Portugalidades
- a meio caminho de troikas,
tricas e outras tretas
já contava
Pedro Homem e de Mello
este dito
que acredito por consolo:
nós
portugueses
somos castos
mas somos infinitos e ingentes
somos castros
somos bravos
contundentes e errantes
não sabendo ser escravos
nem gigantes
estamos sempre ao rés do mar
somos infantes
e ao sentirmos que a nossa barraca abana
marcharemos ‘inda além da Taprobana
temos sempre os barões assinalados
num padrão feito em granito
ou aos quadrados
e abrigamos nesta alma modos vários
seja o graal em tinto grito
dos templários
ou o esterco que atiramos ao vizinho
que por carência de jeito ou pouca graça
foi parar a um pelourinho
de desgraça
há em nós um fremir por dons de cura
e um anseio feroz
de sinecura
temos artes de em tudo fazer emendas
mas penamos por colher umas prebendas
que esta vida são dois dias
lá se diz
- e assim era
já p’ra lá de D. Dinis -
nós
portugueses
somos sempre…
- ou p’lo menos a maior parte das vezes –
o princípio da Europa e mais ao fundo
também somos para aqui um fim do mundo
ninguém é melhor que nós no
desenrasca
mas ninguém mais do que nós só vive à rasca
de rompante nos lançámos lá de Sagres
mas ninguém mais do que nós crê em milagres
e depois de abrirmos ao mundo tanto mundo
descobrimos que batemos bem no fundo
duma vida construída a acreditar
em Sebastiões que virão do além-mar
e há-de ser em manhã de nevoeiro
sem qualquer luz de sol ou candeeiro
assim somos perturbantes e ancestrais
e na força alucinada desta lida
poderá ter sido aqui
- oh muito antes! –
que caiu a partícula da vida
que nos veio dos confins universais
somos povo de poetas
de pintores
de artistas mais de mil
e de cantores
suportando muitas tretas
ditadores
somos povo dessas metas multicores
que mistura a genética e os amores
no globo deste mundo em toda a parte
para tanto nos sobrando engenho e arte
somos pois este povo de mil peças
que se esquece dos Camilos e dos Eças
de perdido a cumprir tantas promessas
… e eu que sou parte dele – ínfimo encarte
tenho assim para mim o doce enlevo
de que pago e pagarei tudo o que devo
mesmo até ao passar p’la vida breve
sem saber quem pagará quanto me deve…
25 de Outubro de 2013
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