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AMOSSE MUCAVELE
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Amosse
Mucavele
nasceu em Maputo, onde vive, no ano de 1987, sonha em ser poeta,
ensaísta e é director da Revista Literatas - Revista de literatura
moçambicana e lusófona.
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Ensaio Sobre a
Mentira e a Inveja ou a (Re)construção da “Sociologia da Transitoriedade
e Permanência” em Filimone Meigos
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Ser
cidadão significa sobretudo essa capacidade e acção de lutar à favor da
racionalização da dominação, limintando-a.
(Filimone Meigos, Ensaio Sobre a Mentira E A Inveja & Outras Coisas)
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Introdução
Filimone Meigos poeta, sociólogo e outras coisas moçambicanas, um
iconoclasta radical e definitivo ou, por outra,
um “chingondo de todas as raças”, nascido em 1960, é autor de
quatro obras: Poema & Kalachi In
Love (1994), Globatinol –
Antídoto – ou Garimpeiro do Tempo ( 2002),
Moçambique, Meu Corpus Quantum
(2009).
A
poética de Filimone Meigos não ilude “ o profano e a paródia”, como
acontece a muitos poetas “neo-barrocos” lida com a sintaxe abrupta,
deslocamento, e uma forma não sistemática que pode ser encontrada,
mutatis mutandis, na poesia de Olson e Zukofsky,
José Lezama Lima,
Gabriela Mistral, Eduardo Carranza, Salvador Novo, Octavio Paz, Nicanor
Parra, Ernesto Cardenal, Heberto Padilla, Eliseo Diego e Gonzalo Rojas
(grifo meu). O espaço do poeta neobarroco é rachado em lascas. Ele tem,
é claro, sua própria lógica, uma lógica que inclui, e às vezes prefere,
o ilógico, da mesma forma que um ateu inclui Deus nos seus pensamentos.”
( José Kozer:
O Neobarroco: Um Convergente Na
Poesia Latino-Americana).
A
poeta e crítica literária Ana Mafalda Leite no seu ensaio
Filimone Meigos, A Poesia como
Prática Profanatória e como Arte da Paródia, bem destacou a presença
dessa preocupação clássica, de formação de carácter estético, desde o
gaguejar da língua/ linguagem poética, ao deslocamento extremo,
esticando a linguagem ao máximo, todos os tipos de linguagem,
participando alegremente nas liberdades do barroco: sua escrita não é
engrenada para a luxúria mas, na melhor das hipóteses, para a luxúria
como adoração; cada um e todos eles, mais do que Poeta, é uma
configuração de muitas vozes, polifónica, coral.
Afirma ela, ʻʻNa poesia de Filimone a modernidade é uma espécie de
zapping entre vários tempos e culturas que se cruzam, enquadrando-se nas
suas diferencialidades e questionando identidades.
[…]
Ora o discurso de Filimone Meigos é provocatoriamente profanatório ao
deslocar para um novo uso, sentidos consagrados de diferentes
linguagens. A criação de um novo uso, através do seu deslocamento e
desadequação é pois unicamente possível para o artista ao desactivar um
velho uso, tornando-o inoperacional. O poeta ao jogar com as diferentes
linguagens, retirando-lhes a sua função instrumental - académica,
filosófica, antropológica, política, poética- e retirando-as dos seus
contextos próprios, deixando-as emancipadas dos seus objectivos
comunicativos imediatos, vai permitir a essas linguagens uma nova
arrumação, que as disponibiliza para o questionamento e para a crítica,
permitidas através da profanação dos seus lugares, consagrados
disciplinarmente: [..]” (Revista Ecos vol.17, Ano XI, n° 02-2014).
Em
Ensaio Sobre a Mentira E A Inveja
& Outras Coisas, traz-nos um “documento sociológico explosivo”, com
questões ontológicas “em permanente desafio aos poderes instiuídos” (F.
Noa), no essencial a cogitação sistemática sobre a inveja e a mentira e
os ensaios sobre outras coisas, já abriga, além da atracção ideológica
que se insinua, traduz uma experiência sociológica, pedagógica,
filosófica e poética. Significa reformular um tempo repleto de
confissões mesmo nutridas de ironia ( sendo esta “uma tentativa de
discurso do caso moçambicano”, tal como nos assegura o autor no ensaio
que dá estampa ao livro), significa (re)construir o sociólogo enquanto
ser histórico, responsável também por aprofundar os significados
quotidianos (seja de forma existencial ou literal) aqui reunidos, longe
um do outro em termos cronológicos (2003-2015), oscilam no compasso da
transitoriedade e da permanência.
“O
discurso de Filimone é um questionamento onírico da contemporaneidade e
da ancestralidade, uma meditação dramatizada, crítica, e encenada, do
des(conhecimento) dos diferentes poderes, locais, sociais, políticos,
imperiais, globais.” ( Ana Mafalda Leite)
É
verdade que Meigos no seu discurso, que se pretende transparente, “ (…)
ilustra, nos seus diversos textos, como dar conta do stinker (emoção) a
partir de uma perspectiva do thinker (da razão)”, escreve Carlos Bavo no
prefácio.
