Profª Elisa Ferreira

A.M. GALOPIM DE CARVALHO


Indicada por Portugal, para integrar a Comissão Europeia, a Profª. Elisa Ferreira, em finais dos anos 90 e começos do novo milénio, teve papel de relevo na defesa e valorização do Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra d’Aire, na antiga Pedreira do Galinha.

Recordo, com saudade, o tempo em que, com ela, trabalhámos para salvar esta importante jazida.

Senhora prestigiada em Portugal e na Europa, com largo currículo no Parlamento Europeu, tem toda a minha gratidão, por tudo o que, enquanto Ministra do Ambiente, desenvolveu em prol do nosso Património Natural.

Ao tempo desta grande Senhora como Ministra do Ambiente e como todo o seu interesse e apoio, foi organizado um grupo de trabalho coordenado pela Arqtª. Maria João Botelho, então directora do Parque Natural das Serras d’Aire e Candeeiros (PNSAC), o Eng.º. Carlos Caxarias, em representação da Direcção Geral de Minas, o Dr. José Manuel Alho, da Quercus, o industrial Rui Galinha, o vereador David Catarino, hoje presidente da Câmara Municipal de Ourém, o vereador Pedro Ferreira, da Câmara Municipal de Torres Novas e uma representação do Museu Nacional de História Natural chefiada por mim.

A este entusiasmante e frutuoso trabalho seguiu-se a classificação da jazida como Monumento Natural (Dec. Reg. 12/96 de 22 de Outubro) e a entrega do sítio à administração do PNSAC.

Posteriormente à divulgação deste projecto, em Janeiro de 1997, foi criado pelo Instituto de Conservação da Natureza, por diligência da então Presidente Profª Teresa Andresen, um grupo de trabalho visando o “Programa de Intervenção no Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra d’Aire”, coordenado pelo Dr. José Manuel Alho, de que fiz parte e no qual pudemos contar com a valiosa participação do Arqtº. Martins Barata. Os trabalhos prosseguiram a bom ritmo, havendo sempre, na altura, enquanto durou a equipa ministerial liderada pela Profª Elisa Ferreira, boa vontade na disponibilidade financeira para executar algumas das propostas iniciais e outras surgidas no seio deste grupo de trabalho.

Desde a sua abertura ao público e até 2002, houve financiamento para inovações importantes, com destaque para o “painel do tempo”, uma pintura mural com 25 m de comprimento, da autoria de Martins Barata, anexa ao Jardim Jurássico, e o “Aramossaurus”, uma enorme estrutura metálica, estilizando um gigantesco saurópode em tamanho natural, do tipo daqueles que deixaram ali os seus rastos há 175 milhões de anos, concebida pelo mesmo arquitecto.

Os mais longos e os mais antigos

– Está lá? Bom dia! Desejava falar com professor Galopim de Carvalho.

– Sou eu próprio. Diga, se faz favor.

– Fala João Carvalho. Estou a telefonar-lhe de Torres Novas. O senhor não me conhece, mas estou a ligar-lhe porque temos aqui algo que julgo lhe irá interessar bastante. Encontrámos pegadas de dinossáurios aqui, na serra. É numa pedreira de calcário para brita com intensa actividade e é preciso evitar a destruição desta maravilha. Venha ver e verá que não nos enganámos. Seria bom contarmos consigo para o anúncio público do achado que desejamos fazer imediatamente…

Tudo começou assim, com um telefonema pela manhã do dia 6 de Julho de 1994. Numa paisagem eminentemente calcária, no flanco oriental da Serra d’Aire, pedregoso, cinzento, marcado pela implantação espaçada de oliveiras, azinheiras e figueiras, João Carvalho e os seus companheiros da Sociedade Torrejana de Espeleologia e Arqueologia acabavam de descobrir, na Pedreira do Galinha, entre Torres Novas e Fátima, os mais longos e também os mais antigos trilhos de dinossáurios saurópodes de que havia conhecimento.

