REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


NS | número 59 | julho-agosto | 2016

 
 
 
José Verdasca dos Santos. 79 anos, licenciado em Ciências Militares pela Academia Militar de Lisboa; em língua e cultura francesas pela Alliance Française; licenciado e pós-graduado em administração/gestão de empresas pela Universidade Mackenzie de São Paulo. Membro do Parlamento Mundial para Segurança e Paz (Itália), de dez academias brasileiras, da Sociedade de Geografia de Lisboa; diretor de relações internacionais das Faculdades Panamericanas e da Associação Alagoana de Imprensa. Condecorado pelo Parlamento de São Paulo com a "Honra ao Mérito" duas vezes e pela Câmara Municipal de São Paulo com "Laurea de Gratidão" além de cerca de vinte outras láureas acadêmicas. Tem oito livros publicados, além de artigos em revistas de cultura, poemas e centenas de outros na imprensa francesa, sul africana, brasileira e portuguesa. Presidente da Ordem Nacional de Escritores (Brasil).
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Projeto «Sarmento Pimentel»

ÍNDICE

JOSÉ VERDASCA
João Maria Ferreira Sarmento Pimentel (VI)

(O CAPITÃO)

 

Artigos anteriores de José Verdasca no Projeto "Sarmento Pimentel»

 

Cerca de 1980 veio ao Brasil o brigadeiro Jasmins de Freitas - já então na reserva - e que em 1958/59 como capitão, havia sido diretor do meu tirocínio (4° ano da Academia Militar) na Escola Prática de Infantaria em Mafra. Ali estabelecemos sólida amizade, e como o seu filho José António emigrasse para o Brasil (Franca) e ali tivesse casado, eu e minha mulher fomos convidados para seus padrinhos, o que proporcionou novos encontros. E como sempre me contatavam quando vinham a São Paulo, combinamos um almoço em minha casa, para o qual também convidei os irmãos João e Francisco Sarmento Pimentel, além do major Queiroz, casado com a filha de um imigrante local e então de visita à família da esposa. 

 

No dia e hora combinada, minha mulher e eu recebemos os seis convidados, a tornar o almoço um evento inolvidável, já que nenhum/a deles/as conhecia a minha residência ou havia antes degustado as delícias culinárias em que minha mulher é mestre. No living anexo à sala de almoço, foram instaladas mesinhas com alguns aperitivos regionais especiais – afinal, especialíssimos eram os convidados – aos quais iam sendo oferecidas as bebidas adequadas como aperitivos, que para Sarmento Pimentel se reduziam ao Porto seco e ou aguardente, pois não tomava – nem mesmo entravam em sua casa – whisky ou quaisquer outras bebidas importadas não portuguesas. 

 

Quando apresentei o casal Jasmins de Freitas ao velho capitão foi uma festa, mas quando chegou a vez do major Queiroz (então comandante da Divisão da PSP de Lisboa com sede na Praça da Alegria), Sarmento Pimentel, após ouvir a informação de que ele era comandante de divisão da Polícia de Segurança Pública, franziu a testa, contraiu as sobrancelhas, arrebitou o nariz, semi cerrou os olhos e, como que para confirmar, perguntou: você é da polícia? Mas o Capitão já tinha festejado seus noventa anos sendo um “monumento” vivo, pelo que os presentes fizeram “ouvidos moucos”, como se não tivessem ouvido a pergunta, nem presenciado a mímica que a acompanhou, que revelavam claramente certo desapreço pela ‘polícia’. E mesmo eu, que tinha absoluto a vontade com ele, jamais abordei o assunto. 

 

Convidados a ocupar seu lugares à mesa, todos se levantaram e a ela se dirigiram, mas Sarmento Pimentel encarou as duas portas – ao lado e em frente da larga entrada da sala de almoço – então fechadas, e perguntou onde davam acesso, tendo sido informado que a porta ao lado dava para a casa de banho, e a porta em frente para a cozinha. Ato contínuo o Capitão abriu a porta de acesso à cozinha, com o falso argumento de que gostava de apreciar as novas ‘máquinas’ das cozinhas modernas, mas, na realidade, querendo certificar-se da existência – ou não – dos cuidados de higiene que exigia em sua própria residência. E com a maior tranquilidade tudo ‘bisbilhotou’ e tudo pareceu aprovar. Estava salva a “honra do convento”. 

 

Em seguida – tranquilamente - o nosso convidado regressou à sala de almoço, ocupou o lugar que lhe estava destinado e sentou-se todo sorrisos, expressão de contentamento (ou alívio) que – de tão manifesta – lhe não era habitual. Mas eu só tive a confirmação definitiva de que Pimentel tinha aprovado – plenamente - as condições de higiene da cozinha onde fora confeccionado o seu almoço (eu havia indicado a minha esposa os seus pratos prediletos), quando, ao longo do repasto, constatei que ele se servia sem parcimónia, comendo com satisfação e elogiando tudo – entrada, peixe, carne e sobremesas – exibindo ainda certa exuberância que raríssimas vezes eu nele tinha presenciado. Mas isso tinha uma justificação. 

 

A safra vinícola do ano anterior – na minha aldeia, que produzia um tinto famoso – tinha brindado a minha adega familiar, com o melhor vinho tinto das últimas décadas, de linda e acentuada cor Ruby, sabores frutados do campo, como framboesa, amora e medronho; taninos e ácidos quanto baste, a darem ao néctar um equilíbrio notável, uma maciez inigualável, aveludada, que acariciava a faringe quando mergulhava nos sensíveis meandros dos delicados aparelhos digestivos; entretanto, das taças de boca larga, emanava um bouquet  que decerto deixaria inebriados os deuses Dionísio e ou Baco, primeiros grandes apreciadores dos fermentados de suco de uva.  Mas o vinho apresentava um DETALHE, que a ninguém informei: TINHA 16 graus !!!. 

 

 

José Verdasca

 

 
 

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