obras em processo
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Alguns dos
poemas deste livro foram publicados em
revistas e jornais tais como: TriploV,
Decires (Argentina), Jornal de Poesia
(Brasil) Velocipédica Fundação, Botella del
Náufrago (Chile), El Establo de Pégaso
(Espanha), DiVersos, Carré Rouge (França),
Saudade, De Puta Madre (Espanha), Sibila
(Brasil), Abril em Maio, La Otra (México),
António Miranda (Brasil).
(Casa da
Muralha, Arronches, Dezembro de 2009) |
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PLANISFÉRIO
PLANISFÉRIO
AQUI,
ALI, ACOLÁ
ATÉ AO
FIM
POSFÁCIO |
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PLANISFÉRIO |
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Gira o
tempo, gira o mundo, gira o olhar na
direcção do sol e o que gira é a nossa
estrela polar, o nosso horizonte
transtornado apanhado pelo negrume azulado
da lua, o firmamento de tudo sobre a nossa
casa, o nosso corpo e a visão da matéria
planisférica, violeta na manhã, branca na
tarde, multicolor no dia que corre
transborda se petrifica nas palavras nas
cores e visões nos desenhos do interior do
corpo, da criação do mundo e do mar que
rodeia os continentes imaginados que somos
que fômos que seremos quando o espírito a
glória do senhor das formas for simplesmente
um universo terreno e com tudo na sua
existência fluvial e matérica de atlas
imenso nos traços da nossa fotografia
completa. |
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AQUI, ALI, ACOLÁ |
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Não se vai longe correndo
não se vai longe
a carne é fraca
o vento quebra ao nosso lado as visões os
sinais
as presenças de gente e de lugares de
grandes
árvores solitárias
de portas que se abrem e de rostos sobre o
seu
rodapé de suas cicatrizes na madeira em que
se bate
não se vai longe
dói por dentro a memória
o desejo
os grandes passos as passadas ferindo lume
chispas mordentes de cavalo ou de avestruz
no deserto
nas ruas imprecisas
mortalmente atentas
Não
não se vai longe
o peito ressoa
a mão grita
o olho soluça
e é por dentro um motor sufocando nas bermas
o nosso crescimento implume
Por isso é necessário
e vivente como andar de coruja ou leopardo
como rapariga apaixonada num café de vila
remota
ir devagar
passo a passo
devagarinho como um ribeiro na pradaria
entre
árvores de fruto e plantas campestres
pé ante pé
com os dedos adejando com os lábios
rebrilhando
e soletrar fragmentos de uma palavra serena
sonora
breve
Ir devagar
como se adormecêssemos
como se habitássemos um bosque
como se de novo chegássemos à primeira luz. |
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ATÉ AO FIM |
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Quando entrei na sala vi num
relance que o meu demónio
estava deitado
A boca entreaberta, um resto de baba no
queixo de quem
Dorme justamente como um anjo.
A janela pouco cerrada e o sofá chegado
à plena luz
A manta já antiga azul e amarela roçava o
chão como se
Tivesse havido por ali discreta borracheira
dominical.
Congeminei
Que ele antes de reentrar vindo do etéreo
passara
por uma tasca ou que
aceitara a oferta toma lá dá cá de um
qualquer maltrapilho
Cheio àquelas horas entradotas de uma
modesta
fraternidade bebedora.
Olhando bem via-se-lhe contudo no rosto
uma vaga felicidade
Dizendo melhor uma centelha de contentamento
ou alegria, ou
assim como que a sensação de quem vira o
mundo
no seu lugar real
Vamos a ver, no fundo a lonjura dominava
Como se visse o cavalheiro por uns binóculos
ao contrário
Cheirava um pouco a flores e vagamente
a desodorizante
Um livro tombara no chão, ficara à espera
aberto anquilosado
Quando abri a porta da cozinha vi sobre
o fogão um tacho com
Uma iguaria qualquer com que se entretivera
certamente antes de cair no leito vencido
talvez pelas canseiras das últimas horas.
Se minha mãe estivesse viva decerto
lhe teria aplicado um raspanete
Uma expressão em dialecto se calhar
um tabefe levezinho. O meu pai
Poria na cara aquele sorriso suave dos dias
sem idade
Lá fora estrepitavam ruídos da cidade
barulhenta
Contos do dia e da noite, o irresistível
fascínio do desconhecido.
Sentei-me, a angústia apoderara-se de mim.
Uma frase estranha
Revirava-se-me na cabeça.
Quando olhei pela janela o horizonte
pareceu-me uma linha ténue.
Mais tarde, pensei, falaríamos a preceito.
Ou antes
por entre dentes eu diria talvez
coisas sobre a grande aurora ou então sobre
a memória
Sibilina dos sobreviventes imutáveis. |
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POSFÁCIO |
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Quanto ao resto, bom dia
que é o hábito, pois então
e grande é a seca nos campos
e fraco o oxigénio. Enxertias
nunca o mar as dá à mesma glória
- como eu vos compreendo! –
fica sempre o remorso
uma certa dor
de canto para canto
de telhado para telhado
palavra que cruza a estrada e não se vê
cair
e finda sob as rodas.
Constantemente
o barro e o cimento, a parede e o entulho
o leve esvoaçar da mosca morta
queira-se ou não, suba-se ou não se suba
E aqui Ele é que pode
e tem disso a matéria
irrecusavelmente
perversa.
Não há pois almas nocturnas
camisas penduradas na manhã
manteiga e queijo, toques de campainha
carteiros e gatos
não há nada
a não ser lá quando o rei faz anos
(o rei do Sul
e de outros pontos misteriosos)
um pouco de piedade
de tal forma que a luz
se apaga.
E aqui Ele é que sabe
e fixa a substância
intraduzivelmente
maldita.
Todos os que dizem que viram a imagem
todos os que sopram a penugem adivinhada
todos os que se calam depois do que calaram
todos os que se baixam até tocar o solo
enquanto caiem no solo
não são p’ra’qui chamados: miniatural
é a tristeza e a distância
verdade transitória
viscosamente bela.
E aqui Ele é que observa
a nossa voz: mãos
e números diversos trocando
entre si o espanto (a dimensão de oiro)
e a agonia
constante e luminosa.
Quanto ao resto, boa tarde
boa noite
boa hora
Boa miséria.
Atalaião de Portalegre – Arronches(Casa da
Muralha)
Junho de 2004-Dezembro de 2009
ns
(Tradução para a língua francesa de
Alexandre Centeno) |
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Revista TriploV de Artes, Religiões e
Ciências, 5, Abril de 2010 |
NICOLAU
SAIÃO [FRANCISCO GARÇÃO]
[Monforte do
Alentejo,1949, Portugal]
Poeta,
publicista, actor-declamador e
artista plástico. Efectuou palestras
e participou em mostras de Mail Art
e exposições em diversos países.
Livros: “Os objectos inquietantes”,
“Flauta de Pan”, “Os olhares
perdidos”, “Passagem de nível”, “O
armário de Midas”, “Escrita e o seu
contrário” (a publicar). Tem
colaboração dispersa por jornais e
revistas nacionais e estrangeiros
(Brasil, França, E.U.A. Argentina,
Cabo Verde...).
CONTATO: nicolau49@yahoo.com |
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