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PARAPSICOLOGIA E RELIGIÃO
I
Charles Richet, em seu Tratado de
Metapsíquica, o primeiro sobre a matéria, afirma logo no
prefácio que “não verão os seus propósitos realizados aqueles que neste
livro esperarem encontrar considerações nebulosas acerca dos destinos do
homem, da magia e da teosofia.”(1)
Joseph Banks Rhine, que conduziu a
Parapsicologia ao status acadêmico, em seu Parapsicologia:
fronteira científica da mente, segue na mesma linha:
“A Parapsicologia também precisa ser
diferençada dos conceitos populares correlacionados com certas áreas de
prática ou crença, com os quais algumas vezes se vê confundida ou
associada. O Ocultismo é um deles. Este termo, que designa o
estudo de artes ou princípios ocultos, não se aplica ao tipo científico
de investigação que caracteriza a Parapsicologia. Espiritualismo
é outro termo que tem sido amplamente associado com Parapsicologia. O
espiritualismo, contudo, é uma religião, cuja ênfase central repousa na
crença da existência de um mundo de personalidades desencarnadas,
supostamente capazes de entrar em comunicação com os vivos,
especialmente através da mediunidade. Também se acredita que elas são
capazes de manifestações tais como fenômenos de assombração e de uma
espécie de casa cheia de agitação atribuída a espíritos turbulentos.”
e conclui:
“Como em todos os sistemas religiosos de
crença, há certas doutrinas no espiritualismo que se baseiam na
presunção de certas capacidades, que não têm sido verificadas por método
científico em Parapsicologia.”(2)
Poderíamos buscar outros estudiosos sérios
para confirmar aquilo que objetivamos destacar, ou seja, o não
envolvimento dos estudos parapsicológicos com o oculto, o místico, em
poucas palavras, com o que não podemos alcançar.
E é exatamente neste ponto que está a
importância dos estudos parapsicológicos no combate ao medo e à
superstição.
Vemos diariamente pessoas serem enganadas por
verdadeiros espertalhões das mais variadas denominações religiosas,
representantes do Senhor Jesus, como querem alguns, mediarem
relações comerciais com Deus, ardilosamente. Expressão máxima da
arrogância. Estes oferecem tudo em troca de algum dinheiro para a
“manutenção da igreja”. É o comércio entre o aqui e o agora e o
desconhecido além. Prometem afastar as más influências dos
espíritos que, talvez por nada de melhor a fazer, perturbam os pobres
mortais. Algumas denominações cristãs evangélicas lideram este quesito.
A Parapsicologia, deste os primórdios,
procurou investigar uma série de ocorrências atribuídas à participação
de entidades incorpóreas e inteligentes. Nada encontrou em mais de um
século de pesquisas.
A Parapsicologia não interroga as religiões.
Não explica milagres. Não é seu território. Não está interessada se
existe vida após a morte. Não importa à Parapsicologia o fato de o
investigado ser ateu ou crente de qualquer denominação religiosa.
Acreditar em Deus ou Hórus. Se os espíritos existem e vagueiam pelo
universo ou não. A Parapsicologia não diz acreditar, ou não, quando se
depara com alguma fenomenologia incomum, nos moldes e nos limites de sua
área de investigação. Estuda, pesquisa, experimenta. Todavia, até o
presente momento, continuam os espíritos sem dar seu “ar da graça”.
Os “espíritos” imundos não buscam
laboratórios de parapsicologia. Nunca o fizeram. Eles próprios são pouco
inteligentes. Gostam de tomar posse de casas velhas e abandonadas, de
atacar famílias humildes, por vezes, pouco esclarecidas, e, o mais
comum, frequentadores de igrejas, embora sabedores de que lá serão
expulsos e mandados queimar no inferno para todo o sempre.
Chamá-los de pouco inteligentes já é um grande elogio. Risível.
Estes mesmos “espíritos” são apontados como
responsáveis pelas nossas frustrações, nossos fracassos e insucessos,
por inúmeros líderes religiosos.