Foi no Bairro, um lugar da freguesia de Nossa Senhora das Misericórdias, do concelho de Ourém, que “Alfredo Galinha, Lda.” iniciou, há décadas, a exploração da pedreira que trouxe à luz do dia a que se tornou uma das mais famosas jazidas com pegadas de dinossáurios do mundo. Exposta na imensa laje que constituía o fundo da pedreira, então ainda em plena laboração, cedo se tornou notícia entre a comunidade científica nacional e internacional. Ao mesmo tempo polarizávamos as atenções do grande público, mercê de um tratamento insistente e interessado dos órgãos de comunicação social, desde as televisões e grande imprensa escrita de Lisboa e Porto, aos menos conhecidos jornais e rádios locais do interior.

Vários atributos fizeram desta jazida um caso único, não só do lado de dentro das nossas fronteiras, como à escala do planeta. Com efeito, a abundância e perfeição das pegadas, em número de muitas centenas, organizadas em duas dezenas de trilhos, dois dos quais com mais de 140 m, constituíram, desde logo, um factor de enorme interesse para o achado. A grande pista de Pego Longo (Carenque), com os seus 138m, perdia aqui a sua “posição no Guiness”, mas Portugal reforçava a sua importância no domínio da Paleoicnologia[1]. Por outro lado, a idade da camada de calcário que conserva um tal testemunho da passagem destes animais, atribuída ao Jurássico médio, com cerca de 175 milhões de anos, representa outra novidade para a paleontologia. Provou-se aqui que este grupo de grandes herbívoros já existia bem representado nesta altura, isto é, uns 25 milhões de anos mais cedo do que o intervalo de tempo que era atribuído à sua passagem pela Terra. As marcas aqui deixadas indicam alguns animais de grandes dimensões, na ordem dos 30 metros de comprimento e dezenas de toneladas de peso, o que constitui mais um elemento valorativo da ocorrência. Por outro lado, o grande número de trilhos é indicador de determinados comportamentos individuais e sociais. A nitidez e boa definição das pegadas forneceram elementos que ajudam a caracterizar a morfologia das extremidades dos membros. Finalmente, as dimensões invulgarmente grandes da superfície (250x250m) contendo os icnofósseis[2] – uma única laje, levemente basculada para Norte, no sentido do escarpado (com 30m de altura) deixado pela frente de exploração – dão à jazida invulgar espectacularidade, susceptível de ser apreciada a partir de diversos locais de observação, quais miradouros espalhados ao longo de um percurso pedonal coincidente com o contorno da pedreira.

Na sequência do achado, o senhor Rui Galinha, filho do anterior concessionário, interrompeu a exploração na zona das pegadas, o que permitiu limpar a imensa laje dos escombros que parcialmente a ocultavam. Após estudo preliminar realizado no nosso Museu, solicitei à Fundação Luso-Americana a vinda a Portugal do Prof. Martin Lockley, o mesmo cientista da Universidade do Colorado, em Denver, que viera, um ano antes, dar-nos o seu apoio na luta pela jazida de Pego Longo. Entusiasmado pelo interesse científico, grandiosidade e espectacularidade desta jazida, este colega elaborou um parecer altamente favorável à defesa de mais este importante património paleontológico, a fim de ser presente ao governo e às duas câmaras, Ourém e Torres Novas, que partilham entre si a área ocupada pela jazida.

Entretanto, organizou-se um grupo de trabalho coordenado pela Arqtª. Maria João Botelho, então directora do Parque Natural das Serras d’Aire e Candeeiros (PNSAC), o Eng.º. Carlos Caxarias, em representação da Direcção Geral de Minas, o Dr. José Manuel Alho, da Quercus, o industrial Rui Galinha, o vereador David Catarino, hoje presidente da Câmara Municipal de Ourém, o vereador Pedro Ferreira, da Câmara Municipal de Torres Novas e uma representação do Museu Nacional de História Natural chefiada por mim. O local de reunião foi o escritório da própria pedreira e para ali se correu regularmente durante meses até se conseguir o objectivo final: salvar a jazida.

