou-me.

Um menino deslumbra-se com os poucos e censurados filmes que via no cinema da sua cidadezinha na Sicília, e decide ser cineasta.

E foi.

Parecia um argumento de telenovela atamancada, mas a firmeza daquela decisão tocou-me fundo.

Quando era menino, eu também decidia a minha vida, apesar do meu pai dizer que eu era um palerma por não querer ser igual a ele, um professor, e a minha mãe também dizer que como professor tinha a vida ganha.

Mas eu não era palerma.

Tinha decidido ser engenheiro, e só queria ser o que tinha decidido.

Depois da morte do meu tio passei a fechar-me cada vez mais no meu barraco. Tomava o pequeno-almoço, e só voltava a entrar em casa para almoçar, jantar, e tomar banho. Dormia no barraco.

Deixava a Laurindinha balouçar sozinha, e por mais que ela se demorasse no balouço, trancava-me lá dentro e ficava a olhar as paredes cheias de folhas com os meus cálculos matemáticos.

O meu tio estava certo.

Cada um deve fazer sempre aquilo que acha que é certo.

E para mim o certo era ser engenheiro.

 

12

Eu sabia o que queria, e os outros não contavam.

Nem sequer a Laurindinha, por mais que ela se demorasse no balouço.

Não tinha esquecido os beijos que me dava, nem as mãos que metia dentro das minhas calças, mas o importante agora era o meu futuro.

Ser o engenheiro que sempre quis ser.

Só que se aos catorze anos tinha a certeza que aos vinte seria tudo que tinha decidido, aos vinte e quatro, quando me licenciei, verifiquei que querer ser estava longe, muito longe de ser de facto.

Na faculdade tinham-me dito que eu seria um profissional capacitado para conceber, projetar e construir os mais diversos componentes da infraestrutura necessários para o bem-estar e desenvolvimento da sociedade.

A sociedade merecia tudo isso.

A sociedade. A sociedade só quis saber do seu bem-estar, e mandou foi bugiar o profissional que eu era. Estava licenciado e credenciado, mas desempregado.

Na realidade mata-mata que encontrei ao sair da faculdade, o meu diploma não valia sequer o custo do papel em que tinha sido impresso.

Eu era o engenheiro que sempre quis ser, mas só era o engenheiro que sempre quis ser. Em todas as empresas onde procurei trabalho, engenheiros civis recém-licenciados faziam bicha na porta.

O máximo que o meu diploma me conseguiu, foi assinar projetos para um empreiteiro falido de Vila Nova de Pardais, e o Viana, o empregado de mesa do bar do Cine Arte Vila Nova que sempre me atende, chamar-me senhor engenheiro, e dar aulas de matemática num colégio mascavado.

Dos projetos que sempre sonhei fazer para alguma grande construtora, nem sombra.

Faculdade rima com realidade. Mas só rima.

Saído da faculdade e diante da realidade mata-mata que me cercava, todos os meus sonhos aluíram.

De tudo apenas me restou uma certeza.

E absoluta.

Um homem nunca é nada ele sozinho.

Às vezes, nas horas de mais silêncio ou de saudade, ainda penso nos meus sonhos. Naquele grande engenheiro que sempre quis ser, e tinha a certeza que seria.

Mas não tenho mais a quem contá-los.

O meu barraco caiu de podre, e troquei a Laurindinha por nada.

 

13

Ontem aceitei uma imposição que, agora tenho a certeza, devia ter recusado. E o resultado foi péssimo.

A Manuela telefonou-me para o colégio de manhã, e disse que me queria ver com urgência. Achei estranho.

No domingo, como sempre fazíamos, tínhamos passado a noite na casa dela, e nada me pareceu diferente.

A Manuela, como sempre, só parou de reclamar quando se despiu e se deitou, e eu me encaixei nas pernas dela.

Mas ontem insistiu tanto, que acabei por concordar em ir à noite à casa dela. Fui, e quando cheguei ela já me esperava à porta, impaciente.

Eduardo, eu chamei-te aqui hoje pra nós decidirmos. Ou tu ficas comigo de uma vez, ou eu vou tratar da minha vida, percebeste?

Não respondi, e ela olhou-me, espantada.

Tu não te importas, Eduardo?

Continuei calado, e ela abanou a cabeça.

Tu não tens um mínimo de bom senso.

Calou-se, e olhou-me fixamente.

Se assim queres, Eduardo, nunca mais me procures, ouviste?

Acendi um cigarro, e esperei que ela se despisse e se deitasse. Tinha a certeza que logo que me encaixasse nas pernas dela as reclamações acabariam.

Mas ela não se despiu nem se deitou. A Manuela sempre reclamou dos meus silêncios, mas sempre se despia e se deitava.

