PAULO BRITO E ABREU
A QUÁDRUPLA VISÃO UNITÁRIA
«Igne Natura Renovatur Integra.»
À Hermética Irmandade dos Amigos da Luz.
I
Ó noite odiosa e vil! Com uma apoplexia,
Em noite de Dezembro mais vil e sanguinosa,
Abandonei meu lar, pra ver se descobria,
Nalgum coral oculta, a essência da Rosa.
Furioso, bato a porta. No imo da noite,
Na latrina da noite odiosa e obscura,
Tive quatro visões que me foram açoite,
Açoite prà minh’Alma de vícios impura.
Na rua vejo um velho vergado p’la idade,
Mil rugas no seu rosto, os olhos carcomidos,
Que me dizia assim, sem dó nem piedade,
Na minha face vendo o estigma dos bandidos:
«Não sabes que ser velho é estar na noite vil,
Sem fortuna, sem Paz; viver coa solidão
Também não viverás, ó jovem d’albas mil.»
E afastou-se buscando uma côdea de pão.
Acima vejo um jovem de pernas mutiladas.
Era cego, era surdo, e estava exposto ao frio.
Tinha n’Alma uma cruz de pontas afiadas,
E no peito esse pus que possui o vadio.
«Toda a noite a implorar, sem ninguém que me acuda!
Sou Lázaro, na praça, orando em desconforto.
Minha Mãe, minha Mãe, tu vem, teu filho ajuda!
Por que deste, Mãe minha, ao mundo um vil aborto?»
E eu tremo, mas caminho. Os dedos encrespados,
Que Inferno, penso eu! Que noite mais abjecta!
Caminho e vejo ali, pra mal dos meus pecados,
De criança o cadáver sobre uma sarjeta.
II
Maldição, maldição! Toda a noite esse velho,
Toda a noite o doente, o cadáver, a peste,
Por ali ficarão, só pra meu destrambelho,
Dando o pus à rapina e nutrindo o cipreste.
Maldita sejas tu, cadela dos Infernos,
E maldita, maldita, a Porca louca, louca!!!
Mas enquanto eu cuspia líquidos internos
E a minha voz cansada ia ficando rouca,
A Rosa me apar’ceu de dulcíssimo aspeito,
Suave e virginal, de pétalas de arminho…
Ela pôs sua mão no meu amargo peito
E me disse: «Não sofras, eu sou o Caminho.
Sou a deusa, meu filho, que à terra vem pura,
Suave e virginal e ornada de enfeite,
Do Inferno vos livrar. Eu sou a Formosura,
Desde o Verbo a vós vinda quais pombas ou leite.»
«Mas Rosa, o sofrimento, a marca do pecado,
Por que não os tornas tu no mel da tua seiva?»,
Disse eu, e disse a Flor com ar amargurado:
«Tens razão, filho meu, são todos minha leiva.
Existe o mal, meu filho, eu sei que existe a Dor.
Mas no seio da terra de vermes coberta,
Irromperá, gloriosa, a Rosa do Amor,
Quando a Cruz for a Luz e a porta for aberta.
«A Paz será por fim!», me disse a amada deusa,
«Tu tem Esp’rança, meu filho, teu tempo virá…»
E foi-se a meiga Flor, mas eu, como quem reza,
Recordo esta lição: a Paz enfim será!!!!!!!!!!!
Lisboa, 24/ 12/ 1990
AD MAJOREM DEI GLORIAM
PAULO JORGE BRITO E ABREU
CAVALEIRO DO TEMPLO
«Fortuna favet fatuis, ad augusta per angusta.»
( convoco, para a Musa minha, o Ás de Paus )
Cavalgava noite fria,
O ar gelava como açoite,
E a
Voz assim dizia:
«Cavaleiro, boa-noite.»
Travessei pelo Deserto
Toda a noute, e onde a Esp’rança?
E a Voz me disse perto:
«Cavaleiro, ora descansa.»
Venho exausto, o mar é longe,
Fui corrido pela aldeia…
E a Voz me disse monge:
«Senhor Padre, aqui a ceia.»
Sou Templário, minha freira,
Dá-me cota e armadura…
E a Voz era fagueira:
«Senhor Padre, é noite escura.»
E sonhei que em pleno dia
Era a nuvem colombina,
Era meigo rouxinol:
«Cavaleiro, eu sou Maria,
Sou a tua pequenina,
Dorme, dorme sob o Sol.»
Lisboa, 05/ 02/ 2007
MENS AGITAT MOLEM
PAULO JORGE BRITO E ABREU
NATAL INATO
( convoco, para a Musa minha, o 9 de Copas Arcano )
de todo o coração, ao Mago Merlin, de Tomar
I
Vou cantar, agora, o hino.
D’ Alma pura, aberta e nua.
Cantarás o meu Menino?
Cantarás loas à Lua?
É Dezembro, há mal e maus.
