Além do apoio formal, discreto ou aberto, por parte de alguns Estados e das organizações internacionais, também foi significativo o apoio prestado pelas Organizações não Governamentais (ONG), por vezes apoiadas ou criadas pelos governos de alguns Estados.
O primeiro propósito dessas organizações consistia em apoiar os Movimentos Independentistas do Ultramar Português na sua luta contra a soberania respectiva, fornecendo-lhes o mais diversificado apoio que, considerado nos mais diferentes aspectos, era indispensável para a manutenção do esforço de guerra.
Segundo uma informação de serviço do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 25 de Janeiro de 1972, os movimentos, grupos ou organizações que promoviam acções de propaganda contra a política portuguesa caracterizavam-se pela sua filiação comunista ou filo-comunista, socialista, liberal ou esquerdista, entre outras, tendo como intenção prioritária apoiar os “movimentos terroristas” na luta contra a soberania portuguesa em África, prestando-lhes auxílio político e material, promovendo reuniões, encontros, peditórios, patrocinando publicações, folhetos, etc. Assim, de acordo com a análise de documentos do período de confronto (1), eram tidas como organizações anti-portuguesas, ou que apoiavam os movimentos independentistas no Ultramar Português, 39 organizações.
A subversão “larvar” era, há muito, auxiliada por instituições de tutela norte-americana; consta que algumas delas, encobertamente, foram financiadas pelo governo, estando empenhadas na mesma tarefa de tentativa de aliciamento e infiltração americana. Dessas instituições salientam-se as seguintes: American Peace Corps, African American Institute, American Committee on Africa, Ford Foundation (2), a AFL-CIO (American Federation of Labor — Congress of Industrial Organizations), as missões protestantes de comandamento norte-americano e as seitas cristãs nativas por elas accionadas, entre outras.
Em Inglaterra, actuavam várias organizações anti-portuguesas que, directa ou interpostamente, apoiavam os movimentos independentistas, das quais destacamos o “Movement for Colonial Freedom”, o “International Defense and Air Fund”, o “Comité de Moçambique, Angola e Guiné-Bissau”, o “Anti-Apartheid Movement”, o “Movement For Colonial Freedom”, o “Communist Party of Great Britain” e o “Labour Peace Fellowship” (3).
De 27 a 29 de Junho de 1970, realizou-se em Roma a Conferência Internacional de Apoio aos Povos das Colónias Portuguesas, tendo o “Movimento Liberazione e Sviluppo” organizado um convénio, em Milão, de 8 a 9 de Abril de 1972. Nele participaram representantes dos diversos Movimentos Independentistas, representando Óscar Monteiro (membro da representação em Argel) a FRELIMO. Aí, foi decidido coordenar os movimentos de guerrilha, a nível internacional, e procedeu-se ao reconhecimento oficial dos representantes daqueles movimentos. Outras ONG italianas, como o “Movimento per il Terzo Mondo”, apoiaram também os Movimentos Independentistas das Províncias Ultramarinas Portuguesas (4).
Também na Holanda, existiam organizações apoiantes dos referidos movimentos, entre elas: a “Fundação Evert Vemer”, o “Grupo de Acção para a África Austral”, o “Movimento Holandês anti-Apartheid”, o “Comité da Rodésia e o Comité de Angola”. Este último, de filiação comunista, tinha por finalidade apoiar desertores e refugiados políticos portugueses e divulgar informações sobre a política colonial portuguesa. Neste país, efectuou-se uma campanha anti-Portugal, nomeadamente através do boicote à importação de café. Por iniciativa do Comité de Angola foi criada a Fundação Eduardo Mondlane (5).
No dia 1 de Maio de 1972, realizou-se uma campanha de recolha de fundos destinados aos movimentos independentistas africanos. O dinheiro, embora não sendo do agrado dos organizadores, poderia ser utilizado para a compra de armas, pois quem deveria decidir do destino desses fundos seriam os movimentos (6).
