A Outra, a tarada,
aquela que vive em mim,
que ninguém viu, nem conhece,
e que enloirece
à hora linda do poente
pálida e desgrenhada –
Vem contar-me, muitas vezes,
na sua voz envolvente,
incoerente
e desgarrada —
A estridência da cor,
a ânsia do momento...
A rubra dor
do sensualismo,
no ardor de cada paroxismo.
Não há angústia maior
que essa tragédia interior: —
A intransigência
dos seus nervos,
irreverentes servos
da sua inconsciência!
E é sempre a mesma dor angustiada
em cada sensação realizada...
Todo o seu canto morre num clamor!…—
Nada é verdade.
Só existe a Dor!
Nada mais subsiste,
— Mesmo o prazer
e a sensualidade
só na Dor existe!
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Judite Teixeira representa um caso singular na história literária em Portugal não só pelo escândalo suscitado aquando a condenação e apreensão da sua coletânea poética de 1923, "Decadência", mas também pelo injusto esquecimento da sua contribuição literária, especialmente no discurso modernista das letras portuguesas. No entanto, como observou um dos poucos críticos que soube avaliar objetivamente a sua escrita - o poeta António Manuel Couto Viana - Judite Teixeira poderia ser considerada, dentre as escritoras portuguesas, a "única poetisa modernista". Para além de revisitar este momento crítico da escrita feminina - de particular relevância histórica nos estudos sobre a mulher em Portugal este ensaio tentará reavaliar a sua contribuição literária, não só no contexto da sociedade portuguesa, mas também no contexto mais amplo do despertar do mundo moderno.
René P. Garay |