( texto que me foi ditado durante
um sonho pelo poeta Dante Alighieri )
PENSAMOS que sabemos,
mas não sabemos bem o que pensamos.
pensamos ou talvez sejamos pensados?
sonhamos ou talvez sejamos sonhados?
e o relógio do salão da
Nadja roda e desce da parede roda e desce e passeia sobre as
quatro patas. passeia por entre os móveis, passeia por toda
a casa, passeia pelos profundos corredores e pelos
quintais, passeia e passeia como um velho cão (de caça)
até que de repente se esbarra com um espelho um espelho há muito
esquecido, um espelho bretoniano, florestal, fotomótico... e
dentro do espelho há um mar. e dentro do mar um luar muito
antigo e búzios encantados.
eu sou o mar, o grande mar, diz
o mar, e eu sou a areia, a bela areia, diz a areia. e eu a
sereia, a voluptuosa sereia ulissiana, diz a sereia. e o relógio
faz uma vénia aos três com o seu chapéu de coco e puxa as golas
do casaco até às orelhas e prossegue, aristocraticamente, a sua
caminhada.
e uma condessa que também por ali costuma andar,
vira-se para o relógio e pergunta:
senhor relógio, podia
dizer-me que horas são? e o relógio, com um tom mal-humorado,
pois há 24 horas que anda de pé ( sem dormir), e aquela caminhada
é deveras pesada, responde: são as horas, as horas que são,
as horas em que as árvores se recolhem ao fundo do mar e os
senhores académicos sobem aos mastros
dos navios fantasmas para se enforcarem
e as mulheres traídas capam os maridos.
são horas, são
horas, são as horas que são e o meu amor nunca mais chega, ai
não e não. ai coitada de mim, ó relógio, que assim vivo en gran
cuidado por meu amigo, que tarda e non vejo!
ai eu coitada como vivo vivo, sem horas e sem minutos,
en gran desejo por meu amigo,
que muito me tarda.
acode-me! socorre-me! ó relógio!
e o relógio continuando
a sua caminhada, como quem é surdo e mudo, responde: saber
esperar é uma virtude venérea esperamos não sabendo que
esperamos esperamos e esperamos, esperar é nada.
esperamos? esperamos por quem? pergunta a condessa, um tanto ou
quanto irritada.
talvez por lô - lô, talvez por godot.?
diz o fantasma vermelho que também costuma por ali andar.
e ao ouvir aquilo, o relógio desata às gargalhadas e começa a
cantar: esperamos, esperamos, esperamos sem saber, esperamos
por quem?
talvez por godot? talvez p'lo senhô? talvez
p'lo diá? talvez p'lo lô-lô?
ah! pelos meus ponteiros,
vá-se lá saber.
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Luís Costa nasce a 17 de Abril de 1964 em Carregal do Sal, distrito de Viseu. É aí que passa a maior parte da sua juventude. Com a idade de 7 anos tem o seu primeiro contacto com a poesia, por meio de Antero de quental, poeta/ filósofo, pelo qual nutre um amor de irmão espiritual. A partir dai não mais parou de escrever.
Depois de passar três anos num internato católico, em Viseu, desencantado com a vida e com o sistema de ensino, resolve abandonar o liceu. No entanto nunca abandona o estudo. Aprende autodidacticamente o Alemão, aprofunda os seus conhecimentos de Francês, bem como alguns princípios da língua latina. Lê, lê sem descanso: os surrealistas, a Geração de 27, Mário de Sá-Carneiro, Beckett, E. M. Cioran, Krolow, Homero, Goethe, Hölderlin, Schiller, Cesariny, Kafke e por aí adiante. Dedica-se também, ferverosamente, ao estudo da filosofia, mas uma filosofia viva. Lê os clássicos, mas ama, sobretudo, o poeta/ filósofo Nietzsche, o qual lera pela primeira vez com a idade de 16 anos : "A Origem da Tragédia" e o existencialista Karl Jaspers.
Mais tarde abandona Portugal rumo à Alemanha, pais onde se encontra hoje radicado. |