1.
Era fácil, naqueles anos, escrever na pedra
Gotas enormes caindo sobre os ombros dos deuses
Eles pegavam em pequenos papéis, às vezes
sem saberem como ficavam parados nas ruas.
Ao entardecer sabiam notícias de si mesmos
À sua volta tudo era colorido: a terra, as árvores
o paredão junto à piscina, os céus
Carolina punha talvez a sua camisola escura.
Zeus olhava para baixo, bebia um pouco de Campari
Ouvia-se agora o mundo com o seu imenso movimento.
Homens voltavam do Rift, encontravam ali esqueletos
uma nova alegria volteava nos ares Maria Laura praguejava
Tudo tinha provavelmente um ligeiro ar de família
Foi assim que me apaixonei pela Antiguidade Clássica.
Foi talvez assim que busquei uma nova sobriedade.
Rapazes de bigode sugestionados pelo lamento do violino
A viagem magnífica O impermeável era encantador
2. Aos dez para o meio-dia sente-se um pouco
de piedade
Vamos pensamos nós não cometam o mesmo erro das
gerações vindouras
Ao longo da rua do viaduto toma-me a vontade de fumar
Foda-se caralho foda-se A beleza rodeia-me.
Júpiter meu senhor de quatro toneladas
- uma certa música um certo sabor a barro uma andorinha
Cientistas garantindo que o Homem ali é que nasceu primeiro
e a andorinha chega ora toma do outro verso e larga
sobre a minha cabeça vozes que ondeiam gravemente.
Não sou capaz de garantir que o meu destino é fagueiro
Andrómaco ou Perseu que é como quem diz O porteiro
chama-me deixei cair qualquer coisa Velhas chaves
Foda-se caralho foda-se E fala-me em francês
Parecidos um com o outro diz o meu antigo ajudante
manobrando uma pipeta Os porteiros exageram
Os deuses porventura menos delicados balbuciam
Foda-se caralho foda-se Vão-nos deixando em outras eras.
Angelina com a sua saia plissada
tem palavras adequadas para saudar o dia
A rapariga de grandes olhos pintados é Perséfone
Foda-se caralho foda-se Subo aos céus Desfiguro-me. |