Há três anos que a Manuela reclamava e eu escutava, e sempre continuávamos. Sempre se despiu e se deitou, e eu sempre a escutei sabendo que as reclamações acabariam logo que me encaixasse nas pernas dela.

Mas ontem a Manuela não se despiu nem se deitou.

Eduardo, ou tu dormes aqui hoje e amanhã trazes as tuas coisas, ou eu vou dormir à tua casa e levo as minhas. Escolhe.

Abriu a porta, e olhou-me.

Decide. Ou tu ficas aqui, ou me levas contigo. Ou então podes ir. Agora.

 

14

O filme Cinema Paraíso estreou numa quarta-feira. Há anos que o Cine Arte Vila Nova só inicia as sessões semanais às quartas-feiras, mas eu só fui vê-lo no domingo.

Levei aqueles cinco dias a pensar que agruras teria passado aquele homem para cumprir o que tinha decidido quando ainda era criança.

Cumprir uma decisão não é fácil. É tão difícil que para mim foi impossível.

Foram cinco dias de merda.

Por mais que forçasse não pensar, não conseguia esquecer a determinação daquele miúdo. Até a ler, ou a ver filmes na televisão ou no computador, não deixava de pensar.

E não era por curiosidade. Era por medo.

Ao pensar na determinação daquele miúdo era em mim que pensava. No que tinha sido, e no que era. E não gostava do que pensava.

Por isso, todas as vezes que decidia ir ao Cine Arte Vila Nova, recuava. E justificava o meu recuo com argumentos em que nem eu próprio acreditava.

Ou via filmes na televisão ou no computador, que em outra situação jamais veria, ou lia livros, que em outra situação também jamais teria lido.

Foram cinco dias de merda.

Fodidos.

Só que enquanto estivesse a ver filmes ou a ler livros trancado em casa, ao menos não estaria no Cine Arte Vila Nova a ver aquele miúdo cumprir a sua decisão.

Um raciocínio perfeitamente lógico e condizente com os factos. Se o filme ia ficar em cartaz até domingo, por que é que eu teria que vê-lo antes?

Só que o raciocínio não era verdadeiro, e eu sabia.

O que me afastava do Cine Arte Vila Nova não era o fator tempo. Era o fator medo.

Eu tinha medo de confrontar a firmeza da determinação daquele miúdo com a minha covardia.

 

15

A decisão da Manuela foi definitiva.

Irrevogável.

Conhecia-a há três anos, e nunca pensei que ela fosse capaz de tomar uma decisão tão imperativa.

Mas tomou-a.

A Manuela sempre reclamou. Há três anos que convivíamos, e ela nunca parou de reclamar. Que eu não queria saber dela, da vida dela, das suas metas, de tudo.

Só que todas as reclamações acabavam logo que ela se despia e se deitava, e eu me encaixava nas pernas dela.

Por isso, me espantou ela dizer, decide. Ou tu ficas aqui, ou me levas contigo. Ou então podes ir. Agora.

Assombrei-me com o imperativo daquela decisão.

Não pelo facto de ela me dizer, ou tu ficas aqui, ou me levas contigo, mas por eu ter que tomar também uma decisão.

A Manuela sempre repetia as mesmas reclamações, com as mesmas palavras e com a mesma intensidade, e eu sempre tive a certeza de que ela só falava por falar.

A Manuela gostava de falar.

Fazer de conta que tudo aconteceria se ela dissesse que ia acontecer. Mas nunca a vi fazer nada do que dizia que faria.

Escrever um livro sobre racismo, outro sobre a desigualdade de género, e lutar para que o voto distrital fosse implantado em Portugal.

A Manuela nunca tinha feito nada, e eu sabia, e a ela sabia que eu sabia.

Mas só ontem ela me disse, decide. Ou tu ficas aqui, ou me levas contigo. Ou então podes ir. Agora.

A decisão da Manuela assombrou-me.

Nunca pensei que fosse capaz de a tomar.

Mas tomou-a, e aquele agora coagiu-me.

Se ela se tinha decidido, eu também teria que decidir-me.

O agora dela obrigava-me a fazer também o meu agora.

 

16

Por mais que forçasse não conseguia tirar os olhos da fotografia do Totó que vi à porta do Cine Arte Vila Nova.

A alegria do sorriso e do olhar dele deslumbravam-me. Escorria pelo cartaz, iluminando tudo à sua volta.

Por isso, não era de espantar que aquele miúdo que se deslumbrava com os poucos e censurados filmes que via no cinema da sua cidadezinha na Sicília cumprisse o que tinha prometido.

Ser um cineasta.

Não sei porquê, mas aquele sorriso lembrou-me a Laurindinha. A Laurindinha também olhava e sorria assim, a alegria a escorrer-lhe pelo rosto.

