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Francisco Gomes (cor)rompeu a existência em 1982
no arcaico município de Campo Maior (PI), mas
fixou raízes na provinciana Teresina (PI), onde
habita desde os sete anos de idade. Iniciou as
faculdades de História e Letras/português,
abandonou ambas. Publicou os livros Poemas
Cuaze Sobre Poezias (FCMC
- 2011) e Aos
Ossos do Ofício o Ócio (Penalux
- 2014). Admira a carência orgulhosa dos gatos e
a tranquilidade dos jabutis. Adora fígado
acebolado.
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FRANCISCO GOMES
Série Malditos
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NUMA ATMOSFERA FANTÁSTICA
(para
Quiroga)
Numa atmosfera fantástica
– tarde fria
feito natureza-morta retratada,
a póstuma família suicida
observa
–
olhos atentos,
mudos,
congelados,
a galinha degolada no terreiro
que esperneia
sem bater as asas.
Horácio Quiroga
(após a agonizante cena do galináceo)
interroga:
“Perséfone, o que significa tal maldade?”
(seria um presságio? Um aviso? Um fato?)
Perséfone responde:
“Horácio, não há maldade.
A vida é a tua arte-sorte:
o câncer,
o cianureto,
o amor,
a loucura,
a morte.”
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ENSAIO SOBRE O INEVITÁVEL ISOLAMENTO
(para David Ribeiro e Fernando Naporano)
Ao som de Astor Piazzolla,
meu ser se isola
com o espectro de Anne Sexton.
Divido com o mundo a desolação de Nick Drake,
o ardor dos lábios incendiados
num beijo de despedida.
Sei da fragilidade humana:
a necessidade involuntária de outro corpo,
de espaços,
de recíprocos.
Sei, sim, da fragilidade humana...
Por isso, contrario.
Permaneço ausência,
silêncio,
solidão.
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PORQUE OS FARÓIS TAMBÉM PERECEM
(para Dylan Thomas e Bruno Baker)
Ter o riso ornamental
diante da arte taciturna
(impetuoso mar delirante ante as cinzas do
cadáver ancestral)...
Sentir a carne ainda ligada ao osso
– a pele: pomposo invólucro –
para tornar perverso o toque púrpura
no corpo.
Os olhos de peixe (como sem pálpebras)
arregalados,
contínuo susto,
pupilam os montes as curvas as tumbas
as lápides:
uns rezam
outros jazem.
Gélido refúgio ou ilusão do perene
, o envelhecer
das tardes.
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TESTAMENTO
(para Isidore Ducasse e Evaldo Guimarães)
Os crânios amontoados no canto
esquerdo do olho;
clarão sobre os despojos
– desbotadas pétalas lacunares...
O que foi dito está dito.
Fica gravado:
tatuagem Inca,
nódoa no vento,
testamento vivo aos futuros mortos
dos que aqui
passados serão.
Os crânios...
Iluminação à Georges De La Tour
holofoteando o mofado canto (paredes manchadas)
– baú de couro
de lembranças
de pretéritos
de ossadas...
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A FLOR QUE FITO
(para Tristan Corbiére)
A flor que fito
distante
no fátuo eflúvio do horizonte – fovismo,
sinestesia provocante-canto-de-sereia,
é abismo:
ilusão desnorteadora do tangível.
A flor que fito
errante
fincada na ferida a fogo a ferro
(lágrimas de sangue e um berro)
, pela pétala de brutalidade instigante,
torna-se
num sopro paradoxal
singular suave bela...
Tão bela essa flor mutante!
A flor que fito
descomunal
habita a visceral entranha:
tamanha é a força instintiva primal
fricção carne-carne
afago que arranha
fluido corporal.
A flor que fito
embevecida
também fede também cheira;
nãoé Amor
nem flor amarela.
A flor que fito
– nudez-mais-que-merecida –
não é Vênus de Milo;
só o sonho revela.
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