Este tipo de atitude, dispensável dizer,
reprovável, busca afastar a responsabilidade de cada um sobre seus
atos. Caminho perigoso, perverso e indesejável.
Espalham como erva daninha o inaceitável
mistério de um homem ser injuriado, espancado, morto e crucificado, para
redimir os pecados de todos os seres humanos. Isso implica, insanamente,
na mais repugnante, baixa, perversa e injustificável aceitação de que
alguém possa pagar pelos erros cometidos por outros.
Mas é fácil, diz Voltaire, (3) “submeter ao
jugo uma alma culpada e trêmula que não raciocina...”.
II
Os constantes ataques de que a Parapsicologia
não passa de uma pseudociência nada mais fazem do que contribuir com o
aumento das igrejas. Neste ponto os críticos da Parapsicologia
irmanam-se a alguns despreparados religiosos.
Contudo, apesar de todas as críticas,
assistimos nos dias atuais estudos realizados em respeitadas
universidades confirmarem os resultados divulgados há mais de um século
pela Parapsicologia.
Basta lembrarmos, apenas para citarmos um
exemplo, o recente trabalho sobre premonições (em Parapsicologia
precognição) realizado pelo reconhecido psicólogo Daryl J. Bem,
professor da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, e que serviu
de chamada para a Revista Isto É, cujos resultados evidenciaram,
com bases estatísticas, que é possível um conhecimento prévio do
futuro.(4) A pergunta que não quer calar: qual a novidade?
Dizer-se isso, não responde o que de fato
queremos saber. É necessário explicarmos como isso ocorre. Padecemos
desse mal, concordo, desde as primeiras pesquisas psíquicas. (Mas, há
explicação para isso, embora não seja objeto deste artigo) Contudo, isso
não desmerece o fato de as evidências apontarem para essa possibilidade.
A questão, estamos assumindo, não é nova. Não podemos esquecer – pelo
menos não deveríamos – que Agostinho de Hipona, há mais de mil e
quinhentos anos já arriscou, na minha opinião a melhor até hoje, uma
resposta:
“Qualquer que seja a natureza dessa
misteriosa previsão do futuro, não podemos ver senão o que existe. Mas o
que existe não é futuro, e sim presente. Por conseguinte, quando
dizemos que vemos o futuro, não se veem os próprios acontecimentos ainda
inexistentes, - isto é, o futuro, - mas sim as causas ou os sinais
precursores que já existem. Portanto, para quem vê, não se trata do
futuro, mas do presente, do qual é tirada a predição de um futuro
concebido na mente. Por sua vez, essas imagens já existem, e aqueles que
fazem predições as veem presentes diante de si. Tomemos um exemplo entre
muitos possíveis. Vejo a aurora e posso predizer que o sol está para
surgir. O fenômeno que observo está presente, o que prevejo é o futuro.
Não é futuro o sol, que já existe, mas sim o seu surgimento, que ainda
não se realizou. Todavia, se eu não tivesse no espírito uma imagem desse
surgimento, como tenho no momento em que falo, não o poderia prever. No
entanto, nem essa aurora que vejo, e que também precede o nascer do sol,
nem a imagem dela são o próprio nascimento do sol: são dois os fatos
presentes que vejo e que me servem para predizer um acontecimento
futuro. Portanto, o futuro ainda não existe. Se ainda não existe, não
existe; e se não existe, de maneira nenhuma pode ser visto; mas
podemos predizê-lo mediante os fatos presentes, que existem e que vemos.
(5) (g.n.)
Lembremos, merecidamente, Charles Richet:
Tão logo declarem que tal ou tal fenômeno é
impossível, confundem desastradamente o que é contraditório com a
ciência e o que é novo na ciência. Convém insistir na tecla,
porque ela é a causa profunda de um cruel mal entendido. (6)
O tempo é engenhoso, dizia Guimarães Rosa.
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