As televisões vêm apresentando uma "onda de
indignação" pelo que está a suceder na Faixa de Gaza. Não sei até que
ponto o que a comunicação social apresenta corresponde à verdade
verificável, pois uma das características da "nova Idade Média" em que
vivemos é a manipulação política dos factos nos órgãos de comunicação,
através de imagens falsificadas e de discursos verbais modelados pela
hipocrisia. Assim sendo, gostaria que alguém me explicasse, com os
devidos fundamentos sociológicos, históricos e científicos:
1. Como podem os habitantes de um país defender-se de atentados
constantes à sua dignidade física e psicológica, se esses ataques são
movidos por um terrorismo que visa destruir a sua existência enquanto
comunidade organizada em Estado independente e democrático?
2. Que vantagens trará aos habitantes desse país (tenham a identidade
cultural que tiverem) a substituição de um regime democrático por uma
teocracia tirânica e violadora dos mais elementares direitos humanos?
3. Como se distinguem, no meio de uma população civil, os terroristas
dos não-terroristas, os militantes de um movimento "de libertação" dos
"inocentes" que os rodeiam?
4. Que características físicas ou psicológicas dão mais valor aos mortos
de um grupo sócio-religioso e o retiram aos de outro?
5. Como é possível destruir as armas existentes em edifícios de
habitação, locais de culto ou estabelecimentos de ensino sem macular
quantos os povoam (talvez de propósito)?
6. Que mecanismos usa para promover a paz dos seus concidadãos um
movimento político-religioso cujo único objectivo é provocar o
adversário e defender a sua extinção física e cultural?
7. Que respeito tem pelo seu povo um grupo que usa os seus conterrâneos
como escudos humanos, expondo-os à violência e à morte?
8. Que consideração tem pelos seres humanos um grupo armado que usa as
crianças como combatentes e/ou as educa para a futura prática de
atentados?
9. Como é possível existir uma verdadeira paz sem que haja,
simultaneamente, uma prática constante de tolerância mútua?
10. Que razões têm levado, nas últimas décadas, muitos dos antigos
defensores do "paraíso de leste" a transferirem para a "tolerência
islamita" os seus ditirambos e louvores?
Quando essas explicações surgirem, talvez possamos entender quem tem
razão e quem a não tem neste conflito. Não podemos esquecer que "o
discurso e a escrita política são em grande medida a defesa do
indefensável" e "a própria política é uma massa de mentiras, fugas,
tolices, ódio e esquizofrenia", como referiu George Orwell no seu ensaio
"Politics and the English Language". |
RUY VENTURA (Portalegre, 1973) é professor na península da Arrábida, a trinta quilómetros de Lisboa. Publicou, em poesia, Arquitectura do Silêncio (Lisboa, 2000; Prémio Revelação de Poesia, da Associação Portuguesa de Escritores), sete capítulos do mundo (Lisboa, 2003), Assim se deixa uma casa (Coimbra, 2003), Um pouco mais sobre a cidade (Villanueva de la Serena, 2004) e O lugar, a imagem (Badajoz, 2006); em 2009 editará o original Chave de ignição, com edição simultânea em Portugal (edições Cosmorama) e em Espanha (Littera Libros). Organizou as antologias Poetas e Escritores da Serra de São Mamede (Vila Nova de Famalicão, 2002), Contos e Lendas da Serra de São Mamede (Almada, 2005), Em memória de J. O. Travanca-Rêgo e Orlando Neves (na revista Callipole, nº 13, Vila Viçosa, 2005) e o livro José do Carmo Francisco, uma aproximação (Almada, 2005). Traduziu a antologia 20 Poetas Espanhóis do Século XX (Coimbra, 2003) e os livros de poemas Dias, Fumo, de Antonio Sáez Delgado (Coimbra, 2003), Jola, de Ángel Campos Pámpano (Badajoz, 2003) e A Árvore-das-Borboletas, de Anton van Wilderode (Badajoz, 2003). É colaborador de várias revistas nacionais e estrangeiras, nomeadamente espanholas, brasileiras e americanas. Poemas e/ou livros seus estão traduzidos em castelhano, francês, inglês e alemão. Como ensaísta, tem escrito sobre Poesia Contemporânea, Literatura Tradicional e/ou Oral e Toponímia.
Coordena o blogue Estrada do Alicerce (www.alicerces1.blogspot.com). |