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NUNO GONÇALVES RODRIGUES
Durante a Idade Média qual teria sido a importância das ciências – e que nos nossos dias chamamos de “transmissão literária” – oriundas dos tempos da Grécia antiga e do Império Romano ?
Esta “transmissão literária” não chegou, por exemplo, ao século X intacta, pelo contrário, muita da sabedoria em técnicas e até de civilização perdeu-se para sempre e com ela o saber que remontava ao tempo de Santo Agostinho (354-430).
O que foi conquistado no fim da Idade Média e que, iria constituir um marco na história moderna, não foi mais do que o reencontro a nível de sabedoria e conhecimento, daquilo que Atenas e Alexandria sabiam no seu auge.
É graças aos Árabes que algum desse conhecimento antigo perdurou e o que irá ser conhecido como Renascimento não é mais do que o ponto alto desse mesmo processo de recuperação de conhecimento.
A Humanidade que esteve mergulhada na Idade das Trevas estava agora a ser recuperada a nível científico e de conhecimento. Durante a Idade Média há marcos ou se quisermos datas importantes como aquelas a que os historiadores designaram de primordial importância como foram a data em que se (re)descobriu uma ou mais obras do grego Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) na Europa Ocidental ou quando um determinado tratado cientifico viu a luz do dia através da tradução de um documento árabe ou com sorte, através do original em grego.
A Igreja Católica nunca se opôs a esta redescoberta do conhecimento, mesmo que este tivesse origem nos infiéis árabes, nos bizantinos cismáticos ou em pagãos gregos.
Isto apesar de que a intelligentsia na Idade Média ser clerical e a liderança intelectual ser do tipo religioso.
Neste período não existia o termo “naturalista”, dado que aquilo a que chamamos de ciência, ou mais corretamente de filosofia da natureza, consistia em compilar, quase em exclusivo, comentários de livros antigos. A filosofia era considerada no renascimento a rainha das ciências.
O Homem medieval é favorecido pela explanação do universo físico e do funcionamento da natureza, tendo começado a desenvolver as suas próprias pesquisas, com a dificuldade, que por vezes existia, de o assunto em questão ser um dos que tivessem perdido o elo de ligação com o saber antigo.
Destaca-se Paris no século XVI mas que não deixa grandes descobertas devido à utilização de uma matemática insuficiente.
No final do século XVI houve quem através das suas experiências ultrapassasse as fronteiras do pensamento vigente como é o caso dos teóricos do impetus que tinham no sistema aristotélico o seu porto de abrigo, pois quando algo de novo surgia, não tinham a capacidade de o explicar senão baseando-se no sistema antigo o que viria a dar azo a que no início do século XVII o inglês Sir Francis Bacon (1561-1626) criticasse este divórcio entre a observação e a explicação.
O que tinham disponível no Renascimento era a matemática da antiga Alexandria e as obras do grego Arquímedes (287 a.C.-212 a.C.) que viriam a ser um factor na formação da ciência moderna. Estávamos perante uma revolução científica. Mesmo para quem não era a favor da teoria aristotélica, ficava vincada a ideia de que esse sistema nunca poderia ter sido descoberto sem observações e experiências.
Num dos Diálogos de Galileu, surge Simplício (c.480 – c. 560), como porta-voz dos aristotélicos, defendendo o método experimental de Aristóteles contra o método matemático do italiano Galileu (1564-1642).
Demorou bastante tempo até a alquimia se tornar em química e a química adquirir um método quantitativo em vez de qualitativo.
A experiência mais famosa da revolução científica terá sido, aquilo a que um historiador me 1923, declarou como sendo “uma das realizações mais relevantes da história da ciência.” É contada por um discípulo, com aspirações a biógrafo de Galileu, que relata que este tinha atirado da torre de Pisa dois corposde diferentes pesos, com o intuito de provar que Aristóteles estava errado em pensar que estes caíam a uma velocidade proporcional ao seu peso. De referir de que os escritos de Galileu não fazem menção a este assunto mas sim de que na sua juventude terá repetido várias vezes esta experiência chegando ao resultado oposto. Teria observado que uma peça de chumbo depressa ultrapassou uma de madeira. Mas para ele a experiência só seria definitiva se deixasse cair algo com o dobro do peso.
Galileu num período de cinquenta anos continuou aquilo a que se chama de “experiências pensadas” em que nalgumas das suas obras aparece certas anotações como “se fizesse isto, haveria de acontecer outra coisa”, inclusive naquelas experiências relativas à rotação da Terra.
Foi no campo da astronomia e da mecânica que a revolução científica alcançou maior significado e os seus resultados foram mais notáveis. A lei moderna da inércia – a imagem moderna dos corpos em movimento rectilíneo contínuo até ao infinito- dificilmente se alcança através da experiência ou da observação.
Galileu não teve em consideração o conceito de espaço euclidiano, totalmente vazio e sem qualquer direção. Sendo assim, não conseguiu encontrar a formulação correta da lei moderna da inércia, porque acreditava que esta se aplicava ao movimento circular, mas enganou-se, pois o que se chama de “movimento por inércia” deve-se ao movimento em linha reta.
O sistema aristotélico desencorajava a ideia de que a composição de movimentos era incompatível com um tratamento matemático do percurso seguido por um corpo em queda quando um movimento era complicado por outro.