Estava-se em plena campanha eleitoral para as legislativas. Aproveitando a visita a Torres Novas do candidato do Partido Socialista, António Guterres, foi-lhe mostrada a jazida, que não deixou de o impressionar. Combinei então com um dos elementos da sua comitiva, o deputado Jorge Lacão, subir ao carro adaptado a palco, no comício que ali se realizou, na praça da República. Aí, questionei o candidato com a frase que levava bem ensaiada:

– Senhor engenheiro, se for eleito, qual será a sua decisão sobre a grande jazida da Pedreira do Galinha?

– Vamos salvá-la. – Foi a resposta.

Com efeito, uma vez eleito, o novo Primeiro-Ministro fez cumprir a sua palavra. Face a um tão vasto e importante conjunto de predicados, não foi difícil obter da nova administração central o total empenhamento na salvaguarda deste importante património. Assim, após conversações entre o governo e o industrial, foi acordado pôr fim à exploração, mediante uma indemnização de cerca de um milhão de contos ao concessionário, a que se seguiu a classificação da jazida como Monumento Natural (Dec. Reg. 12/96 de 22 de Outubro) e a entrega do sítio à administração do PNSAC. Cabe aqui lembrar o papel significativo da Ministra do Ambiente, Prof.ª Elisa Ferreira, que deu todo o seu apoio a esta causa. Era Ministro das Finanças o Prof. Sousa Franco. Numa primeira fase e a par de um estudo mais aprofundado, no âmbito de um projecto de investigação do nosso museu e da minha responsabilidade científica, aquele organismo conseguiu abri-la ao público com um mínimo de equipamentos que permitissem uma visita satisfatória, antecedida de uma explicação prévia em vídeo, seguida de um percurso a pé, ao longo de um itinerário traçado, apoiado com vários painéis explicativos. Satisfazia-se, assim, ainda que provisoriamente, alguma pressão que se fazia sentir por parte da imprensa e de um público legitimamente curioso e sempre interessado.

A musealização da Pedreira do Galinha contempla esta jazida como local de interesse científico, pedagógico, cultural, recreativo e de lazer e, por todas estas razões, também, turístico. Científico, porque tem sido e continua a ser alvo de estudo; pedagógico, na perspectiva de prestar apoio ao ensino, dirigido a grupos escolares nas áreas da geologia regional (Maciço Calcário Estremenho), da paleontologia e da paleobiologia dos dinossáurios, da educação ambiental e, ainda, na reciclagem e na actualização de conhecimentos destinadas a educadores e professores. Cultural, na medida que tem preocupações de divulgação do saber científico, destinado ao público, não só no domínio da temática da jazida, como no das Ciências da Natureza e do Ambiente, em geral. O interesse recreativo e de lazer tem em conta as perspectivas pedagógicas e culturais. O aproveitamento turístico, por enquanto intencionalmente moderado, será função do investimento que aqui se venha a fazer e na perspectiva de que ali, mesmo ao lado, dez quilómetros a Norte, o Santuário de Fátima recebe milhões de visitantes por ano.

Em 1996 concebi, com o apoio do Arqtº. Mário Moutinho, um programa preliminar de musealização deste sítio, que submeti à apreciação de responsáveis, a diversos níveis, do Ambiente, da Educação, da Ciência e Tecnologia, da Cultura, da Juventude e do Turismo, constituindo um primeiro documento onde se propunha um plano de acção a curto, médio e longo prazos, visando a implantação, no local, de uma vasta estrutura museológica e demais equipamentos de apoio. Desse programa, que se perdeu nas gavetas das administrações, constava um vasto conjunto de ideias que a seguir se transcrevem para que se saiba relativamente a elas, o que se fez e o que se não pôde ou não quis fazer.

