Não praticantes e o covid-19

 

AIRES GAMEIRO
(Funchal)


Há uns tempos um amigo dizia diante do grupo, com certa satisfação, que era um católico não praticante. É isso, o coronavírus veio multiplicar os não praticantes de quase tudo. Os estudantes foram obrigados a ficar em casa e a não praticar a escola. Escolas fechadas. Muitos trabalhadores ficaram não praticantes, em layoff. O meu e muitos médicos não praticantes fecharam os consultórios. E esta! Sem precisar de covid-19, um marido divorciado passou a não praticante, desabafou a vizinha. E o que serão as casadas sem filhos, mães não praticantes? O covid-19 deixou os futebolistas e seus fãs não praticantes. Aquele, acima, será um daqueles a quem o coronavírus fechou a igreja lá na terra? Muitos, de facto, passaram para a religião dos não praticantes de missa, oração, comunhão. Serão também não praticantes da fé em Jesus Cristo? Alguns ficam meio praticantes e meio não praticantes, mesmo agora com as igrejas abertas: missa, a da televisão, as orações, as que os outros fazem por ele. Mais afetados do vírus temos os trabalhadores não praticantes de emprego e de salário no fim do mês e, talvez, de muitas refeições. Sai-se à noite pelas cidades e vem o choque dos não praticantes de dormir numa cama e ter casa. Nem faltam por aí crianças não praticantes de pai e mãe. Uma tristeza! Os ateus serão grupo de não praticantes de Deus ou praticantes da crença de que ele não existe? Ao passo que os agnósticos são não praticantes até do pensar em Deus? Noutro dia, numa cidade, alguns não praticantes da calamidade passeavam aos magotes, sem máscara; e outros, sem manterem as regras das distâncias, na festa da farra, noite dentro. E alguns a lamentarem-se de praticar a infeção do contágio e estarem em quarentena! A TV mostrou há pouco um grupo enorme de não praticantes, sem pátria a viver miseravelmente num campo de refugiados. Dava pena ouvir as suas lamentações de apátridas. Outros lamentavam-se de não praticarem a praia, o bar, restaurante, mercados e lojas. Haverá, agora, alguns não praticantes de binge drinking (5-6 copos de vinho ou cervejas por ocasião). Um dos grupos de muitos não praticantes do Pai Nosso, são os que andam de boca cheia de fraternidade universal, mas não aceitam nem reconhecem o Pai de todos. Alguns pensam, e às vezes dizem aos amigos: eu, irmão daqueles!? Os racistas são o quê? Não praticantes de fraternidade com os de pele diferente. Ele, meu irmão? O relativismo extremo, do tanto faz, gera muitos não praticantes da verdade e do sentido da vida. E os ignorantes entram no grupo dos não praticantes da ciência. O barómetro do bem comum revela os não praticantes da bondade, generosidade e integridade moral. Nos surtos de infeção, os testes que dão negativo distinguem os infetados dos não praticantes da tosse e dispneias respiratórias. Não faltam aqueles, em que me incluo, que desejam ser não praticantes da violência familiar e social, do egoísmo e da corrupção. O melhor é passar de não praticantes do bem, da vida de fé cristã para praticantes, convertidos e santos. No dia 3 celebra-se a festa de S. Tomé, um praticante da fé em Cristo que teimou ficar não praticante por melindre, quase amuo, de Jesus ressuscitado não se ter mostrado a ele como fez com os companheiros. Para que muitos não praticantes católicos não fiquem nesse estado de amuo com Jesus Cristo, Ele veio mostrar-se a Tomé e pedir que tocasse, visse, acreditasse e se convertesse. Afinal acreditou por evidência, mas Jesus, para nós deixou claro que é melhor acreditar, sem ver, só por fé na palavra credível dos que viram e testemunharam com a vida. Tomé nem reparou que ver não é acreditar. Quem vê verifica cientificamente. Quando Jesus lhe apareceu oito dias depois, disse: mete aqui o dedo (na chaga) e acredita porque pedia que a sua fé fosse além do que via: E Tomé foi e passou de novo de não praticante a praticante e deixou de ser apóstata incrédulo, ao exclamar: meu Senhor e meu Deus. E mais tarde foi evangelizar a India onde foi mártir e onde tem uma bela catedral em Madrasta (Chenay) com lista dos seus bispos desde a fundação até cerca de 1950; todos portugueses!

Funchal 3 de julho, festa de S. Tomé, 2020

Aires Gameiro