Ninguém contempla as coisas admirado.
Dir-se-á que tudo é simples e vulgar...
E se olho a terra, a flor, o céu doirado,
Que infinda comoção me faz sonhar!
É tudo para mim extraordinário!
Uma pedra é fantástica! Alto monte,
Terra viva a sangrar, como um Calvário
E branco espetro, ao luar, a minha fonte!
É tudo luz e voz, tudo me fala:
Ouço lamúrias de almas no arvoredo
Quando a tarde tão lívida se cala
Porque adivinha a noite e lhe tem medo
Não posso abrir os olhos sem abrir
Meu coração à dor e à alegria.
Cada coisa nos sabe transmitir
Uma estranha e quimérica harmonia!
É bem certo quer tu, meu coração,
Participas de toda a Natureza.
Tens montanhas na tua solidão
E crepúsculos negros de tristeza!
As coisas que me cercam silenciosas
São almas a chorar que me procuram.
Quantas vagas palavras misteriosas
Neste ar que aspiro, trémulas, murmuram!
Vozes de encanto vêm aos meus ouvidos,
Beijam meus olhos sombras de mistério.
Sinto que perco, às vezes, os sentidos
E que vou a flutuar num rio aéreo...
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