AS LÁGRIMAS DO OLVIDO SÃO UM SOL DE ÉTER
A MORTE VISITAR-NOS-Á SEMPRE...
PELA UNIVERSAL MÁGOA DA DOENÇA DE DEUS
UM ABISMO NO POEMA




FERNANDO BOTTO SEMEDO

AS LÁGRIMAS DO OLVIDO SÃO UM SOL DE ÉTER

Na cidade do vazio as lágrimas
Da dor infinita são de éter e de lata
Com um fundo de rostos que passam em cinza
Sob um sol que vai gelando na alma de Deus
Na alma da sua loucura branca.

Na cidade do vazio as lágrimas do olvido
São um sol de éter e cera ardendo sob um universo
De silêncio e luto e saudade infinita
Onde os rostos de todas as crianças são projectados
Em acordes estrangeiros
Numa praça infinita sonhada e deserta.

O meu Amor é uma flor roxa numa Primavera preservada
No interior de um Natal de orvalho negro.

16/05/2002

A MORTE VISITAR-NOS-Á SEMPRE...
A Morte visitar-nos-á sempre
Naquele momento em que sob um céu
Da mais profunda treva
Nem apenas uma pequena vela brilhará
Para transpormos o rio sem nome, o rio eterno
Em que passaremos para o eterno Nada.

Quando virá a nosssa Morte,
Quando nos visitará fazendo desaparecer o Amor,
A Alegria, a Liberdade, o Sol infinito
Dos dias de Primavera, quando todas a espécies
São abençoadas para a continuação da vida,
Palpitando como uma veia gigante no coração da Terra?

A Morte visitar-nos-á sempre
Naquele momento da mais profunda treva
Em que a inconsciência mais pesada será
O único acorde gelado que deixaremos no Olvido eterno.

19/05/2002

PELA UNIVERSAL MÁGOA DA DOENÇA DE DEUS
As crianças que passam,
São as crianças que sempre passaram,
São as crianças de alvíssimas almas,
Que um abismo crudelíssimo ceifou
Para o eterno olvido do Nada, e as lágrimas
Que vejo através do tempo são as lágrimas
Feridas infinitamente
Pela universal mágoa da doença de Deus,
Que tudo atingiu, que tudo atirou para trevas eternas,
Cheias de rostos deformados e circos abandonados,
Num Carnaval-Natal que se instituiu para sempre
Como iniciais de nomes para sempre proibidos
De se pronunciarem, de nomes condenados à exclusão eterna,
De nomes escritos em vitrais de cinza e dor
Que se estilhaçaram contra litorais de vazio e de morte.

Hoje não nasceu o dia abortado pela febre infinita de
Todos os seres. Hoje a noite foi abolida
Pela demência de todos os astros. Hoje o espaço
Transfigurou-se em pleno gelo da Alma morta
Da Transcendência.

02/07/2002

UM ABISMO NO POEMA
Os olhos de Deus são uma enxurrada
De sangue e lava, num olhar para
O vazio e para o nada.

Em derredor de si um Sol negro
Volteia com os destroços do Branco
Perdido na demência do Espírito
Que é um abismo no poema.

Uma luz erguida no éter
Das lágrimas da alma do Eterno
Vela pelo silêncio do Sangue
Que tudo abarca.

13/06/2002