Só que o meu sonho, naquela altura, mesmo gostando que ela me beijasse e metesse as mãos dentro das minhas calças, não era ter a alegria do olhar e do sorriso a escorrer-lhe pelo rosto.

Era ser um engenheiro.

Comprei o bilhete, voltei ao bar, sentei-me, acendi um cigarro, chamei o Viana e pedi-lhe mais uma cerveja.

O Totó continuava a sorrir-se, e a olhar-me.

Desviei os olhos. Aquele sorriso e aquele olhar feliz incomodavam-me.

Dei uma passa e olhei as mesas vazias, e uma sensação de frio fez-me estremecer.

Mas não era frio o que sentia, eu sabia.

Quando saísse do cinema poderia sentar-me outra vez naquela mesa, ir para casa ou para qualquer outro lugar.

Vila Nova de Pardais não é uma vila grande, mas é a maior vila do mundo se a gente não tem para onde ir, ou não quer ir para onde pode.

O erro não tinha sido da Manuela, nem de nenhuma das Manuelas que tinham passado na minha vida. Eu é que tinha errado. Tinha trocado a Laurindinha por nada, e nunca conseguira destrocá-la.

Nem vi quando o Viana trouxe a cerveja. Quando olhei, a garrafa e o copo já estavam à minha frente.

Bebi um gole, dei uma passa, e levantei os olhos até à fotografia do Totó.

Mas nem cheguei a vê-la.

Parada à minha frente, era a Laurindinha que sorria e olhava para mim.

 

17

Fechei os olhos e a Laurindinha sorriu-se e olhou para mim, e eu vi o Viana abraçar a garrafa e ambos dançarem a cana verde ao som do cante alentejano.

Sorri-me também, e a cana verde dançou à minha volta, rasgou o meu diploma e atirou os pedaços do papel para debaixo da cadeira.

O Viana fez o quatro e tocou castanholas, e eu pedi-lhe que trouxesse uma cerveja Laurindinha.

A Laurindinha sorriu-se e olhou para mim, e o cante alentejano abençoou-me e vomitou no meu pescoço.

Uma lua saltou no chão e escondeu-se no banheiro, e o pum da tampa da sanita explodiu dentro do meu copo.

A mesa trepou pelas paredes, e a cerveja ferveu dentro dos meus bolsos.

A Laurindinha sorria-se e olhava para mim, e a Elena pediu um prego no prato e um guardanapo dos antigos.

A Laurindinha sorria-se e olhava para mim, e o Alfredo ensinou a bilheteira a testar materiais de construção no ecrã do telemóvel.

A Laurindinha sorria-se e olhava para mim, mas não foi a Anna que bebeu a minha sede, nem foi a Lia que engoliu o meu espirro.

Foi o Pitágoras.

Se um retângulo não tem hipotenusa, os catetos também não têm netos. Nem o padre Adelfio é um emigrado na Suíça a dançar o tiroliro no chão do solidó.

A Laurindinha continuava a sorrir-se e a olhar para mim, e eu era o Totó, e tinha cumprido a minha decisão.

Vou a Londres receber o Prémio BAFTA de melhor Ator Coadjuvante.

Mas não fui.

Abri os olhos, bebi o resto da cerveja, chamei o Viana e pedi outra.

A Laurindinha já não estava parada à minha frente, nem se sorria, nem olhava para mim.

Era eu que estava só.

 

18

Se estivesse na rua agora, não teria nada que fazer, eu sei, e talvez até quisesse voltar outra vez para cá, e esperar o começo do filme.

Só que se estivesse na rua agora, ao menos estaria na rua.

Não estaria aqui sentado numa cadeira que não é minha, debruçado numa mesa que também não é minha, e a tomar uma cerveja que já não me apetece tomar.

Às vezes, eu quero comparar-me a um penedo ou até a um grão de areia.

Só que não adianta querer. Nem a merda de um penedo ou de um grão de areia eu posso ser.

Eu existo, estou aqui, eu sei. Só que além de existir, eu também sou.

Existir é estar presente, mas ser não é só estar presente.

Presentes, só presentes, estão o penedo e o grão de areia que eu não posso ser. As coisas que me rodeiam, que além de comporem o espaço ainda permanecem no tempo.

São eternas.

E eu não.

Eu sou apenas o que sou. Um ser que existe porque está presente, mas também é porque pensa, raciocina e questiona. Tem consciência do que quer ou pode não querer, e do que faz ou pode não fazer.

Se eu não fosse, não pensasse, não raciocinasse, não questionasse, não tivesse consciência do que quero ou posso não querer, do que faço ou posso não fazer, se eu apenas existisse, viveria no tempo.

Seria eterno.

Se eu não vivesse em função das coisas que me cercam, seriam elas que precisariam de mim, e não eu delas, porque de tudo que existe só elas ficarão.

