José Geraldo Neres, da nova geração de poetas de Diadema-SP, vem desenvolvendo uma poesia lírica, na qual se percebe cada vez mais a tendência à concisão. Parte de sua produçao se volta para a temática social, como a presente na antologia "Poética Social: tempos perplexos", coordenada por Beth Brait Alvim, pelo Departamento de Cultura de Diadema, 2002. Obra que certamente o inspirou a editar na Internet a revista homônima, "Poética Social", da qual tenho a satisfação de ser um dos colaboradores. Nesse setor, sua poesia se revela vigorosa, manifestando-se em prol das minorias, dos excluídos, da paz e da justiça entre os homens. Outra vertente do poeta se revela mais complexa. Temos poemas de forte simbolismo, não raro recorrendo a imagens surrealistas e ao realismo fantástico. Talvez por essa razão, inclusive, sua poesia venha tendo boa receptividade por parte de editores de sites de língua hispânica, que têm divulgado o trabalho do autor. José Geraldo vem-se dedicando, igualmente, à poesia erótica, da qual se acham exemplos no site Escritora Vânia Moreira Diniz. O gênero faz parte do "Projeto Ambrosia". A singularidade que diferencia a poesia erótica de Neres da realizada pelos demais autores é comentada no penúltimo parágrafo. Por fim, há o gosto pela poesia de concisão máxima, os "poemínimos", trabalhos nos quais se despoja de todo peso, revelando seu lado mais leve, espirituoso e observador. Sem dúvida, nota-se aqui a influência da poesia oriental, em particular do haicai, que o poeta incorpora a seu modo bem peculiar. Entretanto, muitos dos poemínimos combinam a descontração da escrita, uma fala mais clara, livre e direta, com a preocupação social. Como se uma melancolia atrapalhasse a "brincadeira", nublasse o espírito, deixando no poema um rastro de sombra. Assim ocorre no belo terceto: lama negra Aliás, chama a atenção a quantidade de poemínimos em que crianças são mencionadas. E o verbo "brincar" aparece em outro terceto. Agora é o tempo que brinca, numa imagem simbólica, ambígua, ao mesmo tempo lúdica e dramática, podendo ainda servir de exemplo para o que falamos mais adiante sobre os estados meditativos, nos quais ocorre uma suspensão do fluxo do pensamento, o que, de certo modo, relaciona-se também a uma idéia de parada do fluir do tempo: o tempo brinca Voltando ao tema das crianças, é interessante como há alternâncias entre momentos de dor e sofrimento em contraste com outros de entrega e enleio. Vejamos mais alguns tercetos: lata na cabeça chora a criança samambaia o vento o silêncio da luz Nestas considerações, ressaltamos muitos tercetos. Entretanto, outros poemínimos do autor apresentam número diferenciado de linhas. Para exemplificar, encerremos com este, no qual aparecem as características de surrealismo e erotismo mencionadas anteriormente. Aliás, a sensualidade na poesia de José Geraldo foge ao trivial. Numa época em que o "sexo explícito" tornou-se lugar-comum no gênero, o poeta tem preferido recorrer à sensualidade implícita, muitas vezes transformando objetos e elementos da natureza em sujeitos ou intermediadores da ação, conforme sucede neste criativo poema relacionado ao Gênese: Naturalmente, estivemos longe de esgotar as possibilidades de leitura dos poemas mencionados. E há vários outros que nem sequer chegamos a citar, que fariam jus a uma análise. Nosso intuito foi apenas de fornecer algumas pistas, dar um retorno ao autor e também contribuir para que seus poemínimos consigam do leitor a atenção que merecem. ___________________________________ Ricardo Alfaya, jornalista, poeta e escritor carioca. Editor de Nozarte Informativo Impresso e Eletrônico. Autor de inúmeras resenhas, prefácios e ensaios literários. Nota: Para realização deste trabalho, recorremos a textos de José Geraldo Neres presentes no livro supracitado "Poética Social: tempos perplexos", coordenada por Beth Brait Alvim e também a poemas e informções constantes dos seguintes "sites" da Internet: Grupo Palavreiros de Diadema-SP; PD-Literatura (em página de março de 2003, apresentando seleção de poemas do autor por Silvana Guimarães); Portal da Poesia (de Adriana Zapparoli); e Site da Escritora Vânia Moreira Diniz. Rio de Janeiro, 23 de março de 2003. |