Eu só escrevo coisas que me acontecem.
Falo dos candeeiros que acendi, das rotações
da Terra. Assim, por exemplo: ergo a mão
aponto na direcção daquela estrela, engano-me
será estrela, planeta, evasão na retina
mancha nocturna num sistema provavelmente oculto?
A lembrança dum passeio junto a uma ribeira
Engano-me, era um pássaro voando, voando no céu obscuro
engano-me, era outra recordação, filme olhado de relance
conversa num lugar profanado, impenetrável miragem
Engano-me, era um momento possivelmente perdido
Eu só falo de coisas que jamais sei pertencerem-me
Engano-me, o nosso olhar não está aqui
a verdade conhece-se descobriu-se em si mesma muitas vezes
engano-me agora só existe o dom da obscuridade
Mas engano-me tudo é claro, nada é claro, somente
um nome, como a cinza, cresce e ilumina a manhã. |