Revista TriploV DE Artes, Religiões e Ciências

Direção|Maria Estela Guedes & Floriano Martins

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NICOLAU SAIÃO

ESCRITA E O SEU CONTRÁRIO

 

 

INDEX

 

Alguns dos poemas deste livro foram publicados em revistas e jornais tais como: TriploV, Decires (Argentina), Jornal de Poesia (Brasil) Velocipédica Fundação, Botella del Náufrago (Chile), El Establo de Pégaso (Espanha), DiVersos, Carré Rouge (França), Saudade, De Puta Madre (Espanha), Sibila (Brasil), Abril em Maio, La Otra (México), António Miranda (Brasil).

(Casa da Muralha, Arronches, Dezembro de 2009)

POEMAS DESENHADOS

 1.   MAYTE  BAYON

2. GIORGIO MORANDI

3. CARBAJAL

4. HUNDERTWASSER

1. MAYTE BAYON

Segredos quem os tem
 
Se fosse só
a toalha aos quadrados, o gato na soleira
o pão torrado, o peixe frito
era caso para lançar ao vento
muitos quilos de infinito
músicas de outrora, terrores
e uma que outra solidão pintada
 
Mas desta forma
não é preciso:
há sempre o mar, o frio, essências
 
e outros jogos eternos e inocentes. 

2. GIORGIO MORANDI

Ondas de sangue adormecem
solitárias, nocturnas, imprecisas
 
As veias são assim, na tela clara
das naturezas mortas
 
As tuas mãos, pausadamente
contam o tempo
da gestação dos frutos
   e desvendam-nos coisas nos sentidos
 
Uma aqui, outra ali

E depois nós olhamos
a árvore, a catedral, o rio imóvel
 
O copo e a maçã erguem melhor
o firmamento, a luz sobre as cadeiras
- são o retrato
   das diferentes imagens invisíveis
animais, vegetais e minerais
 
Um ruído lá fora
 
Um pequeno barulho pouco a pouco desfeito.

3. CARBAJAL

A gente podia
combinar isto de antemão. Eu dizia:
coloca neste ponto uma pedra. E tu punhas
o sinal azul de um enorme jardim.
Depois eu dizia: aqui faz falta
o som de um apito. E tu desenhavas
três crianças desesperadas. A seguir
eu adormecia. E quando acordava
tudo estava terrivelmente silencioso
 
Na porta, que se tornara transparente
estava pregado um papel amarfanhado.
Nele, estranhos riscos como feitos por garras.
 
Então aparecia de repente um anjo maneta
- que desatava a rir e de súbito se esfumava.
 
E sem sabermos como, era de novo manhã.

4. HUNDERTWASSER

Podes prestar-te a equívocos
no quarto da mansão inatingível.
 
Há sempre uma pergunta
uma resposta a outra coisa
um sentimento que se tornou em símbolo
 
Alguém que não está nessa paisagem
que nem sequer conhece os seus contornos
que é linha isso sim mas não por dentro
que é pele mas só na outra geometria
do que o pincel procura atormentado.
 
E às vezes nós olhamos um reflexo
de sol que cai onde as figuras existiram
 
e ilumina o seu perfeito contrário.

Revista TriploV de Artes, Religiões e Ciências, 5, Abril de 2010

   NICOLAU SAIÃO [FRANCISCO GARÇÃO]
 [
Monforte do Alentejo,1949, Portugal]
Poeta, publicista, actor-declamador e artista plástico. Efectuou palestras e participou em mostras de Mail Art e exposições em diversos países. Livros: “Os objectos inquietantes”, “Flauta de Pan”, “Os olhares perdidos”, “Passagem de nível”, “O armário de Midas”, “Escrita e o seu contrário” (a publicar). Tem colaboração dispersa por jornais e revistas nacionais e estrangeiros (Brasil, França, E.U.A. Argentina, Cabo Verde...).
CONTATO: nicolau49@yahoo.com

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