Eu sou o que é, o que pensa, o que raciocina, o que questiona, o que tem consciência do que quer ou pode não querer, do que faz ou pode não fazer, mas também sou o que passa.

E é esta a maior contradição do meu estar-no-mundo. Eu sou o que é, o que pensa, o que raciocina, o que questiona, o que tem consciência do que quer ou pode não querer, do que faz ou pode não fazer, só que também sou o único que sabe que nasceu para morrer.

A Manuela estava certa.

Eu nunca soube chegar no tempo certo. Ou me antecipava e nada conseguia, ou me atrasava e também nada conseguia.

A Manuela sempre esteve certa.

O meu tempo nunca acertou com o tempo.

De nada, ou de ninguém.

 

19

Sexta-feira, dezasseis de novembro.

Fiz hoje trinta e dois anos, e encontrei o meu motivo.

Só há uma maneira de ser feliz.

Fazer o que há muito devia ter feito, e não fiz.

 

20

Agora estou aqui, na minha cama.

Entre quatro paredes que recortam o horizonte à minha volta, e a escuridão escorre nos meus olhos.

Perdido no silêncio, o tempo dorme na eternidade da distância.

Pode parecer que estou só, mas não estou.

Estou comigo, e com a absoluta certeza de ter encontrado o meu motivo.

Vila Nova de Pardais ficou lá, esquecida no ontem, sem memória, sem espaço e sem regresso, e agora só o silêncio e a quietude me rodeiam.

Sei que dentro em pouco o sol vai nascer, e será um novo dia.

Será um novo dia, mas será meu.

Só meu.

Agora, já não tenho medo.

Estou neste quarto, deitado na minha cama, apaguei todas as luzes e sinto-me bem, aqui deitado sem nada poder ver à minha volta.

Só a escuridão e o silêncio me rodeiam, e parece até que o meu corpo não tem peso, e pode até flutuar.

Se eu quiser flutuar.

Não sei que horas são, nem há quanto tempo estou aqui, e também não quero saber.

Sejam que horas forem, agora não importa.

Agora, tudo o que é meu está comigo.

Agora, a Laurindinha está comigo.

Vejo-a a subir ao muro, a pular para o meu quintal, e a correr ao meu encontro.

Vem a rir-se, abraça-me e beija-me, e aperta-me com força contra ela.

Sinto o meu corpo vibrar, e tudo à minha volta parece explodir.

Agora, Laurindinha está comigo, e o meu corpo flutua, implodido.

Sou feliz.

Fiz o que há muito devia ter feito, e agora a Laurindinha está comigo.

 

21

A Laurindinha era assim.

Todos os dias brincava no quintal, as tranças louras a balançarem e a baterem-lhe na cintura, e o vestido rodado sempre acima dos joelhos.

A Laurindinha sempre foi assim.

Sempre sorriu felicidade.

Os galhos da nespereira passavam por cima do muro, e do outro lado uma tábua pendurada num ramo da cerejeira servia de balouço.

A Laurindinha jogava a macaca no quintal dela, e eu jogava o berlinde no meu, só à espera que ela subisse no balouço.

Ela subia, começava a balouçar-se, e eu trepava na nespereira e escondia-me na folhagem.

E olhava-a.

A Laurindinha ria-se, abria as pernas, e balouçava-se com mais força.

Enfunado pelo vento, o vestido arregaçava-se e mostrava as coxas nuas e a cueca, repuxada pela tábua.

E eu olhava-a.

A Laurindinha não se importava que eu a visse.

Ria-se, abria mais as pernas, e balouçava-se ainda com mais força.

A Laurindinha era assim.

Sempre foi assim.

Sabia que eu a via, e gostava que eu a visse.

E eu gostava de a ver.

Mas troquei-a por nada, e nunca consegui destrocá-la.

Não jogo mais o berlinde no quintal, e o meu barraco foi-se.

Há muito caiu de podre.

Do outro lado do muro a Laurindinha também não joga mais a macaca, nem se ri, nem abre as pernas no balouço.

Troquei-a por nada, mas agora consegui destrocá-la.

Sou feliz.

A Laurindinha está comigo e eu com ela.

 

22

Na Natureza a perfeição é sempre inversamente proporcional ao Absoluto. Quanto mais eu penso, quanto mais eu raciocino, quanto mais eu questiono, mais a minha consciência me torna relativo e mais o Absoluto se distancia.

Só que eu já não penso, não raciocino, e muito menos questiono.

Agora sou feliz.

Fiz o que há muito devia ter feito, e a Laurindinha está comigo e eu com ela.

Para sempre.

 


Cunha de Leiradella
E-mail – leiradella@sapo.pt


revista triplov

INDICE / SÉRIE VIRIDAE / 01 / CUNHA DE LEIRADELLA

Portugal / junho 2021