2. Neste dia infinito
Vejo a Tua face nos olhos inocentes
Dos pequenos pássaros da Tua alma,
Que incendeiam de Luz a luz desta tarde efémera.
O rosto Teu vejo no palpitar do sangue verde
Das Tuas árvores, minhas irmãs na irmandade
Da fulgurante vida das primaveras infinitas.
O poema é do Teu rosto e fervilha mansamente
Na verdade do meu transitório sangue.
As Tuas crianças são a alegria da Tua alma,
Próxima e quente, agasalhando estas palavras
Pobres, para que não se percam neste dia infinito.
3. Como uma primavera de poesia eterna e abençoada
O silêncio é a alma de Deus e a sua luz mais fulgurante,
E o branco escorre das lágrimas das crianças esquecidas,
Que residem no silêncio mais completo do seu doce olhar maternal,
Como uma primavera de poesia eterna e abençoada.
Há grandes festejos na alma de Deus, no silêncio sagrado que é.
Grandes velas de barcas da vida do olvido alvíssimo,
São flores inteiramente novas, puro invisível do seu absoluto amor.
O tempo refugia-se num silêncio puríssimo da alma de Deus
Para deixar de ser tempo e dor, e poder cantar, e poder correr
Como uma criança liberta na minha alma plena
De uma fulgurante alegria triste.
4. Nascente
Um clarão de doce luz insuportável, transportando consigo
A alma eterna do sonho, é um rosto inesperado, aqui,
E cujas lágrimas de comoção e esperança
Escorrem para o mais íntimo dos poemas breves.
Ele nasceu desde sempre, para alumiar aquela
Primavera de um inverosímil e sagrado devir,
Onde um sangue branco do esquecimento
Fará florir uma dor simplíssima e leve.
5. As lágrimas das crianças podem fazer florir o todo
As lágrimas puríssimas das crianças
Podem fazer florir o universo e o caos,
E todos os desertos da alma e todos os
Desertos da matéria.
As lágrimas puríssimas das crianças
São sementes infinitas que podem fazer
Com que os humilhados e os marginais
(Plenos de ternura e de visão ocultadas
Pela dor) principiem a cantar, a cantar
Todas as melodias brancas da liberdade
Do Homem e de Deus, e eu vejo arco-íris infinitos
E fulgurantes erguerem-se a meio da noite, sossegando-os
E a todos os seres doentes, dando-lhes como uma hóstia secreta
Essa água de um natal de infinita beleza íntima,
Ressoando pelo Todo corno um clamor de alegria
— O sol pleno e inefável pulsando um tal desmedido amor!
6. A noite é de luz e vem silenciosa e branca
A noite é de luz, e vem devagar,
Com sua alma branca e silenciosa,
Com as suas comovidas e misteriosas lágrimas,
Acolher-se à minha alma sem luz,
A minha alma sonhando com a casa eterna,
Do amor e da comunhão com o Deus infantil,
Que jamais revelou o seu rosto, talvez
Cicatrizado pela dor e por uma infinita saudade.
A noite é de luz, e vem devagar,
Com a sua feminina presença vestal,
Com o seu infinito bailado de galáxias
Do desconhecido, com os seus brinquedos quebrados
Numa infância destruída, acolher-se à minha alma sem luz,
A minha materna alma, para um eterno
E branquíssimo poema, com a sua partitura nítida
Na invisibilidade que me cega. |