1- Restauro e consolidação da camada de calcário que contém as pegadas, mediante intervenção adequada nas zonas esmagadas e/ou fracturadas pelas cargas de dinamite e sujeitas à erosão pelas águas pluviais. Aplicação periódica de produtos (resinas ou outros a definir) para impregnação da capa superficial do calcário, com vista a minimizar os efeitos dos agentes atmosféricos, numa tecnologia já usada, por exemplo, em La Rioja, na vizinha Espanha.

2 – Valorização das pegadas operando experiências de sombreado (com corantes a definir) que as valorizem qualquer que seja a incidência da luz solar, ou em dias de céu encoberto e iluminação difusa, aliás muito frequentes. Esta sugestão, que não foi adoptada, é a que melhor reproduz a imagem que se tem pela manhã, em dias de sol, evocando um cenário de grande realismo, como se tivessem acabado de passar por ali os dinossáurios de que aqueles trilhos são testemunho. Nunca consegui convencer os responsáveis por este Monumento Natural da necessidade deste procedimento que tive oportunidade de apreciar numa jazida na Alemanha. O recurso à pintura uniforme do total das pegadas, como foi ali tentado, anula-lhes o relevo, oferecendo uma imagem irreal, estampada na pedra, que se afasta do realismo que deveria ser procurado.

3 – Implantação de um sistema de passadeiras, sobrelevadas 20 a 30 cm do chão, ladeando os principais trilhos, com gradeamento, que permitissem ao visitante percorrê-los sem pisar a laje, num circuito cómodo. Esta sugestão também não foi adoptada e hoje, com escassos anos de abertura desta jazida ao público, já se vê na laje o efeito desagradável do pisoteio de milhares e milhares de visitantes.

4 – Criação de um jardim com plantas de grupos característicos do Jurássico e ainda existentes, a localizar num recanto da pedreira, há muito abandonado e abrigado do quadrante norte, exemplificativo da flora contemporânea dos dinossáurios que ali viveram. Este recanto seria valorizado pela simulação de um ambiente tropical, húmido e quente, em regime de estufa. Entre as plantas e por indicação do Prof. Fernando Catarino, deveriam figurar, ali Equisetum, Polipodium, Pteridium, Cycas, Ginkgo, Araucaria, Podozamites, Cupressus, Taxodium, Podocarpus, etc.. No interior deste jardim, projectava-se a localização de um lago naturalizado. Da superfície da água deste lago propunha-se que saísse, o longo pescoço e a cabeça de um saurópode, dispensando, assim, a execução do restante corpo do animal (a mais dispendiosa) cuja presença submersa fica subentendida. Esta proposta de jardim Jurássico foi recuperada mais tarde. Porém, o lago, longe de ter o aspecto natural de um charco, foi construído com a forma de uma elipse, mais parecendo um lago de jardim. Fazer sair da água o pescoço de um herbívoro, semelhante aos que ali deixaram as pegadas, constituiria um elemento pedagógico sugestivo e de custo reduzido.

5 – Aproveitamento de um percurso na periferia do sector da pedreira, onde se distribuem as pegadas, para circulação pedonal com definição de locais de observação apoiados em painéis explicativos. Neste percurso, minimamente naturalizado e equipado (bancos, guaritas, cestos para papéis e lixo, bebedouros, sanitários), deveria ser privilegiado, como miradouro, um local bem definido a WSW, no enfiamento dos dois trilhos principais, uma vez que é daqui que se obtém a visão mais grandiosa e espectacular da jazida. Este miradouro não foi instalado.

6- Em complemento deste importante património natural, propunha-se a construção, no local, de um Museu e Centro de Interpretação com o equipamento adequado (auditório, biblioteca e arquivo, salas de exposições e oficinas pedagógicas, refeitório, cafetaria, sanitários etc.) e, no exterior, em complemento, um parque de merendas.

