DANIEL MAZZA
Daniel Mazza (Fortaleza, Brasil, 1975). Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Ceará, Mestre e Doutor em Ciências Médicas pela Universidade de São Paulo (USP). Premiado com o Prêmio de Poesia Gerardo Melo Mourão pelo livro “A Cruz e a Forca” (Fortaleza, Book, 2007). É também autor de outros três livros de poesia: “Fim de Tarde” (Ribeirão Preto, FUNPEC, 2004), “A sinfonia do tempo: primeiro livro de filosofia” (São Paulo, Escrituras, 2014) e Sacrificium (Salvador, Mondrongo, 2020).
O NASCIMENTO DE DEUS (A DESOLAÇÃO DE ZEUS)
– Hera, rainha e esposa, Apolo e Artemis,
Meus filhos, não lhes posso dar respostas
Sobre esse galileu: não teme o César,
Seria filho de um Deus que não se mostra?
Não tem nas mãos a lança inquebrantável
De Atena, nem no peito, acoplada,
Do irascível Ares a armadura,
Nem a força inumana de Aquiles.
Mas… É como se a túnica que o veste
Fosse, então, impossível de esgarçar?
Haveria alguma luz de bronze sólida
Das mãos enclavinhadas a brotar?
Tem consigo guerreiros ocultados
Quando sozinho fala em nomes três?
É, pois, como o cavalo de madeira
Dos gregos, mas de carne e osso feito?
É possível que a águia dos romanos
De garras afiadas e aduncas,
De bico que destripa as suas presas
Pereça sob as asas de uma pomba?
Pois não vejo em seus olhos covardia,
Temor qualquer que seja, nem a homens,
Nem aos deuses do Olimpo, nem a Zeus.
Suponho que não tema o próprio Crono!
Sendo de carne fraca modelado,
De sangue que tão fácil se derrama,
De ossos que tão frágeis se esfarinham,
Eu contemplo em seu corpo um fogo etéreo
E abrasador que nasce sobre as águas
Do Jordão. É um fogo imperecível
Nutrindo-se de água! Um fogo eterno
Que não sucumbirá perante nada!
Não é a mansuetude das ovelhas,
Ou de presa acossada o que se vê
Em seus olhos profundos, olhos mansos,
Em seus olhos de homem, simples homem.
Mas o leão também se mostra manso
Deitado em sua relva, e sob a sombra
Das árvores de seus vastos domínios,
Porque não teme nada, e tudo vê.
Pressinto um panteão só de ruínas,
De deuses esquecidos e mofados,
Pela carne que agora é retalhada
Sob ordens sanguinárias de Pilatos.
Pressinto um império afogado
Pelo sangue que agora é derramado
Do alto dessa Cruz que será símbolo.
O símbolo do Deus que, morto, nasce.
Poema do livro Sacrificium (2021):
https://www.editoramondrongo.