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Arlinda Mártires nasceu
em Alfundão, Baixo Alentejo, na madrugada fria
de 13 de Novembro de 1955. Entre as voltas pelo
mundo, reside em Alvito, no Alentejo, local de
culto, onde, impreterivelmente, tem de voltar,
para preparar nova partida.
Licenciou-se, pela
Universidade Nova de Lisboa, em Estudos
Portugueses e Ingleses e fez Pós-Graduação em
Literaturas e Culturas dos Países Africanos de
Expressão Portuguesa.
É professora do ensino secundário desde 1989 e
tem servido a língua e a literatura portuguesas
em Portugal, na Guiné-Bissau, na Namíbia, em
Angola e em Timor-Leste. Momentaneamente está de
regresso à escola a cujo quadro pertence, em
Viana do Alentejo.
Tem quatro obras publicadas:
Além-Rio,
poesia, prémio nacional Raúl de Carvalho (1999);
Guynea,
poesia; Sete
Histórias de Gatos,
contos, em co-autoria com Dora Gago; e
Impressões do real,
poesia,
prémio de poesia do
Concelho de Alvito, no âmbito do prémio nacional
de poesia Raúl de Carvalho (2013). Integra ainda
a Nova
Antologia dos Poetas Alentejanos,
cuja direcção é de Eduardo Raposo.
Obteve Licença Sabática e realizou um projecto
literário do qual resultaram três obras:
Fábulas de
Portugal e da Guiné-Bissau
(ensaio),
Contos da
Terra Vermelha
(ficção) e
Guynea
(poesia; já
publicado).
Tem artigos e poemas
dispersos em jornais e revistas e participa em
conferências, tertúlias e eventos relacionados
com a língua portuguesa, a literatura e a
música. |
ARLINDA
MÁRTIRES
Guynea
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Ao povo da
Guiné-Bissau, também meu
povo,
meu chão ( nha
pubis, nha tchon ).
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acácias rubras
Floriram
acácias rubras
onde o musgo e o
líquen
fizeram sua
morada.
Floriram
em Chão de Papel
onde o lixo e a podridão
têm seu domínio.
Abriram em flor
em Bissau e Bafatá,
em Varela e Catió.
Em flor rubra
no poilão de Brá.
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Sta. Luzia
I
Em Sta. Luzia
pega a noite com o dia.
Estrada de Plubá
kandonga, toka – toka
para cá, para lá.
Bicicletas, motoretas,
povo a pé
para lá, para cá.
Panos garridos
de pente e legoss
bacias, balaios,
caju,
mankarra,
cabaceira,
mangu,
banana, papaia.
“Miseria ka ten?
Sõ miseria ke nô ten.”
II
–
estação seca
–
Janeiro
sopra ventinho rasteiro
levanta a terra vermelha
entra na boca, na
orelha,
entranha-se no pulmão.
De tudo faz sua cama
do chão até ao poilão
passa por casas e leitos
leva vírus e maleita
de uma vez se deita
depois do primeiro
trovão.
III
-
estação das chuvas –
Cai a chuva
em catadupa
lava matas e casas
(a outras leva )
lava corpo, não a boca.
Escorrem rios
pelo telhado.
Pela estrada
lagoas de água vermelha,
morna, parada,
berço de coaxar de rãs,
cólera, malária,
morte.
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Mansoa
Descalça
chega
a manhã a Mansoa.
Aflautado
ergue-se
o canto da rola
d’Abissínia
ecoa
na lala verde
aguarela
e nas luas d’água.
Branco
sobe
o fumo das fogueiras
paira
acima do colmo dos
telhados
enlaça
a neblina nas
palmeiras.
Breve
atrasa
o sol do Equador
refresca
o sono nas esteiras
adia
o kuntangu na
panela,
mata-bicho, janta,
ceia.
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Cacheu
Em Cacheu
jaz o Império.
Mira ainda o rio
a Fortaleza
que as cabras guardam
sem pastor.
Trocaram o mar pela terra,
por onde foram deitados,
navegadores, vice-reis e
governadores.
Permanecem os canhões,
cofre de memória
e de aves marinhas,
contra os quais
só a ferrugem marcha.
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Quinhamel
O cajual
amarelo,
encarnado,
agridoce, meloso, fermentado.
O ar
parado, quente, pesado,
moscardos, moscas, mosquitos,
balidos, vozes, gritos.
A estrada
ardente, tremente, alcatroada.
As bermas
bacias, sacas, castanha,
kombé.
canjirões, garrafões, garrafas, cabaças.
A meninada:
Branku!
Branku!
Boleia! Boleia!
Adiante
lodo, água, areia,
camarão, ostra, maresia.
Morna e mansa
a ria.
Mole e falsa
a lama
cinza – pastel
Quinhamel.
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Cais de Pidjiguiti
I
Alba-menina
é já o cais um mar
de gente, cor, vozerio.
Maré enchente
povo e rio.
II
Maré enchente
mortalha
de barcos e caravelas.
Outros bordejam
a flor do Geba
cinza antes do mar.
III
À flor do Geba
véspera d’ Atlântico
tardam barcos e canoas
cachos de uva cardinal
azul, caju,
mancarra e
sal.
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