7 – Num pavilhão concebido para o efeito previa-se a exposição de réplicas, robotizadas ou não, de dinossáurios de corpo inteiro e de outras dos seus esqueletos montados em posição de vida, podendo, assim, oferecer-se ao visitante um complemento do maior interesse pedagógico.

8 – Montagem de um conjunto de elementos de significado mineralógico, petrográfico, paleontológico e estratigráfico, ordenados num percurso, ao ar livre, onde seriam realçados alguns aspectos curiosos da constituição e da história da Terra e da Vida. Recorrer-se-ia quer a grandes amostras mineralógicas, petrográficas e paleontológicas, quer a blocos e placas de rochas serradas e polidas, quer ainda a cantaria e estatuária.

9 – Como equipamentos recreativos e de laser, sempre com sentido pedagógico, propunha-se um circuito pedonal concebido como uma viagem no passado da Terra, ao longo do qual se poderia observar uma sucessão convenientemente escolhida de réplicas, em tamanho natural, de dinossáurios e de outros animais que só conhecemos através dos fósseis, incluindo, no final, o Homem pré-histórico, bem enquadrados em encenações adequadas, com vegetação arbórea e arbustiva compatível, à semelhança do que existe no museu de ar livre de Münchehagen (Hanover, Alemanha).

10 – Tendo em conta a grandiosidade da jazida e a proximidade de um centro grandemente atractor de visitantes – Fátima -, foi considerada a hipótese de instalar aí um complexo sistema informatizado, em realidade virtual, com utilização de “luz lazer”, para apresentação, em espectáculos nocturnos de luz e som, durante os meses estivais.

11- Complementaria este sector um “comboio do tempo”, no género dos conhecidos comboios-fantasmas, circulando num “corredor do tempo” onde, com recurso aos novos meios de imagem, o visitante pudesse recuar à pré-história.

12 – Ainda nesta área teria existência um jardim infantil equipado com elementos usuais neste tipo de espaço, tais como carroceis, baloiços, escorregas, etc., concebidos com base em estilizações de dinossáurios e de outros animais pré-históricos.

13 – A jazida tem como fundo de horizonte próximo, a NE, um cabeço arredondado onde poderiam ser colocadas silhuetas gigantes de saurópodes (à semelhança do touro da “Domecq”, em Espanha). Do lado oposto, a NW, um cabeço mais amplo e mais próximo, permitiria a implantação de uma manada de adultos e crias de saurópodes, descendo a vertente, no sentido da jazida.

14 – A instalação de um teleférico com um traçado convenientemente escolhido sobre a área do complexo museológico seria uma hipótese a considerar.

15 – Integrados neste vasto sector sugerimos a existência de um restaurante com área coberta e esplanada, cafetaria(s) e gelataria(s), quiosques e um sector comercial com pequenas lojas, em área a fixar.

16 – A conceber na imediata vizinhança do complexo museológico, propõe-se a instalação de uma Pousada, cujo número de camas seria definido após estudo conveniente.

17 – Com um número de camas a definir, sugeriu-se a hipótese de adaptação a albergue de juventude de uma construção situada 400 m a NW da jazida, de momento com um impacte visual negativo, mas susceptível de beneficiação.

18 – Em apoio aos visitantes considerou-se a criação de um parque automóvel para ligeiros e pesados, a definir em função das estimativas que fossem avançadas em termos de frequência de visitantes.

19 – Os anúncios publicitários do complexo museológico, para além daqueles a colocar nas estradas interiores de acesso ao local, a partir de Fátima, de Torres Novas, de Ourém, etc., deverão incluir informação adequada na auto-estrada A-1 (Lisboa-Porto).

Os equipamentos de apoio ao visitante seriam concebidos arquitectonicamente em função da “paisagem” e da temática do complexo, em moldes a definir pelos responsáveis do mesmo. O seu funcionamento seria igualmente pautado por regras previamente estabelecidas em obediência aos mesmos princípios.

