Ofício antiquado
O poeta fala na primeira pessoa
E a todos engana. Fala na terceira e iludi ainda mais:
Afinal, sempre é devorado por suas próprias entranhas,
A ninguém lega seu respiro.
Entre eu e ele há máscaras insondáveis,
O jejum celeste imerso em branco abissal,
O plissado do verbo interdito,
O bosque dos interstícios,
A lenta expiação das palavras afins
E o que restou em estado de sôpro na arquitetura do vôo.
O poeta alimenta-se de matérias fungíveis e friáveis.
Até hoje não sabe de onde vem a névoa que manipula
Nem sente o peso da mortalha (ó John Donne)
Que veste e desveste a todo instante.
Da fissura do sonho tira lábios estigmatizados.
Leitores avisados (e desavisados),
Atentos (e desatentos) reunem-se na praça
Para rastrearem no escuro o que ficou pigmentado;
Meio a êsmo percorrem sinais intatos,
Fitando de perto os grafitos apagados.
Com cristais moídos na garganta,
O poeta tange criptosignos elementares.
Uma legião de pseudos (aedos do não-ser)
Fere-lhe a plumagem,
Mas ninguém sabe onde o pássaro nidifica.
(De Aleluia sob o átrio, libro inédito)
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