Revista TriploV de Artes, Religiões & Ciências . ns . nº 56. janeiro-fevereiro 2016





Pedro Sevylla de Juana
nasceu em plena agricultura, lá onde se juntam La Tierra de Campos e El Cerrato, Valdepero, província de Palencia, em Espanha; e a economia dos recursos à espera de tempos piores ajustou o seu comportamento. Com a intenção de entender os mistérios da existência, aprendeu a ler aos três anos. Aos nove iniciou seus estudos no internado do Colégio La Salle de Palencia; seguindo os superiores em Madri. Para explicar as suas razões, aos doze se iniciou na escrita. Cumpriu já os sessenta e nove, e transita a etapa de maior liberdade e ousadia; obrigam-lhe muito poucas responsabilidades e sujeita temores e esperanças. Viveu em Palencia, Valladolid, Barcelona e Madrid; passando temporadas em Genebra, Estoril, Tânger, Paris, Amsterdã, Villeneuve sur Lot e Vitória ES.

Publicitário, conferencista, tradutor, articulista, poeta, ensaísta, crítico e narrador; publicou vinte e três livros e colabora com diversas revistas da Europa e América, tanto em língua espanhola como portuguesa. Trabalhos seus integram seis antologias internacionais. Reside em El Escorial, dedicado por inteiro às suas paixões mais arraigadas: viver, ler e escrever. www.sevylla.com 

 

PEDRO SEVYLLA DE JUANA

Sertões
 

Estrela da manhã e Libertinagem manuscritos,

viagem de circum-navegação elíptica:

além do Recife, Rio, Santos, São Paulo e Rio;

até chegar a Totônio Rodrigues e a rua da União.

¿Que fazia aquela noite

-poesia e música da mão, pintura e poesia

caminhando juntas-

Bandeira, no Sertão, diálogo afetivo

com um escritor espanhol e uma 

pesquisadora capixaba?

 

Pergunto,

que fazia aquela noite,

farto do lirismo comedido

farto do lirismo bem comportado,

do lirismo funcionário público,

desejando ser um poeta crítico e selvagem

peixe emergente das águas abisais

fera nas interioridades selváticas?;

que fazia essa noite no Sertão,

-sorriso insatisfeito, mitológica olhada,

autocrítica memoria-

em aparente atitude latifundista?

 

Sonhava eu o sonho de sempre:

a humanidade satisfeita de suas coisas,

os açambarcadores devolvendo o comum;

o sonho era meu e Bandeira o habitava:

Abaixo os puristas!

Abaixo o lirismo namorador!

Abaixo o lirismo que capitula!

 

Sento ainda o eco de suas palavras

no pavilhão de meu ouvido

esquerdo

-o direito

                  ouve distorcido-

e me somo a seu protesto, praça acima,

cenáculo literário abaixo:

Não quero mais saber do lirismo

que não é libertação.

 

Um sonho de liberdade e de justiça

distributiva,

o sonho dos representantes

servidores dos representados,

era meu sonho aquela noite no Sertão.

 

Discutíamos Ester Abreu e eu

sobre alguns aspectos confusos

de Dom Juan, baixando

aos infernos para surgir de novo:

andrógino,

triunfante,

celestial.

 

Desenvolvia-se o sonho,

intemporal ou com os tempos misturados,

num Sertão imaginário

que era a soma

dos Sertões de Euclides da Cunha,

Guimarães Rosa, Graciliano Ramos e Jô Drumond:

aridezes existenciais, aleph, vidas secas,

horizonte além do horizonte,

utopia.

 

E se sucedesse: pensei um instante: que Pasárgada

ocupasse um extremo imaginário do Sertão?,

o correspondente à Utopia, exempli gratia;

ou ao exoplaneta Gliese 581 g

onde a felicidade pende dos galhos nos arboles,

sendo o ar maná alimenticio;

e Manuel chegasse alí

num momento de fundo desânimo,

desde a casa da Rua do Curvelo

no interior da ânfora de sua tristeza mais triste:

Não sei dançar,

meu verso é sangue,

cai, gota a gota do coração...

 

Grita, ri, vive!: exclamei: Manuel Bandeira;

alegra-me que coincidamos na função liberadora,

detersoria,

da poesia.

Fica a vontade no meu sonho sertanejo:

convidei:

não a Veneza americana

não o Recife dos Mascates,

neste Sertão de Sertões gris e gélido,

vozes simbolistas, parnasianistas, modernistas

sequedade na garganta,

imaginando com Ester e comigo

o triunfo último de don Juan

convertido

em fêmea

feminista.

 

Vou-me

embora para Pasárgada: disse,

mãos nos bolsos vazios,

olhada displicente:

poesia ao serviço da imaginação.

 

E vi-lhe marchar ao longe, sonho adiante,

convidado por Baudelaire,

quando a ilusão acordava em mim

e os livros se fechavam:

correção do professor Veríssimo:

Capibaribe!, Capiberibe!

 

PSdeJ

 
 
 


 
 
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