Este livro de Alice Ruivo (Editora Padrões Culturais) organiza-se numa escrita ágil a partir de um trajecto de pontos comuns de três mulheres cujo estado civil é diferente: Matilde, advogada, é casada com Rui Salgueiro, advogado, que se envolve com Juliana, arquitecta, solteira, ex-namorada de Fabião. A ausência de Rui Salgueiro em Bilbau num encontro internacional de advogados precipita a aproximação de Matilde com Fabião e de Carlota, médica, divorciada de Pedro (alcoólico e grande amigo de Rui) com Emílio Fonseca.
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Ao descobrir a ligação entre o marido (Rui) e a amiga (Juliana) Matilde acaba por exigir o divórcio a Rui. Mas antes de descobrir essa aventura tinha dito a sorrir ao marido: «Juliana é lindíssima e inteligente. Suponho que é o facto de ir casando aos poucos que a torna tão interessante e alegre. Uma vez casadas perdemos a graça e o brilho, vamos ficando velhas e ignorantes.» Mais tarde, já em plena crise conjugal, dirá sobre Rui a Carlota o seguinte: «Ele tem uma capacidade invulgar para se desviar, evitar assuntos que podem perturbá-lo, ainda que isso represente para mim uma carga adicional. Como se costuma dizer sacode a água do capote com enorme facilidade.» Por sua vez Carlota fala de Pedro nestes termos: «Tem graves crises. Consigo hospitalizá-lo nessas alturas. Depois promete que deixa de beber mas é mentira. Volta sempre. É um doente. Tenho pena dele. Nunca lhe nego assistência, como de resto é minha obrigação como médica, sempre o ajudo com dinheiro mas tudo em nome dos filhos.» Juliana traça este retrato de Rui logo no início: «Imagino a quantidade de vezes que já lamentou ter, sobre a secretária em jeito de troféu, aquela fotografia em que uma jovem mãe se derrete em sorrisos abraçada a duas crianças ainda pequenas. Aposto que na aliança tem gravado a data do casamento e a mensagem amor para sempre. É típico...»
Por sua vez Rui Salgueiro pensa no azar e na curiosidade de ambas (mulher e amante) se terem encontrado: «A empresa de Matilde emprega cerca de duzentas pessoas e logo Juliana é que tinha que ir ao jantar. De que teriam falado?» Entretanto Fabião posiciona-se como homem-chave neste processo complicado: «Matilde sentia-se atraída pelo homem que Juliana amava. Ironia do destino ou castigo, não sabia. Juliana dormiu com o homem de Matilde e Matilde sentia-se atraída pelo homem de Juliana.» Dentro desta intrincada teia de coincidências, a escrita ágil de Alice Ruivo leva-nos ao lado de dentro do «puzzle» com o registo dos pensamentos dos vários protagonistas desta história cruzada entre Matilde, Carlota e Juliana - mas não só. Há uma espécie de registo teatral, uma marcação de palco feita neste caso não pelo encenador mas pela autora do texto: sucedem-se os lances inesperados levando o leitor a pensar numa aventura policial. Que num certo sentido não deixa de ser: mesmo que não seja castigada por uma sentença de tribunal, a traição dentro do casamento não deixa de ser um delito, uma acção dolosa e às vezes dolorosa. É pelo prazer de contar uma história de mulheres pela voz narrativa de uma mulher que este livro também se recomenda. Porque o mundo feminino é diferente quando se trata do exercício da ficção: há nesta abordagem do conflito amoroso uma temperatura, um ritmo e uma emoção que só a respiração da escrita feminina pode projectar no leitor.
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