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A. MEIRELES GRAÇA
Dieta III

Doutor: já estou cansado
Da dieta que me fez:
Peixe cozido ou grelhado
E de bife um só por mês!

(Melhor seria eu curado
Com dieta mais pequena
E me houvesse receitado
Só comer loira ou morena...)

Agora da prescrição
Até me cai o cabelo
Pois só me deixa opção
Entre a cenoura e o grelo!

E eu sempre habituado
A ter outra comidinha...

Aqui lhe dou por lembrado
O que foi quinto João
Um Rei muito recordado
Por variar na paixão...

Um dia o seu confessor
Mui severo criticou
Que variasse no amor
Que à Rainha jurou...

Então o real senhor
Para o frade castigar
Seu cozinheiro chamou
E foi lesto a ordenar:

“Doravante as refeições
Do Frei serão de galinha:
Não quero variações
Do frade na comidinha!”

Assim fez o cozinheiro
Cumprindo as ordens do Rei
E despejou o poleiro
Na barriguinha do Frei!

Mas à terceira semana
De andar a canjas tratado
Da dieta desumana
O Frei se deu por achado!

Fez chamado o cozinheiro
E em fala muito baixinha
Perguntou se no fumeiro
Só lhe restava galinha...

Pediu lhe fosse mudada
De galinha a refeição
E a maldita trocada
Por um osso de suão...

“Se mudas, te digo eu
E aqui deixo garantido
Terás um lugar no céu
Se me trocares o cozido!”

Ora trocar, trocarei
Lá responde o cozinheiro —
Mas só com ordem do Rei
Que mandar manda primeiro!

E indo o Rei ao confesso
Aproveita o Frei a horinha:
“Ó meu Rei porque mereço
Comer assim, só galinha?”

E logo o Rei a dizer:
“Tu comes que mando eu
E de galinhas comer
Decerto ganhas o céu...”

“Mas meu Rei, ando enjoado...
Sempre galinha, galinha!”

“E eu por ti condenado...
Sempre Rainha, Rainha!”

Ali o Frei percebeu
Qual a real intenção:
Mui lesto lhe concedeu
Solene absolvição!

Ó meu Rei! O variar
Só nos melhora a saúde...
Pode a Rainha trocar
Que de galinha não pude!

 

A. Meireles Graça