É Natal, e é Maria.
Mas a terra, canho e caos.
T’ levisão, pornografia.
II
Sou parteiro, e há o escopro.
Trabalhemos, insuflemos.
Se há sangue, e há o Sopro,
Suspiremos, meditemos.
Pois há muito, havia um Lírio.
Leonardo. Ou era a Luz?
Foi a Cruz, e o martírio:
Era a Ceia de Jesus.
Lisboa, 15/ 06/ 2006
AMOR OMNIA VINCIT
PAULO JORGE BRITO E ABREU
ORAÇÃO À VIRGEM MÃE, SENHORA DA SAUDADE
( convoco, para a Musa minha, o Ás de Copas Arcano )
I
Senhora, se no Sol duma cantiga
Pra mim há doce Luz, que ando a penar,
Dai-me novas do mel, da minha Amiga,
À corda, guia, dá o lumiar.
Que já, no augusto sólio, Amor me siga,
Que os róseos Cupidinhos sejam lar,
Amor da doce Fátima, quadriga
Da via de Água, Terra, Fogo e Ar.
E pede ao Teu Menino, minha barca,
Que o Céu nunca se aparte, ó flor, de nós!!!
Que as lindas margaridas sejam marca,
Se inflamem Nise e Vénus pela foz,
Que fia a minha loura o véu da Parca,
Senhora, que é tão rouca a minha voz.
AVE MARIA, GRATIA PLENA
PAULO JORGE BRITO E ABREU
II
( convoco, para a Musa minha, o 6 de Paus como Arcano )
Minh’ Alma só por Ti, por Tua boca
Fiando nesta noite, à luz da Lua,
Uma branca e meiguíssima falua
Que dos Teus lábios sai já feita em roca.
Minh’ Alma só por Ti, e não é pouca,
E nos Teus lábios, Mãe, me apazigua.
Por Vos cantar minh’ Alma, casta e nua,
À espada lança a voz, dolente e rouca.
Que em Musa lilial e na garganta,
Em Graça colorida manda Amor.
Se Amor agora acalma, e acalanta,
Na Rosa, sem agrura e amargor,
Tu és, no divo assento, o centro e Santa,
Mãe Tu és, és a Esposa do Senhor.
COOPERATORES VERITATIS
PAULO JORGE BRITO E ABREU
III
( convoco, para a minha Musa, o 2 de Copas )
Linda Rosa imortal dessas ternuras,
Ó Tu que estás no Céu, ouve os clamores
E os brados e os gritos e as dores
Do Teu amado filho. E vê se o curas.
Vê se o curas do mal. Com sedas puras
O leva às regiões mais int’riores;
Ameiga-o, deusa, ameiga-o com favores,
Por que a penar não torne em plagas duras.
Nos braços do Teu filho, hierofanta,
Põe a alma deste réprobo, que outrora
No Tártaro infernal e na garganta
Sentiu um peso atroz, qu’ inda o devora,
Pois Tu és flor, és deusa e és a Santa,
Tu és a Rosa-Bela a quem ele ora.
AMOR MAGISTER EST OPTIMUS
PAULO JORGE BRITO E ABREU
FLOR DO CÉU
( convoco, para a Musa minha, o Arcano e Arcaico da
Imperatriz )
Em terras de cristal, em formosuras,
Num jardim que de flores se enfeitava,
Maria, a deusa virgem, desenhava
Na mente nossa o Graal, e as ternuras.
Nessas terras d’ alor, nessas canduras,
Cupido por ali se recreava;
Maria, a virginal, lhe perguntava
Rodeada de Amor, de Maias puras:
«Camélias, rosas, lírios me rodeiam
No jardim que das Graças se reclama.
Qual das flores, no Céu, é mais formosa?»
Lhe responde o menino que incendeiam
A ele as flores todas, numa flama,
Mas a melhor do mundo ali é Rosa.
Lisboa, 07/ 09/ 1996
MISERANDO ATQUE ELIGENDO
PAULO JORGE BRITO E ABREU
PRIMAVERA PASCAL
( in memoriam de Annie Besant )
( convoco, para a Musa minha, o 6 de Ouros Arcano )
Só da Luz, quero a Luz e muita Luz.
Que ela é Pão, que ela é prémio prò dolente,
Ela é Nova, ela é noiva, eu digo sus!!!
Coragem para o pobre e o doente.
Só da Luz. Só d’ Amor, em farta Vinha,
O Sol agora vem, e é bem-vindo…
Ai cânticos e frol duma andorinha!!!
O dia é Primavera, eu digo lindo!!!
Só da Luz, minha leda, e só do Vate.
Vem d’ amora, de poma, e vem de véu,
Vem comigo, a lidar o bom combate:
Eu n’ asa dos teus olhos, vejo o Céu.
AD AUGUSTA PER ANGUSTA
PAULO JORGE BRITO E ABREU
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