Com vista à conveniente musealização do que passou a ser designado por Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra d’Aire, o Museu Nacional de História Natural assinou, em 18.05.98, um protocolo com Instituto de Conservação da Natureza, o Instituto de Promoção Ambiental e a Associação para o Desenvolvimento das Serras d’Aire e Candeeiros. Neste espírito, seja qual for o regime (público ou privado) da sua exploração turística, o Museu, através da sua nova direcção, continua a ter competência para participar na elaboração das citadas regras e na fiscalização do seu cumprimento por parte das eventuais entidades concessionárias, e deverá ser chamado a fazê-lo. Além deste aspecto, o Museu, como única entidade neste processo com idoneidade científica para o objectivo em vista, deverá continuar a participar na produção de toda a documentação informativa no que concerne os aspectos científicos, pedagógicos e culturais da ocorrência, tais como guias, folhetos, brochuras, cartazes, postais, diapositivos, vídeos, DVDs, etc..

Posteriormente à divulgação deste projecto, foi criado pelo ICN, em Janeiro de 1997, por diligência da então Presidente Teresa Andresen, um grupo de trabalho visando o “Programa de Intervenção no Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra d’Aire”, coordenado pelo Dr. José Manuel Alho, de que fiz parte e no qual pudemos contar com a valiosa participação do Arqtº. Martins Barata. Os trabalhos prosseguiram a bom ritmo, havendo, na altura, disponibilidade financeira para executar algumas das propostas iniciais e outras surgidas no seio deste grupo de trabalho, isto enquanto durou a equipa ministerial liderada pela professora Elisa Ferreira. Desde a sua abertura ao público e até 2002, houve financiamento para inovações importantes, com destaque para o “painel do tempo”, uma pintura mural com 25 m de comprimento, da autoria de Martins Barata, anexa ao jardim jurássico, e o “aramossaurus”, uma enorme estrutura metálica, estilizando um gigantesco saurópode em tamanho natural, do tipo daqueles que deixaram ali os seus rastos há 175 milhões de anos, concebida pelo mesmo arquitecto. Esta mais valia, assim chamada porque o estudo inicial, em modelo reduzido, foi construído em arame, está implantada em local cimeiro, é visível de todos os pontos do Monumento Natural. Após este período excepcional pouco mais ali foi avançado, por falta de financiamento, não obstante a vontade e o esforço dos responsáveis directos pela gestão deste que é o mais grandioso geomonumento deste género conhecido na Europa. Houve, no entanto, aspectos que podiam ter sido e não foram contemplados, pelos quais me tenho empenhado sem conseguir a sua concretização. São eles, nomeadamente, a consolidação da laje, o sombreado das pegadas, a passadeira elevada, ladeando os trilhos, e a naturalização do lago.

O mais procurado dos monumentos naturais portugueses que, sem qualquer apoio publicitário, conta cerca de 50 000 visitantes por ano, está já a evidenciar aspectos preocupantes de abandono, decorrentes das restrições próprias do período que estamos a viver.

Tenho esperança que, num futuro próximo, o essencial das propostas apresentadas tenha a devida concretização e que, à semelhança do que aqui se fez nos primeiros tempos de abertura ao público, os trabalhos possam continuar faseadamente. O valor e a grandiosidade deste Monumento Natural justificam um investimento compatível, na certeza da sua grande rendibilidade, uma previsão realista que tem, igualmente, em conta a proximidade (10km) de Fátima, cujo Santuário chama, anualmente, vários milhões de visitantes.

 

[1] – Ramo da Paleontologia que estuda as marcas deixadas pela actividade dos seres do passado, tais como pegadas, ovos e outros vestígios.

[2] – Impressões, marcas ou vestígios deixado por seres do passado.


 

A.M. GALOPIM DE CARVALHO