O nosso Bairro
cercado
(a
Fernando Grade)
Hoje a nossa malta já não vai aos jogos
De hóquei em patins no ringue do Lisgás
Nem a Campo de Ourique pelo Passos.
Só a nossa marcha é que não desiste
E continua a ensaiar as suas marcações
Dois meses antes do desfile da Avenida.
Sabias? A nossa marcha ganhou o prémio
E foi o melhor poema dos bairros de Lisboa
Em mil novecentos e noventa e quatro.
Fanan! Hoje o nosso Bairro está cercado
Nas velhas mercearias vendem cerveja
Em garrafas de litro que eles partem.
Depois vão urinar nas portas dos carros
Atiram os caixotes do lixo ao chão
E os pneus acabam furados de manhã.
Sabias? Mataram um rapaz mulato
Aqui no cotovelo da Rua da Atalaia
Mas não era gente do nosso
Bairro.
Hoje em dia há cada vez mais assaltos
A Polícia regista logo esta
ocorrência
No dia seguinte chegam os da científica.
Mas as impressões digitais dos ladrões
De nada servem e de nada os acusam
Porque os do telhado passaram a palavra.
Os ladrões levaram ouro, prata e casquinha
O computador e as máquinas fotográficas
Além dos relógios que eram para os netos.
Hoje, meu caro Fanan,
digo-te:
Não voltes!
Tudo mudou para pior, a rua cheira a urina
E o trânsito no Bairro é também um inferno.
Morreu Dinis Machado e com ele os livros
Que se alugavam na Barateira à semana
Para falar nos cafés do Bairro hoje cercado.
Não voltes! Mas se voltares, meu caro Fanan
Vamos os dois de novo ao ringue do Lisgás
Saber quem nos escondeu as bandeiras.
|