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A
Questão da Inveja e da Mentira no interior de Meigos
O
rancor é cruel e a fúria é destruidora, mas quem consegue suportar a
inveja?
Provérbios 27:4
Parece inegável que a questão da inveja tem, vários vasos comunicantes,
a começar pela sua dimensão hospedeira da informação…
Kierkegaard, em seu livro O
Desespero Humano, define a inveja como “uma admiração que se
dissimula. O admirador que sente a impossibilidade de ser feliz, cedendo
à sua admiração, toma o partido de invejar. Usa então de uma linguagem
diferente, segundo a qual o que no fundo admira, deixa de ter
importância, não é mais do que patetice insípida, extravagância. A
admiração é um abandono de nós próprios penetrados de felicidade, a
inveja é uma reivindicação infeliz do eu”.
É na história primitiva que podemos encontrar no velho Testamento da
Bíblia Sagrada e mais directamente no relato de Caim e Abel, em Gênesis
4. No texto, Caim é o primeiro homem nascido. É recebido por Eva como
dom de Deus. É à Sua benevolência que a primeira mulher deve a
maternidade. É a primeira experiência de maternidade no mundo, o que vem
modificar a condição feminina tornando-a, mais do que serva e
companheira de um marido, capaz de ser mãe dos seres humanos:
E conheceu Adão a Eva, sua mulher, e ela concebeu e deu à luz a Caim, e
disse: Alcancei do SENHOR.
E deu à luz mais a seu irmão Abel; e
Abel foi pastor de ovelhas, e Caim foi lavrador da terra.
E aconteceu ao cabo de dias que Caim
trouxe do fruto da terra uma oferta ao Senhor.
E Abel também trouxe dos primogênitos
das suas ovelhas, e da sua gordura; e atentou o Senhor para Abel e para
a sua oferta. Mas para Caim e
para a sua oferta não atentou. E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe
o semblante. E o Senhor disse
a Caim: Por que te iraste? E por que descaiu o teu semblante?
Se bem fizeres, não é certo que serás aceito? E se não fizeres bem, o
pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo, mas sobre ele deves
dominar.
E falou Caim com o seu irmão Abel; e
sucedeu que, estando eles no campo, se levantou Caim contra o seu irmão
Abel, e o matou.
(Gênesis
4:1-8)
Por sua vez o escritor português José Saramago, no seu romance
intitulado "Caim", faz-nos lembrar do mito bíblico mais famoso, presente
no livro do Géneses: o assassinato de Abel. Caim é tido como um invejoso
inveterado, e por conta deste sentimento
Apesar de assassino, caim é um homem intrinsecamente honesto, os
dissolutos dias vividos em contubérnio com lilith, ainda que censuráveis
do ponto de vista dos preconceitos burgueses, não foram bastantes para
perverter o seu inato sentido moral da existência, haja vista o corajoso
enfrentamento que tem mantido com deus, embora, forçoso é dizê-lo, o
senhor nem de tal se tenha apercebido até hoje, salvo se se recorda a
discussão que ambos travaram diante do cadáver ainda quente de abel.
(SARAMAGO, 2009, p. 119).
Neste contexto de leitura, diria que, no caso da inveja e da mentira
aqui denunciadas, Meigos constitui a sua posição sobre a Inveja e a
Mentira, defendendo-a com referências explícitas socorrendo-se aos
“mecanismos daquilo a que os sociólogos chamam de preconceito e de
teoria da rotulação” (Filimone Meigos) e aquilo que Max Weber chamou de
“A consideração científica constitutiva de tipos indaga e expõe, muito
de relance, todas as conexões significativas irracionais, afectivamente
condicionadas, do comportamento que influenciam o agir enquanto
“desvios” de um seu decurso construído como puramente racional e
teleológico.”
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Filimone Meigos Ensaio Sobre a Mentira E A Inveja & Outras Coisas
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REFERÊNCIAS
NOA, Francisco. Escrita Infinita, Maputo, Imprensa Universitária
1998.
LEITE, Ana Mafalda, Filimone Meigos, A Poesia como Prática
Profanatória e como Arte da Paródia, Revista Ecos Vol.17, Ano Xi, N°
02-2014,
http://periodicos.unemat.br/index.php/ecos/article/viewFile/238/231.
KIERKEGAARD, Soren. O Desespero Humano, São Paulo,
Editora Unesp, 2010.
KOZER, José. O Neobarroco: Um Convergente na Poesia Latino-Americana
,
http://www.revistazunai.com/ensaios/jose_kozer_neobarroco.htm,
Tradução: Virna Teixeira, Abril de 2004.
SARAMAGO, José. Caim, Caminho, 2009.
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