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BETTINA BELITZ :
Ninhos como fonte de energia e força
 
A artista portuguesa Helena Justino na Galeria Riedel, Frankenthal – o segredo está no jogo de cores claro e nas formas rígidas

Isto é um encarnado profundo, quase orgânico? Ou serão as formas geométricas que se atravessam pelo quadro como padrão enigmático? Serão os contrastes gritantes entre a pureza do branco e a rigidez do preto profundo? Os quadros de Helena Justino parecem que escondem um segredo, um enigma.

Quem quiser descobrir o segredo, terá de se confrontar com as contradições dos trabalhos da artista. Por um lado, os seus quadros seduzem pela sua superficialidade estruturada e pelas cores que apetece sentir com as mãos; por outro lado, bloqueiam pela frieza das linhas pretas, ordenadoras, e pelo título da série – “Sei um ninho”, que foi como Helena Justino baptizou este período criativo. Sem que no entanto percam a sua força e energia, os quadros irradiam uma certa fragilidade que vem dos ninhos apresentados no papel trabalhado de modo diferente e todo tomado pela cor – e que é bem apreendido, mesmo pelos que não falam português. Não se deve destruir aquilo que tem de ser protegido.

É um jogo entre a força e a fragilidade, a claridade e a escuridão, a macieza e a aspereza, a luz e a sombra. Tudo isto faz com que os quadros desta portuguesa, que produz obras abstractas e modernas, se tornem acessíveis. Apesar de Helena Justino utilizar formas claras – triângulos, quadrados, rectângulos – os ninhos são quadros para mergulhar, não são arte “fast-food”. O olho encontra de imediato linhas conhecidas, mas estas só lhe dão a parte superficial do quadro. Elas saltam ao encontro do observador. Mas, no entanto, cada quadro tem vários níveis que, numa plasticidade impressionante, parecem entrosar-se, e cujo ponto comum é o ninho ao centro. Tentar encontrar o contexto entre estes níveis e os seus significados fica entregue à imaginação do observador. “Eu pinto por impulso, não planeio, o que vier, vem”, diz a frágil artista sobre a sua série “Ninhos”. Não quer sugerir nem impor nenhuma interpretação. E, no entanto, os ninhos têm a sua própria história, muito especial: Helena Justino pintou-os todos de seguida após ter sofrido uma trombose grave. Os quadros foram a sua terapia, o seu regresso à vida – ninhos como fonte de energia e de força, que se espelha nas cores. E percebe-se de imediato que todos aqueles quadros de “ninho”, feitos com linhas e traves, indicam caminhos para o mundo, para fora, enquadrados num fundo sempre suave e frágil que suaviza a rigidez das formas geométricas e da cor preta – serão estes caminhos a possibilidade, mas também os perigos, que a vida traz?

Os visitantes presentes na inauguração da exposição não se conseguiam libertar dos quadros, ficavam parados em frente deles durante muito tempo, como olhos muitos abertos, espantados. Mesmo a proprietária da galeria Christa-Luise Riedel, que conheceu a artista em Portugal, volta aos quadros sempre que pode. “Estes trabalhos englobam muita coisa”, diz. E muitos destes quadros terão continuado presentes, nela e nos visitantes, à noite, durante os seus sonhos.

 

In : “Die Rheinpfalz”, 21 Maio 2005

Tradução: Margarida Pereira Muller