Será a nova escola a começar a curvar o movimento do corpo e a desenvolver a opinião de que no mundo matemático o projétil descreveria uma parábola. Galileu estaria em posição de defender aquilo a que se chamava de “método matemático”, mesmo contra o sistema experimental dos melhores aristotélicos. Este método irá atrair os estudantes para uma vertente que poderiam usar como solução de problemas geométricos, como para os problemas da gravidade. A ciência embarcava agora em novas experiências e um número mais elevado de assuntos a pesquisar.
Galileu estava no caminho certo quando afirmou que a forma, a dimensão, a quantidade e o movimento eram as qualidades principais que o cientista deveria procurar examinar ao investigar determinado objeto.
Nos séculos XVI e XVII já existiam indícios de um tipo de mecânica mais moderna, como prefigurações da geometria analítica, física matemática, etc, mas que não avançaram mais na Idade Média porque não eram suficientemente avançados na matemática.
Na época de Galileu a aritmética e a álgebra estavam já num patamar semelhante à sua configuração moderna e começavam-se a criar instrumentos auxiliares do cálculo matemático, surgindo o escocês John Napier (1550-1617), figura importante por desenvolver os logaritmos entre 1595 e 1614.
A evolução fundamental atingiu o ponto culminante na época do francês René Descartes (1596-1650) que desenvolveu a ideia de que as ciências que envolvem ordem e medida, quer implique números, formas, figuras, sons ou outros objetos, estão relacionados com a matemática, afirmando “Portanto, deve existir uma ciência geral – a saber, a matemática – que deve explicar tudo o que se pode conhecer relativo à ordem e à medida, consideradas independentemente de qualquer aplicação a um assunto particular.”
As influências platónicas e pitagóricas tiveram um papel importante em Galileu e do alemão Johannes Kepler (1571-1630).
Na Idade Média havia já quem fazia da experiência algo decisivo porque compreenderam que subjacente à filosofia da natureza dos Gregos estavam a experiência e a observação. No século XVII pessoas como Sir Francis Bacon lutaram pela necessidade da experiência mas não conseguiram avançar mais porque não eram possuidores de uma matemática evoluída. A obra de 1600 do inglês William Gilbert (1544-1603) é baseada nos estudos de Peregrine no século XIII. O próprio Leonardo Da Vinci (Itália, 1544-1603) andou um pouco perdido nestes assuntos, querendo intrometer-se em tudo o que era moda de estudo na sua época, chegando mesmo à formulação de um plano experimental, como foi no caso do seu estudo do voo.
A tecnologia terá tido um papel muito mais importante do que se supunha nesta revolução científica. O progresso técnico alcançado em vários âmbitos, como a exploração de minas e a metalurgia, deve-se a obras pioneiras do século XVI. O papel fundamental de Arquimedes no âmbito da mecânica é inegável, havendo quem o veja como o “santo patrono” dos pensadores da mecânica e dos experimentadores modernos na área da física.
Quem beneficiou desta nova corrente foram os navegadores – ao início ignoravam os matemáticos e estes não tinham experiência marítima – que viram nomes como William Gilbert vir em seu auxílio e Galileu dedicar tempo aos estaleiros de construção naval de Veneza.
Os navegadores Portugueses nunca teriam passado o sul do equador sem a ajuda da ciência.
O aparecimento do relógio de rodas dentadas no século XVI constituiu uma grande novidade pois sugeria que os corpos celestes poderiam ser semelhantes às peças de um relógio.
O que poderemos dizer do século XVII é que foi o século da criação de instrumentos científicos, especialmente de medição. Surgiram o telescópio e o microscópio, desenvolvidos pela ciência óptica. Galileu dá um passo muito importante com o desenvolvimento do termómetro e do relógio de pêndulo. É também o século do aparecimento da bomba de ar.
Não terá sido a falta de técnica industrial a provocar o atraso no aparecimento dos instrumentos da ciência moderna.
Na primeira metade do século XVII, o método experimental, constituía um fardo muito pesado para os seus praticantes, sendo que, mais tarde serão as sociedades científicas a arcar com as despesas referentes às pesquisas, sendo que as suas publicações e a literatura periódica criadas por estas sociedades iriam aumentar a velocidade de comunicação e de verificação dos resultados científicos.
Para concluir utilizo uma súmula sobre o método experimental e que reforça a importância da matemática na evolução da ciência :
– “(…) sabemos que a descoberta da lei do movimento planetário de Kepler foi possível porque ele havia herdado e desenvolvido por si próprio o estudo das acções cónicas, estudo que o tornou famoso no seu tempo. E certamente que as observações astronómicas de Tycho Brahe só se tornaram um factor revolucionário para a história quando a mentalidade matemática de Kepler trabalhou este acumulado de dados. O mesmo fenómeno haveria de acontecer mais tarde, pois sabemos que o problema da gravidade nunca teria sido resolvido, toda a síntese newtoniana nunca teria sido alcançada, primeiramente, sem a geometria analítica de René Descartes e, em segundo lugar, sem o cálculo infinitesimal de Newton e de Leibniz. Sendo assim, não só a ciência matemática sofreu no séc. XVII uma evolução digna de nota, como também dá a impressão de que a dinâmica e a física estavam a pressionar constantemente as fronteiras da matemática. Sem a evolução da matemática a revolução científica, tal como a conhecemos, teria sido impossível.”
Bibliografia:
BUTTERFIELD, Herbert, As Origens da Ciência Moderna
Nuno Gonçalves Rodrigues (2013)