FILIPE DE FIÚZA
Foto: Maria do Céu Costa
O açúcar como salvação das almas
Em: https://www.youtube.com/watch?v=VQFbM_MITAw
Vídeo de Maria do Céu Costa
O açúcar como salvação das almas
Estou mais gordo, mas a gordura é temporária. Olho o Sol que me aquece, mas tanto o meu olhar como esse calor, tal como inclusivé o próprio Sol, são temporários. Os telejornais vendem lixo, os outdoors poluem a paisagem, mas os pássaros cantam como sempre, e eu como sempre não consigo parar de pensar. O Marquês da Sade está morto e morta está a democracia – uma demo seja do que for é sempre também temporária – a democracia está demodée. Entrei no outro dia numa igreja e apenas vi vazio, as religiões estão a caminho do vazio, não é preciso encher os espíritos com latim e cânticos e música de órgão para se saber que Deus existe, se Deus quisesse que nós não soubéssemos da sua existência não criaria o Universo das Almas. Afinal, quando queremos ter flores no jardim não temos de deitar sementes na terra, regar com água e deixar o Sol, que ainda olho e me aquece, aqueça também e faça gerar a sementinha? Tanto esforço para um tempo mais tarde, depois de nos regozijarmos com o esplendor das cores e da fragrância das flores, elas murcharem e morrerem. Talvez Deus também queira ter esse quimérico prazer de nos ver construir seus sonhos em nossas ideias, que todavia julgamos ser nossos, e no fim de tanto esforço, de tanta guerra sofrida e dinheiro esbanjado tudo cai e é lavado como castelo de areia em praia deserta. Fiz tantos castelos de areia e já me esqueci de todos eles, sei que as ondas do mar lavaram, como o tempo lava e leva tantos sonhos e tantos Deuses em nós. Agora que tenho a certeza que a democracia está morta e as religiões vazias, o que será do mundo? Espero que olhem para mim com alguma esperança, não porque nos últimos tempos a minha única vitória foi ganhar peso – sou guloso por bolachas, chocolates, gelados – mas sim porque ser guloso é ser vítima da droga desta nossa nova era: o açúcar. Como não bebo nem fumo, drogo-me com açúcar, vou morrer de overdose de açúcar, só assim consigo suportar esta grande perda que é o falecimento da democracia, só assim aguento o vazio estrondoso das religiões, que todos os dias os telejornais, as televisões, as rádios, os jornais, a Internet, entre outros, continuam a vender. Tu que lês estas palavras, pára e confronta o teu espírito nesta nossa pobre existência rotineira neste nosso soturno quotidiano dos futebóis, dos programas televisivos do liga-e-ganha, dos enredos e querelas familiares, dos enlevos amorosos, das mensagens dos chats, dos coitos virtuais, pára e confronta o teu magnânimo e sibilante espírito: quanto pesas tu? Quanto pesa a democracia na tua vida? Quanto pesa a religião nas tuas orações? Observa quão gorda está a tua ignorância. Depois de me confrontar, depois de te confrontares, chupa um rebuçado e liga a tevê ou faz login no Facebook. Podes ainda jogar Solitário do teu telefone inteligente, pois se não consegues fingir que o tempo passa, deves acender uma vela a cada noite e preparar-te devagar para morrer. Quanto mais castelos de areia faço mas tenho a certeza de que Deus existe. Também, quanto mais mundo conheço, mais acredito que o grande erro da humanidade é querer governar o fogo quando ainda não consegue governar a terra.
Filipe de Fiúza
16.03.2018 . Sintra
Teoria da Liberdade
Hipótese
Tudo é livre porque nunca se repete
a repetição funda o contínuo
continuar é permanecer existente
existir é libertar o ser
ser livre é repetir nunca igual
a igualdade está nos ciclos
um ciclo tem liberdade repetida
tudo é livre porque sempre se repete
a repetição tem intervalos
intervalar é consumir vazios
esvaziar é sentir a gravidade
a gravidade faz cair
a queda é livre
liberdade.
ϖ
Prova
A liberdade renova cada momento
que continua desde a origem sendo
em células átomos universos músicas
pela manifestação da sua totalidade
o livre irrepetível imaginal
de tudo o que sempre há
de imparável eterno regresso
no renovar de cada instante
porque o contínuo dá-se
como reacção supra-dinâmica
da evolução sempre cíclica
neste tudo repetido
para libertar existência
eternamente.
ϖ
Conclusão
Tudo é livre em cada momento
repetindo a origem fundada
em universos continuáveis
o que liberta é total
na igualdade irrepetível
no sempre como ciclo de tudo
ou regresso nascido eterno
em tudo há renovação
tempo é pausa ondulante
o vazio tem tempo estático
evoluir é um sentimento
a vida vem da grande queda
cair é voltar à existência
o eterno é liberdade
ϖ
Exemplos
O pensamento é livre e contínuo.
O vazio não cai porque é total.
Em tudo há vida e tempo repetível.
Ser livre é sempre regressar evoluído.
A totalidade constitui-se de universos iguais.
O eterno faz nascer ciclos que ondulam.
Sentir é um momento.
Filipe de Fiúza, 2016, publicada na obra LIBER MUNDI
Filipe de Fiúza | Poet . Engineer . Activist.
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17 de março de 2018