Na sequência do Concílio Vaticano II, parte do clero católico (o qual, já anteriormente, notava a preocupação de dissolver a associação Igreja/Administração) enveredou, na linha do aggiornamento, pela contestação da posição portuguesa em África. No caso de Moçambique, essa posição consistiu mesmo em apoio logístico e em informações à acção armada da FRELIMO, nomeadamente, por parte de sacerdotes isolados e congregações religiosas estrangeiras. Estas efectuavam acções consideradas pelas autoridades portuguesas como “desnacionalizantes” (7).
Mas não foi só a linha do aggiornamento que se afastou da posição oficial portuguesa. O Papa Paulo VI, ao receber em 1 de Julho de 1970 os dirigentes do PAIGC, do MPLA e da FRELIMO, mostra uma clara demarcação da Igreja Católica face a Portugal. No território, D. Eurico Dias Nogueira, Bispo de Vila Cabral, enfrentou mesmo ameaças de morte, devido ao apoio “humanitário” prestado pelas missões do Niassa (8), e D. Manuel Vieira Pinto, Bispo de Nampula, proferiu discursos e assumiu comportamentos muito críticos à actuação da Administração Portuguesa e das Forças Armadas.
O Conselho Mundial das Igrejas, que teve a sua origem, em Agosto de 1948, no “National Council of Churches of Christ” dos EUA, consistia em cerca de 240 Igrejas Anglicanas, Protestantes, Ortodoxas e outras. A partir de 1961, foi identificada nesta organização uma forte influência comunista (9), sendo mesmo considerada a sua acção absolutamente submetida à influência de elementos marxistas infiltrados (10).
Na execução do seu programa de luta contra o racismo, através de uma acção colectiva concretizada na criação de um fundo especial, visando a redistribuição do poder político e atribuindo à autodeterminação um sentido cultural, o Conselho Mundial das Igrejas decidiu auxiliar monetariamente, mas com fins humanitários, os Movimentos Independentistas de África, financiando, entre 1970- 1971, a FRELIMO em 35 mil dólares (11). Em Novembro de 1971, dirigiu um apelo aos seus membros, no sentido de angariar 340 mil dólares, destinados ao MPLA, FRELIMO e PAIGC (12). Em carta, datada de 3 de Janeiro de 1973, dirigida ao Presidente da Comissão Especial da ONU para o Apartheid, informou que, pela terceira vez, concedera donativos a movimentos representativos dos povos oprimidos das diferentes partes do Mundo, dos quais 101 mil dólares foram para os movimentos independentistas da África Austral. O seu destino foram medicamentos, actividades educacionais e promoção social (13).
Na segunda metade do século XX, as populações autóctones eram claramente instigadas contra a presença portuguesa, sendo a preparação ideológica, material e militar dos Movimentos Independentistas feita a partir do exterior. Também no exterior a opinião pública internacional era intoxicada com extensas campanhas alusiva à presença portuguesa em África.
Neste cenário os Movimentos Independentistas dispunham de um recurso de fundamental importância: os formadores de opinião das democracias ocidentais, grupo composto por académicos e jornalistas tendencialmente de esquerda que manifestavam apoio em favor das independências. Malyn Newit considera mesmo que “(...) a batalha por Moçambique foi por vezes mais renhida nos media Ocidentais do que no terreno (...)” (14), posição que nos Estados Unidos da América foi alterada com o tempo, pois anteriormente Mondlane acusava: O “(...) resultado da acção dos serviços de relações públicas portuguesas nos Estados Unidos tem conseguido evitar que a imprensa americana publique factos que tiveram lugar. Na Europa, na África e na Ásia, pelo contrário, todas as semanas os principais jornais europeus, por exemplo, publicam notícias extraídas dos noticiários portugueses, que são feitos na Europa; mas na imprensa americana nem sequer se publicam as informações portuguesas sobre a guerra (...) e, devido à falta de informação, eu chego a compreender que o público americano acredite que a luta neste território tenha falhado (...)” (15). Esta situação era fruto do acordo do Governo Português com a Selvage & Lee...
Acções diplomáticas de relacionamento e de ligação dos diferentes movimentos dos diversos territórios, de que a CONCP era a face visível, legitimavam a guerra e fortaleciam a relação entre os movimentos, estabelecendo-se uma sinergia revolucionária (16).
Em síntese, as guerrilhas, invocando os nacionalismos, constituem na maioria dos casos, um fenómeno internacionalista.
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