MARIA ESTELA GUEDES
No passado mês de Outubro, decorreu em Marrocos o XIII EIDE/Encuentro Internacional de Escritoras – En honor a Fatima Mernissi. As sessões começaram no dia 25 em Tetuan e depois prosseguiram por várias cidades. Eu estive em Tetuan, Larache e Chefchauen – Xexuão, como dizem os portugueses -, ou Pérola Azul, por a maioria das casas ser pintada em anil. Em cada cidade, as sessões, simultâneas, distribuíam-se por várias instituições . Participei com uma conferência sobre o caso das Três Marias, L’affaire des Trois Marias, na Faculdade de Letras da Universidade de Tetuan, numa mesa redonda dedicada a biografias de mulheres.
Uma centena de escritoras, número pequeno, segundo notícia de participantes habituais no EIDE, em comparação com anteriores encontros na América do Sul, em que foi triplo, uma tão grande concentração de mulheres naturalmente agita as cidades e quem lida com elas, sobretudo em países ideologicamente mais marcados pelas contingências das sociedades patriarcais. Havia umas trinta escritoras marroquinas, muitas sul-americanas, pelo menos uma indiana, uma jordana, de outros países do Médio Oriente, francesas, muitas espanholas, quatro brasileiras e uma só portuguesa, esta que vos relata uma pequena parcela da assembleia feminina e feminista.
O XIII EIDE apresentou tendências várias, a considerar como mais conspícuas as sessões de poesia e as exposições de artes plásticas, além, claro, das intervenções de fundo e oficiais. Entre estas, agrada-me referir a mensagem enviada por Sua Majestade o Rei Mohammed VI, muito avançada, na minha perspetiva, atendendo a declarações misóginas e politicamente ineptas do futuro presidente do Brasil, que à data dominava as redes e outros meios de comunicação social. Considerando o EIDE um fator de sensibilização das mulheres para a mudança a conquistar para o futuro, e uma razão de progresso cultural e económico para Marrocos, a saudação do Rei agradou às escritoras, dando-lhes ânimo para empresas que nem sempre foram leves no decurso dos trabalhos que foram decorrendo.
Como seria de esperar, a temática preferencial incidiu na questão da mulher, no seu estatuto e lugar que lhe cabe no mundo, nem sempre assegurado pelas políticas dos países onde vivem. Vieram à cena histórias dramáticas, próprias de ditaduras e de maiores e menores fanatismos de culturas fortemente patriarcais, como a islâmica.
Nos nossos países ocidentais, lidamos quotidianamente com abusos e violação dos direitos das mulheres, mas cabe ler bem a frase, pois ela manifesta as profundas diferenças entre a nossa vida e a de mulheres que nem sequer podem sair de casa e são tratadas como simples ferramentas de reprodução. Se falamos da violação dos nossos direitos e falta de respeito por eles, é porque os temos. Lográmos, com o estabelecimento das democracias, legislação que nos assegura plenos direitos de cidadania. As histórias que grande parte das mulheres veio testemunhar a Marrocos pertencem a um tempo e civilização anteriores, em que as mulheres ainda não foram reconhecidas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Por esta razão, calou fundo em mim uma palavra comum na língua espanhola, mas que na portuguesa é rara, sororidade. Sororidade foi a palavra de ordem lançada às mulheres pela escritora homenageada no XIII EIDE, Fátima Mernissi, como instrumento de elevação de todas as mulheres à condição de cidadãs de direito pleno. Precisamos de nos ajudar umas às outras, de puxar umas pelas outras, para que todas sejamos reconhecidas como seres humanos.
MOMENTOS
Sétimo Encontro Triplov na Quinta do Frade
Casa das Monjas Dominicanas
Lumiar . Lisboa . 17 de novembro de 2018