obras em processo
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Alguns dos
poemas deste livro foram publicados em
revistas e jornais tais como: TriploV,
Decires (Argentina), Jornal de Poesia
(Brasil) Velocipédica Fundação, Botella del
Náufrago (Chile), El Establo de Pégaso
(Espanha), DiVersos, Carré Rouge (França),
Saudade, De Puta Madre (Espanha), Sibila
(Brasil), Abril em Maio, La Otra (México),
António Miranda (Brasil).
(Casa da
Muralha, Arronches, Dezembro de 2009) |
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MOMENTOS
MOMENTO 1 (Serra de São Mamede)
MOMENTO 2 (Niagara Falls)
MOMENTO 3 (Georgian Bay)
MOMENTO 4 ( Serra de Portalegre)
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MOMENTO 1 (Serra de São Mamede) |
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Na região que habito, algures entre a África
e a América, num lugar de montanhas e de
florestas com pequenos cursos de água e
casas entre as árvores, os entardeceres são
quase iguais aos de qualquer parte não fôra
o aparecimento repentino de figuras que não
sei nomear. Às vezes soam pelas quebradas trilos de
flautas e solos de saxofone vindos como que
do interior da terra. Ou será do ar que gira
como se estivesse em sobressalto? Não é
certamente das habitações, plasmadas num
estranho sossego.
Em certos dias o horizonte perde-se na
bruma. Então as figuras agitam-se, ganham
tons mutáveis e luminosos e os que ali
residem sentem uma brusca exaltação. As
mulheres erguem os braços e rodopiam,
observadas pelos homens que não ousam
proferir palavra. Já houve quem visse alguns
com o pranto a escorrer pelas faces. |
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MOMENTO 2 (Niagara Falls) |
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Quando se chega da estrada que atravessou a
pradaria e os bosques, é o espanto: como é
que aquilo é possível? A seguir vem o
encantamento: o rio coberto, na parte de
cima, de ilhotas verdejantes e, na parte de
baixo, de uma nuvem de fumo de água de vento
e de remoínhos devido à força da "senhora do
nevoeiro" (lady in the mist).
A força? A graça, para melhor dizer, porque
aquela imensa e poderosa massa-de-água
possui uma elegancia, uma beleza a que
chamaria ática. Escorreita como uma
escultura criada por um deus artista e
benfazejo.
Ficam-se cinco, depois dez minutos, depois
um quarto de hora. Depois meia hora e a
seguir vai-se até à loja de recordações e
merca-se o que o bolso nos pode dar.
Depois volta-se - para mais uma vez se
lavarem os olhos naquela maravilha que
também surpreendeu Chateaubriand.
Porque ela é a melhor recordação. Que nos
acompanhará, interiormente, pelo resto do
nosso tempo. |
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MOMENTO 3 (Georgian Bay) |
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Um perfume de paz. Árvores e mais árvores e
um esquilo cinzento que, de súbito, salta
quase junto aos nossos pés.
Num segundo, percebe-se que a felicidade é
possível - por um momento que nos parece
incorruptível.
Ao longe, o grito de uma ave de que nunca
saberemos o nome. O castanho dourado da
ramaria e, por sobre a colina, ao fundo, o
sol sobre a praia do Lago Huron. Quase como
se fosse em Carcavelos, não estivéssemos no
antigo território dos corajosos guerreiros
dos Grandes Lagos.
Em Sainte-Marie-des-hurons subi a um pequeno
forte para turista ver, enquanto os meus
companheiros desciam ao restaurante servido
por empregados índios.
Absolutamente só, olhando o rio e as
florestas naquele fim de tarde, senti
chegarem até mim as memórias adolescentes
das histórias lidas no "Cavaleiro Andante".
Depois, com a nostalgia a coalhar-se-me na
garganta e nos olhos, fui para o restaurante
acompanhá-los num retemperador "indian steak
on the plate"... |
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MOMENTO 4 ( Serra de Portalegre) |
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Ir à serra entre Porto da Espada, S. Julião
e a Teixinha, em certos dias acalma-me e
ilumina-me: é um dos locais mais isolados do
Alentejo, um verdadeiro mundo à parte.
Nessas alturas é-se imperiosamente suscitado
a contemplar a urze do monte. E algumas
paredes derruídas que, saiba-se lá porquê,
ali existem. Seja-se Sagitário, Peixes,
Virgem ou Leão, quem pode escapar à sua
beleza, à sua serenidade na tarde cheia de
sol ou sob as estrelas nascentes?
Tive de a fotografar. Mas depois as fotos
agiram sobre mim num poderoso impulso e
resolvi de chofre acrescentar-lhes elementos
desenhados que as transformaram noutra
estrutura. Ficaram de maneira peculiar
(entre o mineral e o imaginado, o existente
e o rigorosamente inconcebível) e parece-me
que se uniram nelas o concreto da natureza e
o abstracto da desconstrução. |
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Revista TriploV de Artes, Religiões e
Ciências, 5, Abril de 2010 |
NICOLAU
SAIÃO [FRANCISCO GARÇÃO]
[Monforte do
Alentejo,1949, Portugal]
Poeta,
publicista, actor-declamador e
artista plástico. Efectuou palestras
e participou em mostras de Mail Art
e exposições em diversos países.
Livros: “Os objectos inquietantes”,
“Flauta de Pan”, “Os olhares
perdidos”, “Passagem de nível”, “O
armário de Midas”, “Escrita e o seu
contrário” (a publicar). Tem
colaboração dispersa por jornais e
revistas nacionais e estrangeiros
(Brasil, França, E.U.A. Argentina,
Cabo Verde...).
CONTATO: nicolau49@yahoo.com |
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