LUÍS COSTA::::::::::::

Das palavras

Calendários. Caleiras. O chão.

O reformular da vida
que se incendeia na paixão da forma.

Esta mão. A pedra na boca.
Uma lâmpada transversal.
Estilhaços. Arestas.

Encosto-me ao relâmpago da mão
durmo o sonho das palavras
a eterna história dos signos

As palavras.

Mistrais da boca faminta
entre dentes
nos sossegados prodígios
nas barcas.

Coberto pela nudez
anterior ao corpo
sei que as palavras ardem
dentro das coisas
cicatrizes,
molas instáveis,
facadas,
cibórios de cinza,
aves que fazem ninhos
nos estames do sol

como um entardecer tempestuoso
nos lagares outonais
sei que as palavras
existem ,
quebradas ainda
sim,
quebradas ainda
mas já sentidas
maravilhosas devastacões
no pulsar de músculos tesos
ou arrepios
de bocas que se partem
contra a dureza
de seus próprios desejos

Sei da presença dos signos
da sua oscilação
de rubros metais efervescentes
dentro de bilhas
do circular da navalha
de raras faíscas no atrito da pele
que,
como fabulosos minérios,
se dão ao mundo
pelo concavo da mão

Ó obscuro terramoto,
tenebroso holofote que
de súbito
irrompes das entranhas da corça!

pois
nos meus nervos és um
frémito ingénito
a necessidade pulmonar
uma fome de constelações
de dizer
falar
cantar

como sonâmbulos cavalos
nas grutas sinfónicas
ou uma erupção nas brilhas
ao estiolar dos ossos

no Mar

RITMO COMPULSIVO

Um tremor de terra
nos ouvidos
um ritmo tarso na pele que
se eriça
o golpe de um grito
no gesto que me faz ser
entre cacos

Rostos
rostos acastanhados,
cansados,
obscurecidos de meio-dia,
desfazendo-se
à minha volta,
indo de encontro aos muros gelados
das facas no peito

O corpo esquartejado...

À beira da praia
uma armadura de vazio
um abismo lá dentro,
como um mapa de caranguejos
ou bocas
expelindo fogo,
bebendo da luz das sombras
o doce suco

Ó Saliva em brasa!
dureza vermelha...

Lagos gelados
quebrando-se sob o peso
da obsessão
do explorador nocturno
na ânsia da bússola acesa,
à altura do seu desvario

- no eritema da máscara

L.C. Züschen MMIX
 
 
 
 
 
 

Luís Costa nasce a 17 de Abril de 1964 em Carregal do Sal, distrito de Viseu. É aí que passa a maior parte da sua juventude. Com a idade de 7 anos tem o seu primeiro contacto com a poesia, por meio de  Antero de quental, poeta/ filósofo, pelo qual nutre um amor de irmão espiritual. A partir dai não mais parou de escrever.

Depois de passar três anos  num internato católico, em Viseu, desencantado com a vida e com o sistema de ensino, resolve abandonar o liceu. No entanto nunca abandona o estudo.  Aprende autodidacticamente o Alemão, aprofunda os seus conhecimentos de Francês, bem como alguns princípios da língua latina. Lê, lê sem descanso: os surrealistas, a Geração de 27, Mário de Sá-Carneiro, Beckett, E. M. Cioran, Krolow, Homero, Goethe, Hölderlin, Schiller, Cesariny, Kafke e por aí adiante. Dedica-se também, ferverosamente, ao estudo da filosofia, mas uma filosofia viva. Lê os clássicos, mas ama, sobretudo, o poeta/ filósofo Nietzsche, o qual lera pela primeira vez com a idade de 16 anos : "A Origem da Tragédia" e o existencialista Karl Jaspers.

Mais tarde abandona Portugal rumo à Alemanha, pais onde se encontra hoje radicado.

http://oarcoealira.blogspot.com/